Juremir Machado da Silva*
Tem leitor que fica fulo da vida quando eu
falo de franceses. Recebo mensagens duras contra esses franceses chatos,
esses "franceses sebentos". O leitor tem medo de parecer ignorante. Aí
eu falo de Michel Teló. Sou magnânimo e culturalmente flexível. Hoje,
correndo o risco de despertar a ira de alguns desses leitores
impiedosos, falarei de um francês que já morreu, deixando saudades, um
certo Albert Camus. Era goleiro. Bom goleiro da seleção universitária. A
tuberculose o tirou dos campos. Só lhe restou ser filósofo e escritor.
Na falta de melhor, ganhou o Prêmio Nobel da Literatura de 1957. Passou a
vida às turras com outro francês mala, que também ganhou o Nobel, mas o
recusou, um tal de Jean-Paul Sartre.
Saiu há pouco um texto inédito de Camus, publicado no Brasil pela Falha de S. Paulo, opa!, quer dizer, a Folha de S.Paulo, sobre as quatro qualidades principais de um jornalista: lucidez, recusa, ironia e obstinação. Camus pensa assim: "Em face da maré de besteiras, é preciso igualmente opor algumas recusas. Nenhuma das limitações do mundo leva um espírito um pouco limpo a aceitar ser desonesto. Ora, por menos que conheçamos o mecanismo das informações, é fácil nos assegurarmos da autenticidade de uma notícia". Eu me reconheci nesse texto de Camus. Tenho convicção de que ganharei o Nobel. Só não sei se irei buscá-lo. Já estive na Suécia. É longe. Faz frio. Recusar dá ainda mais mídia. Preciso pensar. Sou ironicamente obstinado: recuso-me a crer que me falta lucidez. Estou no caminho certo. O olho da rua.
Só a ironia salva segundo Camus: "Podemos estabelecer que, em princípio, um espírito que tem gosto e os meios para impor limitações é impermeável à ironia. Não vemos Hitler, para tomar apenas um exemplo entre outros, utilizar a ironia socrática. Conclui-se que a ironia permanece como uma arma sem precedentes contra os poderosos demais. Ela completa a recusa na medida em que permite não rejeitar o que é falso, mas muitas vezes dizer o que é verdadeiro. Um jornalista livre, em 1939, não tem muitas ilusões sobre a inteligência daqueles que o oprimem. Ele é pessimista no que diz respeito ao homem". Em 2012, nada mudou. Sim, algo mudou. Um jornalista livre não tem muitas ilusões sobre a inteligência da humanidade, uma humanidade que dança com Michel Teló, lê Paulo Coelho e despreza um gênio como eu.
Camus esteve em Porto Alegre. O Correio do Povo anunciou em 9 de agosto de 1949: "Camus chega hoje". No seu "Diário de Viagem", o escritor comentaria: "Quatro ou cinco franceses congelados esperam-me no Aeroporto. Anunciam que devo fazer uma conferência à noite, o que não estava combinado". Já tinha enroladores naquela época. Influência brasileira por certo. Ele disse ainda: "A luz é muito bela. A cidade, feia". Que falta de lucidez! Apesar dos nossos belos rios, observa: "Essas ilhotas e civilização são frequentemente horrendas". Enfim: "Minha preocupação é ir embora e acabar com isto, acabar com isto de uma vez por todas". Erico Verissimo discursou: "Vós sois uma das mais claras, belas e corajosas vozes da França de hoje". Ele não nos poupou.
Saiu há pouco um texto inédito de Camus, publicado no Brasil pela Falha de S. Paulo, opa!, quer dizer, a Folha de S.Paulo, sobre as quatro qualidades principais de um jornalista: lucidez, recusa, ironia e obstinação. Camus pensa assim: "Em face da maré de besteiras, é preciso igualmente opor algumas recusas. Nenhuma das limitações do mundo leva um espírito um pouco limpo a aceitar ser desonesto. Ora, por menos que conheçamos o mecanismo das informações, é fácil nos assegurarmos da autenticidade de uma notícia". Eu me reconheci nesse texto de Camus. Tenho convicção de que ganharei o Nobel. Só não sei se irei buscá-lo. Já estive na Suécia. É longe. Faz frio. Recusar dá ainda mais mídia. Preciso pensar. Sou ironicamente obstinado: recuso-me a crer que me falta lucidez. Estou no caminho certo. O olho da rua.
Só a ironia salva segundo Camus: "Podemos estabelecer que, em princípio, um espírito que tem gosto e os meios para impor limitações é impermeável à ironia. Não vemos Hitler, para tomar apenas um exemplo entre outros, utilizar a ironia socrática. Conclui-se que a ironia permanece como uma arma sem precedentes contra os poderosos demais. Ela completa a recusa na medida em que permite não rejeitar o que é falso, mas muitas vezes dizer o que é verdadeiro. Um jornalista livre, em 1939, não tem muitas ilusões sobre a inteligência daqueles que o oprimem. Ele é pessimista no que diz respeito ao homem". Em 2012, nada mudou. Sim, algo mudou. Um jornalista livre não tem muitas ilusões sobre a inteligência da humanidade, uma humanidade que dança com Michel Teló, lê Paulo Coelho e despreza um gênio como eu.
Camus esteve em Porto Alegre. O Correio do Povo anunciou em 9 de agosto de 1949: "Camus chega hoje". No seu "Diário de Viagem", o escritor comentaria: "Quatro ou cinco franceses congelados esperam-me no Aeroporto. Anunciam que devo fazer uma conferência à noite, o que não estava combinado". Já tinha enroladores naquela época. Influência brasileira por certo. Ele disse ainda: "A luz é muito bela. A cidade, feia". Que falta de lucidez! Apesar dos nossos belos rios, observa: "Essas ilhotas e civilização são frequentemente horrendas". Enfim: "Minha preocupação é ir embora e acabar com isto, acabar com isto de uma vez por todas". Erico Verissimo discursou: "Vós sois uma das mais claras, belas e corajosas vozes da França de hoje". Ele não nos poupou.
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* Sociólogo. Escritor. Prof. universitário. Tradutor. Cronista do Correio do Povo
juremir@correiodopovo.com.brCrédito: ARTE JOÃO LUIS XAVIER
Fonte: Correio do Povo on line, 03/04/2012
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