José Roberto de Toledo*
No sistema de poder brasileiro, milhares de manifestantes nas ruas não
se equivalem a algumas dezenas de peemedebistas nos palácios.
No
sistema de poder brasileiro, milhares de manifestantes nas ruas não se
equivalem a algumas dezenas de peemedebistas nos palácios. Selfie por
selfie, enquanto uns se imortalizam em autorretratos, outros perpetuam o
interesse próprio. Por mais que gritem, caras-pintadas nunca são tão ouvidos quanto caras de pau. Não é questão de boniteza, é apenas como funciona.
O jogo político continua sendo decidido entre paredes, em ambientes com ar condicionado projetados por Oscar Niemeyer. Em Brasília, o PMDB joga sempre em casa. O PT acha que a casa é dele, mas sofre da síndrome do inquilino que se julga proprietário.
Os presidentes passam, e os peemedebistas ficam. Muito antes de
adolescentes ficarem uns com os outros, o PMDB já ficava com o poder.
Namoradeiro, parece que vai ficar de novo.
O jantar da semana passada na casa de Eunício Oliveira,
líder do PMDB no Senado, estará para sempre na crônica política do País
como o melhor serviço de vinho já experimentado entre poderosos. Mas
enquanto todos atentavam aos respingos da noite, esqueceu-se o contexto
da festa: Michel Temer e os 40 senadores. O vice-presidente inconformado com o prefixo era o não senador mais desenvolto entre os convivas. Circulava como candidato eleito.
Quarenta senadores não é um número qualquer. Trata-se da metade da Casa,
se considerarmos que o presidente nunca vota. É o mesmo presidente,
Renan Calheiros, que, além de ser um dos festeiros, está trabalhando
abertamente para que a última palavra sobre o afastamento de Dilma
Rousseff da Presidência seja dos senadores.
Segundo a vontade de Renan, também cabe ao Senado decidir pela abertura do processo de impeachment do presidente da República. Esse desejo seria irrelevante se não tivesse respaldo em outros ambientes refrigerados de Brasília. O procurador-geral Rodrigo Janot
escreveu ao Supremo Tribunal Federal sustentando a mesma tese. E ainda
defendeu que a decisão seja por maioria de votos. Isto é, o cargo de
Dilma estaria nas mãos de 41 senadores.
Há
quem tenha comemorado tal parecer entre os petistas. Mas quem deve
celebrar, mesmo, são os senadores. Alijados até agora das contabilidades
contra e a favor do impeachment, estão à beira daquilo que um tuiteiro chamou de “Black Friday” do Senado. Quem decidirá se Papai Noel existe ou não para a Câmara Alta é o Supremo Tribunal Federal (STF).
Congresso Nacional visto a partir das colunas do prédio que abriga o Supremo Tribunal Federal: mais do que nunca, questões internas do parlamento brasileiro vêm sendo dirimidas pelo STF! |
Nesta quarta-feira, os ministros de toga devem definir o rito do impeachment.
Rito, no caso, tem duplo sentido. Significa não só quais são os
quóruns, prazos e arenas, mas também o ritual. A decisão servirá para
dar pompa e respeitabilidade a um processo que vem sendo comandado só
por Eduardo Cunha e similares. Ao ritualizar os procedimentos, o STF ajudará a legitimá-lo.
Quem
convive cotidianamente com os ministros aposta que eles reproduzirão,
com um data vênia aqui e ali, o rito decidido e publicado pelo próprio
STF em 1992, para orientar o impeachment do então presidente Fernando Collor. Se for assim, o Senado vai ter sua cota de decisão, assim como a Câmara. Na prática, significará que o afastamento da presidente terá que ser referendado pelas três principais instâncias da República.
Ao final, se Dilma não tiver seis ministros no STF, não evitar os votos de 342 deputados contra ela e tampouco convencer 41 senadores a não votarem pelo impeachment(vale se ausentar ou se abster), é porque terá perdido o mínimo de sustentação que um presidente precisa para continuar no cargo. Pelo sorriso indisfarçado de Temer, ele e o PMDB já fizeram as três contabilidades e gostaram do resultado.
Na
dúvida de com quantos senadores pode contar, Dilma poderia pedir a
Eunício que promova outro jantar e que, desta vez, a convide em vez de
Temer. É só ver quantos aparecerão. Não vale, porém, convidar Kátia
Abreu e José Serra [a ministra da agricultura, Kátia Abreu, jogou uma
taça cheia de vinho no rosto do senador Serra por este a ter chamado de
“namoradeira”]. Ou um ou outro.
------------
* Colunista do Estado de São paulo.
Fonte: O Estado de S. Paulo – Política – Segunda-feira, 14 de dezembro de 2015 – Pg. A6 – Internet: clique aqui.
Nenhum comentário:
Postar um comentário