PAPA FRANCISCO
Responde às questões propostas por jornalistas de todo o mundo durante o voo de
Ciudad Juárez (México) a Roma (Itália)
Quarta-feira (à noite), 17 de fevereiro de 2016
Responde às questões propostas por jornalistas de todo o mundo durante o voo de
Ciudad Juárez (México) a Roma (Itália)
Quarta-feira (à noite), 17 de fevereiro de 2016
Rádio Vaticana
O Papa abordou questões como os “desaparecidos mexicanos”, casos de pedofilia, aborto em caso de zika vírus e
comunhão aos recasados
Logo após decolar de Ciudad Juárez, nesta quarta-feira (17/02), o Papa manteve a tradicional coletiva de imprensa com os jornalistas a bordo do avião papal.
Francisco
respondeu aos questionamentos que foram desde os “desaparecidos”
mexicanos, passando pelos casos de pedofilia – ponto em que recordou a
coragem de Bento XVI –, sobre o aborto em caso de contágio por Zika
vírus, a Declaração comum com o Patriarca russo, além de abordar a
questão da comunhão aos divorciados recasados, falar sobre as suas
próximas viagens e confidenciar o que lhe levou a aceitar um prêmio pela
primeira vez.
O
Pontífice ainda respondeu a perguntas sobre a votação no Parlamento
italiano da lei sobre as uniões civis entre pessoas do mesmo sexo; disse
que proibiu na Argentina os "casamentos em apuros" e promoveu uma
reflexão aos jornalistas sobre como uma notícia deve ser dada e
interpretada. Falando sobre as correspondências entre João Paulo II e a
filósofa polonesa, Francisco disse gosta sempre de ouvir o parecer das
mulheres.
Abaixo,
a íntegra da entrevista, em tradução livre e com grifos da redação [por
isso, às vezes, o texto é um tanto truncado, incompleto, pois seguiu a
fala espontânea do papa]:
Padre Lombardi:
Santo Padre, obrigado por estar aqui, como ao final de cada viagem,
para a conversa sintética, um grande apanhado sobre a viagem, e por sua
disponibilidade em responder a tantas perguntas da nossa comunidade
internacional. Pedimos, como sempre, aos diversos grupos linguísticos
que se organizassem e apresentassem algumas perguntas. Começamos com os
colegas mexicanos, naturalmente. Portanto, pedimos que responda em
espanhol às duas primeiras perguntas e, a seguir, em italiano, porque
muitos colegas entendem melhor.
(Maria Eugenia Jimenez – “Milenio”)
Santo
Padre, no México existem milhares de desaparecidos, todavia o caso dos
43 de Ayotzinapa, é um caso emblemático. Gostaria de pedir-lhe porque
não encontrou seus familiares e também uma mensagem para os familiares
dos milhares de desaparecidos.
Papa Francisco: Se
leres as mensagens, há referências contínuas aos assassinatos, às
mortes, à vida tomada por todas estas gangues do narcotráfico, dos
traficantes de seres humanos. Ou seja, o problema é apresentado. Falei
das chagas que o México está sofrendo, não? Houve tentativas de receber
alguns. Eram tantos grupos, mesmo opostos entre eles, com lutas
internas. Portanto, prefiro dizer que na Missa se veem todos, na Missa
de Juárez, se preferirem, ou em qualquer outra. Todavia, teria tido esta
disponibilidade. Era praticamente impossível receber todos os grupos,
que, de um lado, eram opostos entre eles.
É
uma situação difícil de entender, para mim claramente que sou
estrangeiro, verdade? Mas creio que, também a sociedade mexicana seja
vítima de tudo isso: dos crimes, deste fazer desaparecer as pessoas, de
descartar as pessoas. Sobre isso eu falei. Sendo um discurso público,
podes constatar ali. É uma dor muito grande que trago, porque este povo
não merece um drama como este.
(Javier Solorzano – “Canal 11”)
Muito
obrigado, Papa Francisco, muito obrigado. O tema da pedofilia, como
sabe, tem raízes muito perigosas no México, muito dolorosas. O caso de
padre Maciel deixou fortes sinais, sobretudo nestas vítimas. As vítimas
continuam a sentir-se não protegidas da Igreja; muitos deles continuam a
ser homens de fé, e alguns até mesmo seguiram o sacerdócio. Pergunto o
que pensa deste tema, se em qualquer momento pensou em encontrar as
vítimas e, em geral, esta ideia que aos sacerdotes, quando são
descobertos por um caso desta natureza, sejam somente trocados de
paróquia e nada mais. Como vê este tema? E muito obrigado.
Papa Francisco: Bem, começo da segunda. Um
bispo que troca um sacerdote de paróquia quando se reconhece um caso de
pedofilia é um inconsciente, e o melhor que pode fazer é apresentar sua
renúncia. Claro? Segundo, voltando ao caso Maciel. E aqui, me
permito de prestar homenagem ao homem que lutou em momentos em que não
tinha a força para se impor, até que não conseguiu se impor: Ratzinger. O
cardeal Ratzinger – um aplauso para ele! É um homem que teve toda a documentação. Quando
era Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, teve tudo em suas
mãos, fez investigações, obteve, obteve, obteve… mas não pôde guiar a
execução. Porém, se vocês recordarem, dez dias antes de morrer, São
João Paulo II – naquela Via-Sacra da Sexta-feira Santa – disse a toda a
Igreja que era preciso limpar as “porcarias” da Igreja, as imundícies. E na Missa “Pro Eligendo Pontefice” – não é um bobo, sabia que era um candidato – não usou máscaras e disse exatamente a mesma coisa. Ou seja, foi o corajoso que ajudou tantos a abrir esta porta.
Assim quero que vocês recordem dele porque, às vezes, nos esquecemos
deste trabalho escondido, daqueles que prepararam a estrada para
desvelar esta página. Terceiro, estamos trabalhando bastante. Com o
cardeal secretário de Estado, estamos conversando, e também com o grupo
dos novos cardeais conselheiros que, podem ouvir, decidiram nomear um terceiro secretário adjunto à Doutrina da Fé, para que se ocupe somente destes casos.
A Congregação, de fato, não é suficiente com tudo aquilo que tem que
ser feito. Portanto, que saiba administrar isto. Além disso, foi constituída a Corte de Apelação, presidida por mons. Scicluna, que se está ocupando dos casos em segunda instância, quando se recorrer. O primeiro recurso, de fato, é feito pela “feria quarta”
da [Congregação] Doutrina da Fé – líamos – reúne-se na quarta-feira.
Quando há o recurso, volta-se à primeira instância e isto não é justo.
Então, o segundo recurso, perfeitamente legal, já com o advogado de
defesa. Mas é preciso apurar porque temos tantos atrasos nos casos, porque aparecem casos. Quarto, sobre outra coisa sobre a qual se está trabalhando muito bem é a Comissão para a Tutela dos Menores.
Não é rigorosamente fechada aos casos de pedofilia, mas à tutela dos
menores. Ali, me reuni por uma inteira manhã com seis dos integrantes –
dois alemães, dois irlandeses e dois ingleses: homens e mulheres,
abusados, vítimas, não, e me reuni com tantas vítimas… onde foi? No
Equador? (Em Filadélfia). Em Filadélfia, me desculpem! Em Filadélfia! Também lá, uma manhã, tive um encontro com as vítimas e sei que se está trabalhando.
Mas eu agradeço a Deus que esta página tenha sido revelada, e é preciso
continuar a revelá-la, e tomar consciência. E, por fim, quero dizer que é uma monstruosidade,
porque um sacerdote é consagrado para levar uma criança a Deus e lá se
“aproveita” dela como em um sacrifício diabólico, destruindo-a.
Bem, no que diz respeito a Maciel, voltando à Congregação, foi feito uma intervenção, e hoje a Congregação, o governo da Congregação, fez uma “semi-intevenção”.
O Superior geral é eleito pelo Conselho, pelo Capítulo Geral, mas o
Vigário é eleito pelo Papa. Dois conselheiros gerais são eleitos pelo
Capítulo Geral e outros dois são eleitos pelo Papa, de modo tal que se ajude a controlar a história precedente.
Quem não entendeu, peça a um espanhol que lhe explique o que eu disse…
(Phil Pulella, “Reuters”)
Boa
noite, Santidade. Hoje falou com muita eloquência dos problemas dos
migrantes. Do outro lado da fronteira, todavia, existe uma campanha
eleitoral muito acirrada. Um dos candidatos à Casa Branca, o republicano
Donald Trump, em uma entrevista recentemente disse que o senhor é um
homem político e inclusive disse que talvez o senhor seja também uma
peça de xadrez, um instrumento do governo mexicano para a política de
imigração… Ele declarou que, se eleito, quer construir 2,5 mil
quilômetros de cercas ao longo da fronteira, quer deportar 11 milhões de
imigrantes ilegais, separando assim famílias, etc. Então, queria
perguntar, antes de tudo, o que pensa sobre estas acusações contra o
senhor e se um católico estadunidense pode votar em uma pessoa assim.
Papa Francisco: Graças a Deus que disse que sou um político, porque Aristóteles define a pessoa humana como “animal politicus”:
ao menos sou uma pessoa humana, eh? E que sou uma peça de xadrez, mas,
talvez, não sei… deixo isso a seu juízo, a juízo das pessoas. E,
depois, uma pessoa que pensa somente em levantar muros, seja onde seja, e
não a fazer pontes, não é cristã. Isso não está no Evangelho. Depois, aquilo que me dizias, o que aconselharia, votar ou não votar: não me envolvo. Somente digo: este homem não é cristão, se diz isto assim. É preciso ver se ele disse assim as coisas, não? E por isso dou o benefício da dúvida.
(Jean-Louis de la Vaissière, “France Presse”)
O
encontro com o Patriarca russo Kirill e a assinatura da Declaração
comum foi visto no mundo inteiro como um passo histórico. Mas agora,
hoje já, na Ucrânia os greco-católicos sentem-se traídos e falam de um
“documento político”, de apoio à política russa. Em campo, a guerra das
palavras se acendeu novamente. Pensa de poder ir a Moscou? Foi convidado
pelo Patriarca? Ou talvez de ir a Creta para saudar o Concílio
pan-ortodoxo, na primavera?
Papa Francisco: Começo
pelo final. Estarei presente, espiritualmente e com uma mensagem –
gostaria de saudá-los pessoalmente no Concílio pan-ortodoxo: são irmãos;
mas devo respeitar. Mas sei que eles querem convidar observadores
católicos: e isto é uma bela ponte. Mas por trás dos observadores
católicos estarei eu, rezando com os melhores augúrios que os ortodoxos
sigam adiante, adiante porque são irmãos e os seus bispos são bispos
como nós. Depois: Kirill. O meu irmão. Nos saudamos, nos abraçamos e
tivemos um colóquio de uma hora…
Padre Lombardi: … duas horas!
Svjatoslav Ševčuk Arcebispo Maior de Kiev-Galicia e Toda a Rússia e Primaz da Igreja Greco-Católica Ucraniana. |
Papa Francisco: …
duas horas! – mais de uma hora… a velhice não vem sozinha, eh? Duas
horas, nas quais falamos como irmãos, sinceramente e ninguém sabe sobre o
que se falou, somente aquilo que dissemos ao final, publicamente, do
que provamos no conversar. Terceiro: aquele artigo, aquelas declarações
na Ucrânia. Quando eu o li, fiquei um pouco preocupado, porque era Svjatoslav Ševčuk
que disse que o povo ucraniano, ou alguns ucranianos ou tantos
ucranianos, sentiram-se profundamente desiludidos e traídos. Antes de
tudo, conheço bem Svjatoslav: em Buenos Aires, por quatro anos,
trabalhamos juntos.
Quando
ele foi eleito – aos 42 anos, eh? Um homem bom! – foi eleito arcebispo
maior, voltou a Buenos Aires para pegar suas coisas. Veio até mim e me
deu de presente um ícone – pequeno assim – de Nossa Senhora da Ternura e
me disse: “Esta me acompanhou por toda a vida: quero deixá-la a ti, que
me acompanhou nestes quatro anos”. É uma das poucas coisas que fiz
trazer de Buenos Aires e que está na minha escrivaninha.
Ou
seja, é um homem pelo qual tenho respeito e familiaridade, nos tratamos
de “você”, e assim… Segundo: por isso me pareceu um pouco estranho. E
recordei uma coisa que disse aqui, a vocês: para entender uma notícia, uma declaração, é preciso procurar a hermenêutica de tudo. Mas, quando disseste isso? Em uma declaração de 14 de fevereiro passado, domingo: domingo passado.
Uma
entrevista que fez, selecionada pelo padre… não recordo, um sacerdote
ucraniano. Na Ucrânia, selecionada, e publicada. Aquela notícia, a
entrevista é de uma página, duas e um pouco a mais: mais ou menos.
Aquela notícia está no terceiro e último parágrafo, assim pequeno.
Eu
li a entrevista, e direi isto: Ševčuk é a parte dogmática, se declara
filho da Igreja, em comunhão com o Bispo de Roma, com a Igreja; fala do
Papa, da proximidade do Papa, e dele, da sua fé, não?, e da fé também do
povo ortodoxo: na parte dogmática, nenhuma dificuldade, é ortodoxa no
bom sentido da palavra, ou seja, Doutrina católica, não?
Depois,
como em todas as entrevistas – esta, por exemplo – cada um tem o
direito de dizer as suas coisas, e isto não o fez sobre o encontro,
porque sobre o encontro, diz: “Mas, é uma coisa boa e devemos seguir em
frente”. Neste segundo capítulo, as ideias pessoais que tem uma pessoa.
Por exemplo, isto que eu disse sobre os bispos que transferem os padres
pedófilos, o melhor que podem fazer é demitir-se, é uma coisa… não é
dogmática, mas é aquilo que eu penso. E assim ele tem as suas ideias
pessoas que são para dialogar, e tem o direito de haver.
Tudo
aquilo que ele diz é sobre o documento: este é o problema. Sobre o
encontro… “mas, este é o Senhor, o Espírito que segue adiante, o
abraço…”: tudo vai bem. O Documento? É um documento discutível, e também
há um acréscimo: que a Ucrânia vive um momento de guerra, de
sofrimento, com tantas interpretações. Eu citei o povo ucraniano pedindo
orações e proximidade tantas vezes, seja no Ângelus como nas Audiências
de quarta-feira. Mas o fato histórico de uma guerra vivida como… cada
um tem sua ideia, como é esta guerra, quem a começou, como se faz, como
não se faz… É evidente que este é um problema histórico, mas também um
problema pessoal, existencial daquele País e fala do sofrimento. E ali,
eu insiro este parágrafo: se entende os fiéis, porque Svjatoslav diz:
“Tantos fiéis me chamaram ou escreveram dizendo que estão profundamente
desiludidos e traídos por Roma”: se entende que um povo naquela situação
sinta isso, não: Mas, o Documento é discutível sobre esta questão da
Ucrânia, mas lá se diz que se termine a guerra e que se caminhe a
acordos; eu, pessoalmente, defendi que os Acordos de Minsk prossigam, e
não se apague com o cotovelo aquilo que foi escrito com as mãos, eh? A
Igreja de Roma, o Papa sempre disse: “Procurem a paz”.
Recebi
ambos os presidentes – paridade, não? E por isso, quando ele diz que
ouviu isso do seu povo, eu o entendo: o entendo. Mas não é “a” notícia.
“A notícia” é tudo. Se vocês lerem toda a entrevista, verão que existem
coisas dogmáticas sérias, que permanecem, há um desejo de unidade, de ir
adiante, ecumênico, ele é um homem ecumênico… Existem algumas opiniões…
Ele me escreveu, quando soube da viagem, do encontro, mas como um
irmão, dando as suas opiniões de irmão… Não me desagrada o Documento,
assim; não me desagrada no sentido que devemos respeitar as coisas que
cada um tem a liberdade de pensar e naquela situação tão difícil. E de
Roma… agora o núncio está na fronteira onde se combate, ajudando os
soldados, os feridos; a Igreja de Roma enviou tantas ajudas, tantas
ajudas lá; e sempre paz, acordos, se respeite o Acordo de Minsk… e
assim. Este é o todo. Mas, não se assustem com aquela frase: esta é uma
lição, que uma notícia deve ser interpretada com a hermenêutica do todo,
não da parte.
(Jean-Louis de la Vaissière)
O Patriarca Kirill lhe convidou a ir a Moscou ?
Papa Francisco: O
Patriarca Kirill… eu preferiria… porque se digo uma coisa devo dizer
uma outra e outra e outra: preferiria que aquilo sobre o que falamos
nós, sozinhos, seja somente aquilo que dissemos em público. Este é um
dado. E se digo isto, deverei dizer mais… não! Aquilo que eu disse em
público, aquilo que ele disse em público, isto é aquilo que se pode
dizer do colóquio privado. Do contrário, não seria privado. Mas posso dizer: saí feliz. E ele também.
(Carlo Marroni, “Il Sole 24 Ore”)
Santo
Padre, a minha pergunta é sobre a família, tema que o senhor afrontou
nesta viagem. No Parlamento italiano está em discussão a lei sobre as
uniões civis, tema que tem levado a fortes embates políticos, mas também
a um forte debate na sociedade e entre os católicos. Neste particular,
gostaria de saber o seu pensamento sobre o tema da adoção da parte das
uniões civis, e portanto, sobre os direitos das crianças e dos filhos em
geral… Obrigado.
Papa Francisco: Antes
de tudo, não sei como estão as coisas no Parlamento italiano… O Papa
não se envolve na política italiana. Na primeira reunião que tive com os
bispos, em maio de 2013, uma das três coisas que disse: “Com o governo
italiano, se virem vocês”. Porque o Papa é para todos, e não pode se
meter na política concreta, interna de um país: este é o papel do Papa,
não? E aquilo que penso é aquilo que pensa a Igreja e disse em tantas…
porque este não é o primeiro país que faz esta experiência: são tantos.
Eu penso aquilo que a Igreja sempre disse sobre…
(Paloma Garcia Ovejero, “Cope”)
Santo
Padre, há algumas semanas há muita preocupação em muitos países
latino-americanos, mas também na Europa, sobre o vírus “Zika”. O risco
maior seria para as mulheres grávidas: há angustia. Algumas autoridades
propuseram o aborto, ou de se evitar a gravidez. Neste caso, a Igreja
pode levar em consideração o conceito de “entre os males, o menor”?
Papa Francisco: O
aborto não é um “mal menor”. É um crime. É descartar um para salvar o
outro. É aquilo que a máfia faz, eh? É um crime. É um mal absoluto.
Sobre “mal menor”: mas, evitar a gravidez é – falemos em termos de
conflito entre o quinto e o sexto Mandamento. Paulo VI, o Grande!, em
uma situação difícil, na África, permitiu às religiosas de usar
anticoncepcionais para aos casos de violência. Não confundir o mal de
evitar a gravidez, sozinho, com o aborto. O aborto não é um problema
teológico: é um problema humano, é um problema médico. Mata-se uma
pessoa para salvar uma outra – nos melhores dos casos. Ou por conforto,
não? Vai contra o Juramento de Hipócrates que os médicos devem fazer. É um mal em si mesmo, mas não é um mal religioso, ao início: não, é um mal humano. Além disso, evidentemente, já que é um mal humano – como todos assassinatos – é condenado. Ao invés, evitar a gravidez não é um mal absoluto:
e, em certos casos, como neste, como naquele que mencionei do Beato
Paulo VI, era claro. Ainda, eu exortaria os médicos para que façam tudo
para encontrar as vacinas contra estes dois mosquitos que trazem este
mal: sobre isto se deve trabalhar. Obrigado.
(Ludwig Ring-Eifel, “Kna”)
Santidade,
dentro de poucas semanas, o senhor vai receber o Prêmio Carlos Magno,
um dos prêmios mais prestigiosos da Comunidade Europeia. Também o seu
predecessor, São João Paulo II, recebeu este prêmio: fazia questão. E
fazia questão também de promover a unidade europeia, que agora parece um
pouco aos pedaços, primeiro com a crise do euro e agora com a crise dos
refugiados: o senhor tem talvez uma palavra para nós, nesta situação de
crise europeia?
Papa Francisco: Primeiro,
sobre o Prêmio Carlos Magno. Eu tinha o hábito de não aceitar
honorificências ou doutorados, desde sempre: não por humildade, mas
porque não gosto destas coisas. Um pouco de loucura é bom ter, e não
gosto. Mas neste caso, não digo “forçado”, mas “convencido” com a santa e
teológica teimosia do cardeal Kasper, que foi eleito por Aachen
(Alemanha) para me convencer. E eu disse: “Sim, mas no Vaticano”. E…
disse isso; e ofereço o prêmio para a Europa: que seja uma condecoração,
um prêmio para que a Europa possa fazer aquilo que eu desejei em
Estrasburgo: mais fácil que não seja a “avó-Europa”, mas a “mãe-Europa”.
Segundo. Outro dia, lendo as notícias sobre esta crise e isto: eu leio
pouco, folheio somente um jornal – não digo o nome para não provocar
ciumeiras, mas sabe-se… leio quinze minutos e depois peço informações à
Secretaria de Estado.
Uma palavra que me agradou, e me agradou – não sei quem a aprova, quem não – “a refundação da União Europeia”. E pensei aos grandes pais, eh? Mas, hoje, onde há um Schuman, um Adenauer?
E estes grandes, que no pós-guerra “fundaram” a União Europeia… E eu
gosto, esta ideia da refundação: oxalá se se pudesse fazer! Porque a
Europa, não diria que é “única”, mas tem uma força, uma cultura, uma
história que não pode ser desperdiçada, e devemos fazer tudo para que a
União Europeia tenha a força e também a inspiração de fazer ir adiante. Não sei: é isso que eu penso.
(Anne Thompson, “Nbc News”)
Santo
Padre, o senhor falou muito de família e do Ano da Misericórdia, nesta
viagem. Alguns se perguntam, como uma Igreja que se diz “misericordiosa”
pode perdoar mais facilmente um assassino do que quem se divorcia e
casa novamente…?
Papa Francisco: Gostei
da pergunta! Sobre a família, falaram dois Sínodos e o Papa falou
durante todo o ano na catequese das quartas-feiras. E a pergunta é
verdadeira, me agrada, porque você a fez plasticamente bem, eh! No
documento pós-sinodal que sairá – talvez antes da Páscoa – se retoma
tudo aquilo que o Sínodo – em um dos capítulos, porque existem muitos –
fala sobre os conflitos ou sobre famílias feridas, e a pastoral das
famílias feridas… É uma das preocupações. Assim como outra é a
preparação ao matrimônio. Pense você, que para se tornar padre, são oito
anos de estudo, de preparação, e depois, depois de um certo tempo, não
consegue mais, pede a dispensa e vai embora e está tudo certo. Pelo
contrário, para receber um Sacramento que é para toda a vida, três
quatro palestras… A preparação ao matrimônio é muito importante: é
muito, muito importante, porque acredito que seja uma coisa que a
Igreja, na pastoral comum – ao menos no meu país, na América do Sul –
não valorizou muito. Por exemplo – agora não tanto, mas há alguns
anos – na minha Pátria, havia o costume de… se chamava “casamento em
apuros”: casar rapidamente, porque vem um filho. E para cobrir
socialmente a honra da família…. Ali, não eram livres, e tantas vezes
estes matrimônios são nulos. E eu, como bispo, proibi os sacerdotes de
fazerem isto… Que nasça a criança, que continuem namorados, e quando
sentem que é para toda a vida, que sigam em frente. Mas existe uma
ausência do matrimônio. Depois, outro capítulo muito interessante: a
educação dos filhos. As vítimas dos problemas da família são os filhos: os filhos. Mas também vítimas dos problemas da família que nem marido nem a mulher querem: por exemplo, a necessidade de trabalho. Quando o pai não tem tempo livre para falar com os filhos, quando a mãe não tem tempo livre para falar com os filhos…
Quando eu confesso um casal que tem filhos, um matrimônio, pergunto:
“Quantos filhos vocês tem?”. E alguns se assustam porque dizem: “Mas, o
Padre me perguntará porque não tenho mais…”. Então eu acrescento: “Farei
para você uma segunda pergunta: você brinca com seus filhos?”, e a
maioria – quase todos! – dizem: “Mas, Padre, não tenho tempo: trabalho o
dia todo”. E os filhos são vítimas de um problema social que fere a
família. É um problema… gosto da sua pergunta. E uma terceira coisa
interessante, no encontro com as famílias em Morelia – não: foi em
Morelia?” Não… em Tuxtla, em Tuxtla – havia um casal de recasados em
segunda união, integrantes da pastoral da Igreja… E a palavra-chave que
usou o Sínodo – e eu a peguei – é “integrar na vida da Igreja as famílias feridas, as famílias de recasados”,
e tudo isto. Mas não esquecer as crianças no centro, eh! São as
primeira vítimas, quer pelas feridas quer pelas condições de pobreza, de
trabalho, de tudo isto…..
(Anne Thompson, “Nbc News”)
Significa que poderão comungar?
Papa Francisco: Esta
é uma coisa… Integrar na Igreja não significa “comungar”, porque eu
conheço católicos recasados que vão à igreja uma vez por ano, duas
vezes: “Mas, eu quero comungar!”, como se a comunhão fosse uma
honorificência, não? Um trabalho de integração… todas as portas estão
abertas. Mas não se pode dizer, (…) “podem comungar”. Isto seria uma
ferida também aos matrimônios, ao casal, porque não fará com que eles
sigam por este caminho de integração. E estes dois eram felizes! E
usaram uma expressão muito bonita: “Nós não fazemos a comunhão eucarística, mas fazemos comunhão na visita ao hospital, nisto e naquilo….”. A integração deles permaneceu ali. Se há alguma coisa a mais, o Senhor dirá a eles, mas…..é um caminho, é uma estrada….”.
(Antone-Marie Izoard, “Imedia”)
Santidade,
boa noite. Permita-me antes, um pouco na brincadeira, de dizer o quanto
nós vaticanistas somos um pouco reféns da agenda do Santo Padre, e não
podemos brincar com nossos filhos… Sábado tem a audiência jubilar,
domingo tem o Ângelus, e de segunda a sexta-feira se voa para trabalhar.
Depois, um abraço ao Alberto que, com Padre Lombardi, me fez entrar na
Rádio Vaticano, há 20 anos – estamos em família…
Papa Francisco: … ele foi muito bom …
(Antone-Marie Izoard)
Santidade,
muitas mídias evocaram, de forma clamorosa, a “intensa correspondência”
entre João Paulo II e a filósofa estadunidense Anna Tymieniecka, que
nutria – diz-se – um grande afeto pelo Papa polonês. Na sua opinião, um
Papa pode ter uma relação tão íntima com uma mulher? E depois, se me
permite, o senhor tem alguma importante correspondência, conhece – ou
conheceu – este tipo de experiência…
Papa Francisco: “Isto
eu sabia, esta relação de amizade entre São João Paulo II e esta
filósofa, quando estava em Buenos Aires: uma coisa que se sabia, também
os livros dela são conhecidos, e João Paulo II era um homem inquieto…
Depois, eu diria que um homem que não sabe ter uma boa relação de
amizade com uma mulher – não falo dos misóginos, eles são doentes –
falta a ele alguma coisa. E eu, por experiência própria, também
quando peço um conselho, peço a um colaborador, a um amigo, um homem,
mas também gosto de ouvir o parecer de uma mulher: e te dão tanta
riqueza! Olham as coisas de um outro modo. Gosto de dizer que a
mulher é aquela que constrói a vida no ventre e tem – mas esta é uma
comparação que eu faço, não? – e tem este carisma de te dar coisas para
construir. Uma amizade com uma mulher não é pecado: uma amizade. Uma relação amorosa com uma mulher que não seja tua mulher, é pecado. O Papa é um homem, o Papa tem necessidade também do pensamento das mulheres.
E também o Papa tem um coração que pode ter uma amizade sadia, santa
com uma mulher. Existem santos amigos – Francisco, Clara, Teresa, João
da cruz… Não se assustem… Mas, as mulheres ainda são um pouco… não bem
consideradas, não totalmente… não entendemos o bem que uma mulher pode
fazer à vida do padre e da Igreja, no sentido de um conselho, da ajuda,
de uma amizade saudável. Obrigado!”
(Franca Giansoldati, “Il Messaggero”)
Boa
noite, santidade. Eu volto para o tema da lei que está para ser votada
no Parlamento italiano: é uma lei que, no final das contas, diz respeito
também a outros Estados, porque outros Estados têm leis que tratam da
união entre pessoas do mesmo sexo. Existe um documento da Congregação
para a Doutrina da Fé, de 2003, que dedica um amplo espaço a isto e
também dedica um capítulo ao comportamento que os parlamentares
católicos devem ter diante desta lei, e se diz expressamente que os
parlamentares católicos não devem votar esta lei. Visto que existe muita
confusão sobre isto, gostaria de pedir ao senhor, antes de tudo, se
este documento de 2003 ainda tem valor, e efetivamente qual o
comportamento que um parlamentar católico deve ter? E depois, uma outra
coisa: depois de Moscou, o Cairo: existe algum outro desgelo que se
vislumbra no horizonte? Isto é, me refiro à audiência que o senhor
deseja com o “Papa dos sunitas” – podemos chamá-lo assim -, com o Imame
de al-Azhar?
Papa Francisco: Sobre
isto, Dom Ayuso foi ao Cairo, na semana passada, para encontrar o
segundo dos Imames e também saudar o Imame. Dom Ayuso, é Secretário do
Cardeal Tauran, do Pontifício Conselho para o Diálogo Inter-religioso.
Eu quero encontrá-lo, sei que ele gostaria, e estamos buscando a melhor
maneira: sempre através do Cardeal Tauran, porque este é o caminho, não?
Mas, conseguiremos. Sobre o primeiro tema: eu não recordo bem este
documento de 2003 da Congregação para a Doutrina da Fé. Mas um parlamentar católico deve votar segundo a própria consciência “bem formada”,
porque não é a consciência aquilo que me pareça… eu me recordo quando
foi votado o matrimônio entre pessoas do mesmo sexo em Buenos Aires, que
houve ali um empate, e no final alguém disse, aconselhou ao outro:
“Mas, tens isto claro?” – “Não” – “Nem eu” – “Então vamos embora” – “Se
sairmos, não alcançarão o quórum”. E o outro disse: “Mas se chegarmos ao
quórum, damos o voto a Kirchner!”, e o outro: “Mas, prefiro dá-lo a
Kirchner e não a Bergoglio!”… e em frente… Esta não é uma consciência
bem formada, eh! E em relação às pessoas do mesmo sexo, repito aquilo
que disse na viagem do Rio de Janeiro e que está no catecismo da Igreja
Católica.
(Javier Martínez Brocal, “Rome Reports”)
Santo Padre, muito obrigado por esta viagem ao México: foi uma honra acompanhá-lo e ter visto o que vimos (em espanhol).
Passo ao italiano: ainda não chegamos a Roma e já estamos pensando nas
futuras viagens, em fazer as malas novamente. Santo Padre, quando irás à
Argentina, onde esperam pelo senhor há tanto tempo, e, quando
retornarás à América Latina ou irás à China… Depois, durante esta
viagem, o senhor falou muitas vezes em “sonhar”: O que o senhor sonha?
E, sobretudo, qual é o seu pesadelo?
Papa Francisco: A
China… (riem) ir até lá: gostaria muito! Quero dizer uma coisa, uma
coisa certa sobre o povo mexicano. É um povo de uma riqueza, de uma
riqueza tão grande, é um povo que surpreende… Tem uma cultura, uma
cultura milenar… Vocês sabem que hoje, no México, são faladas 65
línguas, contando os indígenas… 65! É um povo de uma grande fé, também
sofreu perseguições religiosas, existem mártires – agora vou canonizar
dois, … dois ou três… É um povo … não se pode explicar simplesmente
porque a palavra “povo” não é uma categoria lógica, é uma categoria
mítica. E o povo mexicano, não é possível explicá-lo, esta riqueza, esta
história, esta alegria, esta capacidade de festa e estas tragédias das
quais vocês perguntaram. Eu não posso dizer outra coisa, que esta
unidade, também que este povo tenha conseguido não fracassar, não acabar
com tantas guerras, e coisas que acontecem agora… Mas ali, em Ciudad
Juárez, havia um pacto de 12 horas de paz para a minha visita, depois
continuarão lutando entre eles, os traficantes… Mas um povo que tem ainda esta vitalidade, somente pode ser explicado por Guadalupe. E eu vos convido a estudar seriamente o “acontecimento Guadalupe”.
Nossa Senhora está lá. Eu não encontro outra explicação. E seria bonito
se vocês, como jornalistas, existem alguns bons livros que explicam,
também explicam a pintura, como é, o que significa… E assim se poderá
entender um pouco este povo tão grande, tão bonito.
(Caroline Pigozzi do “Paris Match”)
Sim,
Santo Padre, boa noite. Duas coisas. Gostaria de saber algo. Gostaria
de saber o que o senhor pediu à Guadalupe, porque permaneceu muito tempo
na igreja rezando para ela; depois, a segunda coisa, se o senhor sonha
em italiano ou espanhol?
Papa Francisco: “Sim,
eu diria que sonho em esperanto… (risos). Não sei como responder isto,
realmente. Algumas vezes sim, recordo, algum sonho em outra língua, mas sonhar em língua não, mas com figuras, sim; eh, a minha psicologia é assim. Com palavras sonho pouco, não?
E a primeira [pergunta] era?
(Caroline Pigozzi )
A primeira pergunta, Santidade, o Senhor esteve muito tempo rezando para Nossa Senhora…
Papa Francisco: Pedi pelo mundo, pela paz… mas, tantas coisas… A pobrezinha ficou com a cabeça assim… Pedi
perdão, pedi para que a Igreja cresça saudável, pedi pelo povo
mexicano… também, uma coisa que pedi muito é que os padres sejam
verdadeiros padres e as irmãs, verdadeiras irmãs e os bispos,
verdadeiros bispos: como o Senhor nos quer. Isto pedi muito a ela, não? Mas depois, as coisas que um filho diz à Mãe são um pouco secretas… Obrigado, Carolina…”
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Fonte: NEWS.VA – Official Vatican Network – Quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016 – Internet: clique aqui.
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