No
experimento, alunos disseram 'dominar' conceitos matemáticos que não existem
Estudo
feito com 40 mil alunos de 15 anos indica que adolescentes declaram ter
conhecimento, experiência
ou expertise sobre assuntos que, na verdade,
desconhecem
Jovens
são propensos a superestimar seu conhecimento, experiência e expertise sobre
assuntos que, na verdade, eles não dominam. É um tipo de síndrome dos sabe-tudo
na juventude.
A frase
pode parecer uma afirmação peremptória, mas é o resultado de um estudo empírico
feito com mais de 40 mil estudantes de 9 países.
Liderado
pela economista Nikki Shure, professora de Ciência Social do Instituto de
Educação da University College London, no Reino Unido, o estudo “Bullshitters:
Who Are They and What Do We Know about Their Lives?” foi publicado pelo
Instituto de Economia do Trabalho, na Alemanha, em abril de 2019.
A
expressão coloquial “bullshit”, na língua inglesa, pode ser traduzida como
“bravata”, “lorota” ou “mentira”. A palavra “bullshitters”, que dá título ao
estudo, por sua vez, pode ser simplificada como “bravateiro” ou “picareta”.
Em geral,
eles são super confiantes e imaginam que são admirados diante dos colegas. Em
outras palavras, pensam que são mais inteligentes do que realmente são.
“Bravata é um fenômeno social bem conhecido.
“Bravata é um fenômeno social bem conhecido.
É a situação em que um indivíduo diz ter
conhecimento,
experiência ou expertise em um assunto, quando, na realidade, não
tem.
O rótulo ‘bravateiro’ é então atribuído para alguém
que faz essas
afirmações regularmente, por exemplo,
alguém que constantemente exagera ao
narrar
suas proezas e/ou frequentemente diz inverdades.
Embora o conceito seja
conhecido
na vida cotidiana - todos nós provavelmente
conhecemos um bravateiro
- há pouca
pesquisa acadêmica na área”
N. Shure,
J. Jerrim e P. Parker autores do
estudo “Bullshitters: Who Are They and What Do
We Know about Their Lives?”
Quem são os ‘bullshitters’
No estudo
que expôs essas conclusões, Shure e sua equipe, os acadêmicos John Jerrim e
Phil Parker, partiram do banco de informações do Pisa (Programa Internacional
de Avaliação de Estudantes) de 2012.
Realizado
pela OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) desde
2000, o exame avalia estudantes de 15 anos, principalmente nas áreas de
ciência, interpretação de texto e matemática.
No teste,
os participantes também completam um questionário que busca traçar um perfil
dos jovens a partir de dados demográficos, experiências e expectativas na
escola.
De um
total de 2.689 escolas e 62.969 alunos, em 9 países anglófonos (onde o inglês é
a língua oficial ou dominante), os pesquisadores filtraram uma amostra de
40.550 jovens. No critério da triagem, todos eles responderam à questão:
pensando em conceitos matemáticos, quão familiarizado você é com os seguintes
termos?
Na
sequência estavam listados 16 termos:
- Cosseno
- Divisor
- Equação
linear
- Escalonamento
subjuntivo
- Figura
geométrica congruente
- Fração
declarativa
- Função
exponencial
- Função
quadrática
- Média
aritmética
- Número
próprio
- Número
complexo
- Número
racional
- Polígono
- Probabilidade
-
Radicais
- Vetores
Entre os 16 termos, há 3 que não existem: “número próprio”, “escalonamento subjuntivo” e “fração declarativa”.
Entre os 16 termos, há 3 que não existem: “número próprio”, “escalonamento subjuntivo” e “fração declarativa”.
Entretanto,
muitos estudantes disseram “dominar” esses conceitos falsos - a ideia segue a
lógica do “experimento” social feito no festival de música Coachella, na
Califórnia, onde hipsters diziam conhecer bandas inexistentes em uma pegadinha
do humorista americano Jimmy Kimmel, em 2013.
A partir
dessa triagem, os autores analisaram os “bravateiros” a partir de critérios
como condição sócio-econômica e gênero. Foram aplicadas questões específicas
sobre autoconfiança e popularidade no colégio.
Uma
delas, por exemplo, questionava como os estudantes se sentiam diante das
seguintes frases:
- Eu
consigo lidar com muitas informações
- Eu
consigo compreender informações rapidamente
- Eu
busco explicações
- Eu
consigo relacionar fatos facilmente
- Eu
gosto de resolver problemas complexos
A partir das respostas aos questionários, os autores analisaram o conjunto das informações. Descobriram que, em média, os garotos são mais bravateiros que as garotas (uma diferença de 0,48 pontos na Europa e de 0,25 pontos nos Estados Unidos, por exemplo).
A partir das respostas aos questionários, os autores analisaram o conjunto das informações. Descobriram que, em média, os garotos são mais bravateiros que as garotas (uma diferença de 0,48 pontos na Europa e de 0,25 pontos nos Estados Unidos, por exemplo).
Os
adolescentes mais ricos também são mais propensos a bravatas do que os menos
privilegiados (um “gap” de 0,65 pontos na Escócia, e de 0,20 na Inglaterra).
Entre os
países analisados, a maior concentração de jovens sabe-tudo está na América do
Norte (Canadá e Estados Unidos, na sequência). Na outra ponta estão Irlanda do
Norte e Escócia.
Para os
autores, esses resultados indicam que os estudantes mais bravateiros querem se
destacar entre os outros, construindo uma imagem de autoconfiança sobre suas
proezas acadêmicas e suas habilidades para resolver problemas.
A psicologia da ‘bravata’
O fenômeno
cultural da bravata também foi tratado como “pseudo-profound bullshit” (mentira
pseudo-profunda, em tradução livre) pelo psicólogo americano Gordon Pennycook,
em estudo de 2015. Segundo Pennycook, as pessoas são mais receptivas a ouvir
frases pseudo-profundas e vazias do que verdades.
Em 2005,
o filósofo Harry Frankfurt, professor emérito da Universidade Princeton,
escreveu o ensaio “On Bullshit”, que foi publicado como livro e se tornou um
best-seller. No Brasil, foi traduzido como “Sobre Falar Merda” (ed.
Intrínseca).
Segundo
Frankfurt, todo mundo conta mentirinhas. Diferentemente de uma mentira (que se
opõe convictamente à verdade), uma bravata não tem preocupações com a verdade,
mas com a impressão que deixará diante dos outros. Trata-se, segundo o filósofo,
de pura enrolação de alguém disposto a comentar assuntos mesmo sem a menor
ideia do que está dizendo.
Em outro
estudo, de 1999, os acadêmicos David Dunning e Justin Kruger, da Universidade
de Cornell, propuseram uma série de questões para estudantes de graduação e
depois pediram para cada um estimar sua própria pontuação geral e sua posição
em comparação aos outros.
Resultado:
os que tiveram os resultados mais baixos nos testes superestimavam o próprio
desempenho. Essa tendência de inflar a própria avaliação, um tipo de ilusão de
autoconfiança, ficou conhecida como “efeito Dunning-Kruger”.
No estudo
de Nikki Shure, os autores reconhecem as limitações do estudo, focado apenas
nas questões do contexto escolar. Admitem que, embora a expressão “bullshitters”
tenha sentido negativo, a ideia pode ser útil em situações como entrevistas de
emprego e negociações - e assinalam intenção de, no futuro, pesquisar os
efeitos da bravata, por exemplo, no mercado de trabalho.
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Reportagem Por Juliana Sayuri
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