Mudam os instrumentos de comunicação, mas não
muda a nossa necessidade de comunicar.
Mudam os instrumentos de comunicação, mas não muda a nossa necessidade de comunicar: essa é a mensagem de Quando la fede si fa social [Quando a fé se faz social], o novo livro do padre Antonio Spadaro, que a editora EMI publica na coletânea Segni dei Tempi (64 páginas). Uma reflexão rápida e documentada, em que o diretor da revista La Civiltà Cattolica
revisa oportunidades e limites das mídias digitais, detendo-se, com
atenção particular, nas características que podem fazer da rede um lugar
de relações autênticas, também à luz do Evangelho e do magistério do Papa Francisco.
O jornal Avvenire, 26-11-2015, publicou um trecho do livro. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
A existência "virtual"
parece se configurar com um status ontológico incerto: prescinde da
presença física, mas oferece uma forma, às vezes também vívida, de
presença social.
Ela, certamente, não é um simples produto da consciência, uma imagem
da mente, mas também não é uma res extensa, uma realidade objetiva
comum, até porque só existe no acontecer da interação. As esferas
existenciais envolvidas na presença em rede, de fato, devem ser mais bem
investigadas no seu entrelaçamento. Abre-se diante de nós um mundo
"intermediário", híbrido, cuja ontologia deveria ser investigada melhor
para uma compreensão teológica.
Certamente, uma parte da nossa capacidade de ver e de escutar já está
claramente "dentro" da rede, de modo que a conectividade já está em
fase de definição como um direito cuja violação incide profundamente nas
capacidades relacionais e sociais das pessoas.
A nossa própria identidade é cada vez mais vista como um valor a ser
pensado como disseminado em vários espaços e não simplesmente ligado à
nossa presença física, à nossa realidade biológica. [...]
Como observa o Papa Francisco, na parábola
evangélica do "próximo", ou seja, do "comunicador", o levita e o
sacerdote "não veem um seu próximo, mas um estranho de quem era melhor
manter a distância". E hoje este é o risco: "Que alguns meios de
comunicação estabeleçam uma 'lei' e uma 'liturgia' capazes de nos
induzir a ignorar o nosso próximo real para buscar e servir outros
interesses".
Isso também vale para as "leis" e as "liturgias" cristãs: evangelizar
não significa, de fato, fazer "propaganda" do Evangelho. Não significa
"transmitir" mensagens de fé. O Evangelho não é uma mensagem entre as
tantas outras.
Portanto, evangelizar não significa "inserir conteúdos declaradamente religiosos" no Facebook e no Twitter.
Além disso, a verdade do Evangelho não traz o seu valor da sua
popularidade ou da quantidade de atenção (das "curtidas") que recebe. Ao
contrário, o papa reitera a necessidade de estar disponível para os
outros homens e mulheres que nos rodeiam, para "se envolver
pacientemente e com respeito nas suas questões e nas suas dúvidas, no
caminho de busca da verdade e do sentido da existência humana".
Testemunhar, portanto, significa, acima de tudo, viver uma vida comum
alimentada pela fé em tudo: visão de mundo, escolhas, orientações,
gostos e, portanto, também modo de comunicar, de construir amizades e de
se relacionar dentro e fora da rede. E, consequentemente, como o
escreveu o papa, também "testemunhar com coerência, no próprio perfil
digital e no modo de se comunicar, escolhas, preferências, juízos que
sejam profundamente coerentes com o Evangelho, mesmo quando não se fala
explicitamente dele".
A Igreja em rede, portanto, é chamada não a ser uma "emissora" de
conteúdos religiosos, mas um "compartilhamento" do Evangelho em uma
sociedade complexa. O Evangelho não é mercadoria a se vender em um
"mercado" saturado de informações. Muitas vezes, é muito eficaz uma
mensagem discreta, capaz de despertar interesse, desejo pela verdade e
mover a consciência.
Isso permite evitar a armadilha do costume a um anúncio que já é
considerado conhecido, já visto, já ouvido. No testemunho, é preciso
aprender com o episódio do encontro do Cristo ressuscitado com os discípulos de Emaús
(Lc 24, 13-35), em que o Senhor se aproxima dos dois homens "com o
rosto triste", abrindo com delicadeza os seus corações para o
reconhecimento do mistério.
A possível separação entre conexão e encontro, entre partilha e
relação implica o fato de que, hoje, as relações, paradoxalmente, podem
ser mantidas sem renunciar à própria condição de isolamento egoísta. Sherry Turkle
resumiu essa condição no título de um livro seu: "Juntos, mas
sozinhos". A fratura na proximidade é dada pelo fato de que a
proximidade é estabelecida pela mediação tecnológica, razão pela qual
está "perto" de mim, isto é, próximo, quem está "conectado" comigo.
Qual é o risco, então? O de estar "longe" de um amigo meu que mora perto, mas que não está no Facebook
e usa pouco o e-mail, e, ao contrário, de sentir "perto" uma pessoa que
eu nunca encontrei, que se tornou minha "amiga" porque é amiga de um
amigo meu e com a qual eu tenho um intercâmbio frequente na rede.
Essa estranheza tem raízes profundas no anonimato da sociedade de
massa. Até o início do século XX, a maioria da população vivia em âmbito
agrícola, e as pessoas certamente conheciam não mais do que
pouquíssimas centenas de rostos na sua vida. Hoje, o contrário é normal,
isto é, não reconhecer os rostos encontrados pelas ruas, e é óbvio que o
próximo é substancialmente um desconhecido.
A passagem problemática é que se começa a avaliar a proximidade com
critérios elementares demais, desprovidos da complexidade própria de uma
relação verdadeira, profunda.
A tecnologia habitua cada vez mais o cérebro a aplicar a experiência
do videogame, que se baseia na lógica "resposta certa/resposta errada"
aos estímulos que enviamos ao nosso interlocutor. Cristãmente, o
"próximo", porém, certamente não é aquele que oferece "respostas certas"
aos nossos estímulos em relação a ele.
A lógica evangélica é muito clara sobre isso: "Se vocês amam somente
aqueles que os amam, que gratuidade é essa? Até mesmo os pecadores amam
aqueles que os amam. Se vocês fazem o bem somente aos que lhes fazem o
bem, que gratuidade é essa? Até mesmo os pecadores fazem assim. E se
vocês emprestam somente para aqueles de quem esperam receber, que
gratuidade é essa? Até mesmo os pecadores emprestam aos pecadores, para
receber de volta a mesma quantia. Ao contrário, amem os inimigos, façam o
bem e emprestem, sem esperar coisa alguma em troca. Então, a recompensa
de vocês será grande, e vocês serão filhos do Altíssimo" (Lc 6,32-35).
Depois, quando o evangelista Lucas fala de "fazer o
bem", hoje deveríamos entender isso no sentido mais literal possível. O
contato de videogame na rede se desenvolve substancialmente graças a
"palavras", isto é, contos, mensagens escritas.
Uma vez, por exemplo, ser amigos para os jovens só era possível se se
fazia alguma coisa juntos, se houvesse uma atividade compartilhada, de
ir comer uma pizza, a tocar juntos, ou participar de um grupo.
Hoje, em vez disso, é possível ser "amigo" mesmo simplesmente escrevendo a própria vida em um mural eletrônico.
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Fonte: http://www.ihu.unisinos.br/noticias/549732-quando-o-meu-proximo-se-torna-qsocialq-artigo-de-antonio-spadaro 02/12/2015
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