Análise
Por STEVEN ERLANGER
PARIS - A França e os Estados Unidos têm noções diferentes de liberdade,
igualdade e fraternidade, embora as palavras sejam semelhantes nas duas
línguas. Os métodos de combate ao terrorismo local também são muito
diferentes, derivando de histórias, sistemas jurídicos e concepções de
Estado diferentes.
Em março, os horrores em Toulouse -o assassinato de sete pessoas em
pouco mais de uma semana por Mohammed Merah, um francês de 23 anos que
alegou pertencer à Al Qaeda- levantaram um forte debate na França sobre
se a polícia e os serviços de segurança falharam ou não em identificá-lo
a tempo.
Merah passou pela peneira francesa, que é fortemente baseada em
inteligência e avaliação humanas. Os franceses se perguntam por quê e se
ele poderia ter sido mais facilmente identificado pelo método
americano, mais automatizado -e caro- de monitoração computadorizada de
telefonemas e da internet. As diferenças entre os dois países e seus
métodos são consideráveis.
"Nos Estados Unidos, é o sistema que conta. Na França, são os homens",
diz Marc Trévidic, renomado magistrado que pesquisa terrorismo na
França.
Depois dos atentados de 11 de setembro de 2001, os americanos investiram
recursos enormes na "guerra global ao terrorismo". Esta incluía
localizar os potenciais terroristas islamitas no país, em meio a uma
pequena e bem integrada população muçulmana. Os franceses vêm lidando
com o terrorismo (e o islã) há muito mais tempo. Com o maior número de
muçulmanos na Europa -quase 10% da população-, a França se concentrou em
evitar o recrutamento de potenciais terroristas por meio da infiltração
em mesquitas e redes radicais.
Em parte por causa de sua história e em parte por causa dos orçamentos
mais limitados, os franceses contam mais com inteligência e recursos
humanos locais e menos com grampos telefônicos e vigilância automatizada
do que os americanos. Isso pode tornar os franceses bem informados, mas
menos sistemáticos, menos capazes de "ligar os pontos" que os
americanos. De modo geral, disse o juiz Trévidic, os franceses têm um
décimo dos recursos dos americanos.
O Estado francês é altamente centralizado. Cansada dos atentados à bomba
nos anos 1980, a França tentou coordenar melhor a inteligência
doméstica e estrangeira com o estabelecimento em 1984 da Unidade de
Coordenação da Luta Antiterrorista (Uclat).
O combate ao terrorismo é menos centralizado nos EUA. As tensões entre o
FBI, a Agência Central de Inteligência (CIA) e as agências locais ou
estaduais são legendárias, especialmente entre o FBI e o Departamento de
Polícia de Nova York. Essa tensão é o tema central do livro "Securing
the City" ["A Segurança da Cidade"], de Christopher Dickey (2009).
"A França é um país com duas forças policiais", nota Dickey, "ambas nacionais, por isso há menos rivalidade entre órgãos."
Legalmente, os franceses centralizaram os casos de terrorismo em um
tribunal e tentaram reintegrar os processos de combate ao terrorismo em
uma lei regular, mas com mais flexibilidade para as investigações de
terrorismo agirem, ordenar grampos e deter suspeitos por um período de
tempo maior. Os EUA estão tentando reconciliar o processo legal com o
combate ao terrorismo -veja a dificuldade para fechar o centro de
detenção na baía de Guantánamo ou a discussão sobre julgar os detidos em
tribunais civis ou militares.
O Estado francês também tem muito poder para espionar a vida dos
cidadãos e deter suspeitos em nome da prevenção. Sua abordagem foi
criticada por preconceito racial e abuso dos direitos civis. E quando
ela falha enfrenta duras críticas da opinião pública.
Desde 1995, quando atentados à bomba aterrorizaram Paris, os franceses
não enfrentam um ataque na escala do que ocorreu em Toulouse -algumas
coisas claramente estão dando certo. Mas para eles, isso é um pequeno
consolo, assim como o sucesso dos EUA em evitar outro ataque em seu
território não serve para consertar os erros anteriores.
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Fonte: Folha on line, 09/04/2012 - http://www1.folha.uol.com.br/fsp/newyorktimes/35945-combate-ao-terrorismo-a-francesa.shtml
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