P. Gonçalo Portocarrero
de Almada*
A exigência de um eventual sacerdócio feminino católico nasce de uma
concepção política da Igreja e de uma visão clericalista da promoção eclesial
da mulher.
Diaconisas na Igreja católica? Por agora, o Papa considera que, como
disse aos jornalistas no regresso da sua viagem pastoral à Macedónia do Norte,
não há condições para admitir mulheres no diaconado. Como esclareceu nessa
ocasião, foi inconclusiva a investigação realizada pela comissão ad hoc,
que o próprio Francisco tinha criado em 2016, para que estudasse, do ponto de
vista histórico e teológico, esta questão.
São João Paulo II já tinha negado, definitivamente, a ordenação
presbiteral e episcopal de mulheres. Restava apenas saber se seria possível
que, na Igreja católica, pudessem receber o diaconado, que é o primeiro grau do
sacramento da Ordem.
Com a reforma introduzida por São Paulo VI, extinguiram-se as chamadas
ordens menores, bem como o subdiaconado que, embora sendo já uma ordem maior,
era também de criação eclesiástica e, portanto, susceptível de eliminação pelo
máximo poder eclesial. Pelo contrário, o diaconado, presbiterado e episcopado,
sendo de instituição divina, nem pelo Papa podem ser suprimidos, que também não
pode alterar a sua essência.
Foi também São Paulo VI quem abriu a possibilidade de homens casados
receberem a ordenação diaconal: os diáconos permanentes que, não sendo
sacerdotes, não podem celebrar a Eucaristia, nem administrar os sacramentos da
unção dos doentes ou da reconciliação e penitência, mas exercem um ministério
eclesial, originariamente relacionado com a pastoral socio-caritativa. Foi para
que os apóstolos se dedicassem exclusivamente à oração, à administração dos
sacramentos e à pregação, que foram instituídos, pelo colégio apostólico, os
primeiros diáconos (Act 6, 1-6). Na actualidade, os diáconos permanentes – que
se diferenciam dos que o são só temporariamente porque, sendo solteiros, estão
em vias de receberem a ordenação presbiteral – também desempenham funções
litúrgicas, como a proclamação do Evangelho e a pregação. Podem igualmente
oficiar baptismos e casamentos canónicos, bem como presidir às exéquias
cristãs.
Não obstante a existência de sacerdotisas em várias religiões da
antiguidade clássica, nomeadamente as greco-romanas, em dois mil anos de
tradição cristã nunca as houve na Igreja católica, nem na ortodoxa, nem outras
confissões cristãs. Só recentemente, na segunda metade do século XX, os
protestantes permitiram o acesso feminino ao presbiterado e ao episcopado. Tal
reforma provocou a deserção de muitos dos seus fiéis, nomeadamente na
Grã-Bretanha, onde milhares de anglicanos, entre os quais vários bispos e
pastores, foram, a seu pedido, recebidos na Igreja católica que, para esse
efeito, criou um ordinariato, ou seja, uma espécie de diocese pessoal.
A ordenação de mulheres, na Igreja católica, tem sido reivindicada por
grupos feministas e contestatários, como Nós somos Igreja, cujas teses
são de duvidosa coerência cristã. A essas insistentes e por vezes provocatórias
exigências, respondeu São João Paulo II declarando, de forma definitiva, a
inadmissibilidade das mulheres ao sacerdócio, não porque a Sagrada Escritura
expressamente o proíba, mas porque assim o exige a contínua e ininterrupta
tradição, que é também fonte da revelação divina.
Contudo, São João Paulo II deixou em aberto a questão do diaconado. Nada
tendo dito a este propósito, o Papa Francisco nomeou, em 2016, uma comissão de
investigação sobre a eventualidade do diaconado feminino. Na realidade, não se
propunha uma criação ex novo, mas apenas uma restauração, na medida em
que, na Igreja primitiva, teriam existido diaconisas. Com efeito, São Paulo, na
sua carta aos romanos, cita “a nossa irmã Febe, que também é diaconisa na
igreja de Cêncreas” (Rm 16, 1). Esta mulher seria a prova, segundo alguns
teólogos, de que já na Igreja apostólica havia mulheres católicas que recebiam
o primeiro grau do sacramento da Ordem sagrada.
A comissão instituída pelo Papa Francisco não abalizou, contudo, uma tal
suposição: não consta que essa ‘diaconisa’, ou outras, o fossem no mesmo
sentido em que, desde sempre, houve homens diáconos. Como disse o Santo Padre
aos jornalistas: “Não há a certeza de que a sua [das mulheres] fosse
uma ordenação, com a mesma forma e com o mesmo propósito que a ordenação
masculina”. Como o termo diaconisa significa serva, a referência paulina
não aludiria a uma mulher que recebeu o sacramento da Ordem, no seu primeiro
grau, mas a alguém que servia a Igreja, com uma dedicação comparável à das
religiosas, mas não equiparável aos diáconos, presbíteros e bispos, todos eles
masculinos desde a fundação da Igreja. Não há, portanto, razões teológicas,
históricas ou eclesiológicas que justifiquem a ordenação diaconal de mulheres
na Igreja católica e, portanto, o processo está, de momento, concluído, como
disse, nessa ocasião, o Papa Francisco: “Vamos continuar a estudar. Mas, por
agora, não se avança”.
Depois do seu regresso de Skopje, numa audiência à União Internacional
de Superioras Religiosas, o mesmo fórum a que tinha prometido, em 2016,
estudar a questão da ordenação diaconal feminina na Igreja católica, o Papa Francisco
foi ainda mais claro: “Caminhamos por um sólido caminho, o caminho da
Revelação e não podemos percorrer um caminho diferente, que altere a Revelação
ou as declarações dogmáticas”. Nesta ocasião, chegou mesmo a ser
contundente, para cortar de raiz qualquer possível contestação a esta decisão
do magistério pontifício: “somos católicos, mas se alguma preferir outra
religião, é livre para se ir embora”.
A exigência de um eventual sacerdócio feminino católico nasce, por
vezes, de uma errada concepção da Igreja e da promoção da mulher. Da Igreja,
porque se supõe que deve andar a reboque das modas de cada tempo e cultura,
esquecendo que a sua eficácia depende, pelo contrário, da sua fidelidade a
Cristo, segundo o Evangelho e a Sagrada Tradição. Da promoção da mulher, porque
não é principalmente a condição sacerdotal que dignifica a mulher, nem o homem,
mas a santidade, que é igualmente acessível a todos os cristãos, qualquer que
seja o seu sexo ou condição eclesial.
Hoje mesmo, em Madrid, é
beatificada uma mulher leiga da prelatura do Opus Dei, a professora
Guadalupe Ortiz de Landázuri, doutorada em química, que viveu apaixonadamente a
sua vocação cristã no meio do mundo. Como ela, também Jacinta Marto, Edith
Stein, Gianna Beretta Molla, Teresa de Calcutá e tantas outras mulheres
cristãs, não precisaram do sacramento da Ordem para alcançarem a perfeição da
caridade. Nenhum diácono, presbítero ou bispo, foi tão santo quanto uma
mulher, esposa e mãe, que é a única criatura a quem Igreja atribuiu o
superlativo da santidade: a santíssima Virgem Maria!
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* Gonçalo Nuno Ary Portocarrero de Almada nasceu em Haia (Holanda), a 1 de
Maio de 1958. Licenciou-se em direito na Universidade de Madrid
(Complutense) e, posteriormente, doutorou-se em filosofia na
Universidade Pontifícia da Santa Cruz, em Roma. Em 1986 foi ordenado
sacerdote, e exerce desde então o respectivo ministério no âmbito da
prelatura do Opus Dei. Além de escrever regularmente na imprensa
periódica, é autor, entre outras obras, de Histórias e Morais (Alêtheia,
2011) e co-autor de Auto-de-Fé, a Igreja na inquisição da opinião
pública.
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