Margarete Hülsendeger*
E daí se
eu gosto de histórias românticas e com uma dose extra de açúcar? Será
que temos de ser sempre politicamente corretos e ler apenas o que os
críticos consideram aceitável? Percebo nesse tipo de atitude uma forte
dose de preconceito e – por que não? – esnobismo.
Por
outro lado, não estou defendendo o abandono das leituras comprovadamente
de qualidade para só nos debruçarmos sobre o que nos proporciona um
prazer imediato e, muitas vezes, superficial. Não é isso. Ler Borges ou
Saramago é, sem dúvida nenhuma, um exercício de maturidade literária.
São autores que, no seu texto, aprofundam de maneira complexa os mais
simples sentimentos. O mesmo poderia dizer de Machado de Assis, Rubem
Fonseca, Clarice Lispector, entre outros. No entanto, impor essas
leituras aos outros, a ponto de torná-las uma espécie de dogma de fé,
parece um pouco de exagero. Nem sempre estamos no clima para
mergulharmos em obras que irão nos exigir horas de análise e
interpretação.
Conheço
pessoas que se sentem envergonhadas em assumir leituras que a critica
não considera de alto nível – os famosos e rentáveis best sellers,
por exemplo. Para evitar constrangimentos, preferem mentir, passando a
citar livros e autores que, segundo elas, terão mais chances de serem
bem aceitos. Como forma de endossar esse fato temos o resultado de uma
pesquisa do jornal inglês The Guardian afirmando que 65% das
pessoas entrevistadas confessaram terem mentido sobre a leitura de
livros. Na verdade, o que essas pessoas temem é o julgamento e, em
alguns casos mais radicais, até a discriminação.
Particularmente,
não tenho preconceitos. Ao contrário. Leio de tudo e se está na lista
dos mais vendidos aí sim o meu interesse aumenta. É claro, que muitas
vezes me decepciono e até tenho alguma dificuldade para compreender a
razão de tanto sucesso. No entanto, a decepção só ocorre porque me
predispus a ler, antes disso não havia motivos para esboçar qualquer
tipo de julgamento. A simples crítica pela crítica não contribui. Ao
contrário. Ela aprofunda ainda mais os preconceitos e afasta as pessoas
de um hábito extremamente saudável, a leitura.
Aqueles
que se arvoraram nos guardiões da boa literatura devem, na minha
opinião, realizar um exercício de humildade e se questionar sobre os
“comos” e os “porquês” de certos autores conseguirem tanta popularidade.
O exemplo mais emblemático, pelo menos aqui no Brasil, é Paulo Coelho.
Seus livros estão sempre entre os mais vendidos, e não só no Brasil. Na
França, por exemplo, suas obras encontram-se frequentemente no topo da
lista dos mais lidos. Será que todos esses leitores, que escolheram
Paulo Coelho como seu autor favorito, são um bando de ignorantes? Duvido
muito.
O fato
de não gostarmos de um autor não significa que ele seja destituído de
qualidades. Talvez a sua mensagem não seja aquela que você deseje ou
considere a mais adequada, mas pode ser a ideal para
outra
pessoa. É preciso avaliar com muito cuidado nossos padrões de qualidade
para que eles não se tornem elitistas demais. Esse é, sem dúvida
nenhuma, um comportamento muito perigoso. Ao insistirmos nele estaremos
nos convencendo – e querendo convencer os outros – que apenas as nossas
escolhas e opiniões são as mais corretas e esclarecidas, enquanto os
outros são incompetentes ou ignorantes demais para entender.
Ler deve
ser um prazer para mente e para o espírito. Mario Quintana já dizia que
o verdadeiro analfabeto era aquele que apesar de saber ler, não
desfrutava do prazer da leitura. Assim, se a sua mente lhe pede açúcar,
qual é o problema? Por que não ouvi-la? O importante é ler. E se ao
longo desse processo seu gosto for se tornando mais apurado e, quem
sabe, aproximar-se do gosto dos críticos, melhor ainda. Só não se deixe
pautar ou rotular.
Portanto,
repito: o importante é ler. Não interessa por qual autor ou obra você
vai começar, o importante – o essencial – é que não deixe nada por ser
lido. E se alguma pessoa lhe disser que a sua escolha não é a melhor ou a
mais qualificada, lembre a ela que esse julgamento não lhe pertence, só
você será capaz de decidir o que lhe interessa ou lhe dá prazer.
Afinal, ler é um exercício individual e intransferível. Boa leitura!
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* Margarete Hülsendeger é Física e Mestre em Educação em Ciências e Matemática/PUCRS. É mestranda em Teoria Literária na PUC-RS
Fonte: http://www.partes.com.br/2015/10/29/o-importante-e-ler/#.VnGzj3uisy4
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