Gilles Lapouge*
De vez em quando um dirigente europeu anuncia que "a
crise acabou". O povo deixa ele falar, não liga. A crise acabou tantas
vezes nos últimos três anos que gregos, italianos e espanhóis já não têm
mais confiança em Angela Merkel, François Holland, Mario Draghi ou
Mario Monti. E preferem recorrer ao seu velho "truque" para sair da
crise: a fraude fiscal.
Mas os gregos, habituados à fraude fiscal, sabem que, mesmo quando
usada por especialistas não é suficiente para restaurar as contas do
país, tampouco as contas domésticas. Assim, eles partem em busca de um
outro recurso, mais nobre, mais poderoso, a Virgem Maria.
Há algumas semanas multidões se reúnem logo pela manhã diante da
igreja de São Demétrio de Tessalonica, na esperança de poder orar diante
da imagem da Virgem que foi pintada no século 6 e lhe explicar o que se
passa no momento atual.
Em ocasiões normais a imagem está num monastério em Monte Athos,
península habitada por milhares de monges vindos de diversos países
ortodoxos. Mas este ano, excepcionalmente, as autoridades do Monte Athos
autorizaram a saída da Virgem por causa da gravidade da crise.
Na fila que aguarda a abertura das portas da Igreja as mulheres são
predominantes. Por quê? De um lado porque elas têm a tarefa de nutrir
suas famílias e, neste momento, precisam muito que os poderes supremos
lhes deem uma ajuda para conseguir alimentar maridos e filhos.
Mas há uma outra razão: o Monte Athos sempre foi proibido para as
mulheres. Ali não existe um monastério feminino e uma mulher em visita
ao local será imediatamente expulsa. Uma regra draconiana. Prova disso:
mesmo no caso dos animais, as fêmeas são proibidas. Às vezes, podemos
ver galos pelos gramados, mas jamais uma galinha. Coelha também não. Só
coelhos.
Mosteiro São Dionisio - Monte Athos
As autoridades do Monte Athos consideraram desumano impedir as
mulheres de orar nestes tempos difíceis. Tanto mais que a Virgem Maria é
do sexo feminino. Por isso, a imagem está agora na igreja de São
Demétrio.
O gesto foi ainda mais apreciado porque a Igreja Ortodoxa da Grécia é
com frequência objeto de críticas. Com efeito, apesar de ser muito
rica, possuir bens consideráveis, receitas confortáveis, ela sempre foi
isenta do pagamento de impostos, o que, se já é estranho em tempos
normais, é insólito na situação presente. A Igreja Ortodoxa divide esse
privilégio com os armadores gregos, ainda mais ricos do que ela e que
também não pagam imposto.
A Igreja responde aos seus críticos que, como não paga impostos, ela
se dedica a uma série de obras de assistência e contribui para a riqueza
grega.
Aliás, a comunidade monástica do Monte Athos não se contenta apenas
de levar a Virgem para a planície para as mulheres poderem lhe dizer "o
que têm no coração". Ela também financia sopas populares, reúne médicos
voluntários, cuida gratuitamente dos mais vulneráveis e pede a
professores, também voluntários, para dar aulas de reinserção para
desempregados. E parece que esses cursos têm bastante sucesso.
TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO
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* Jornalista e escritor francês.
Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,apelo-a-virgem-maria-,951083,0.htm
Imagem da Internet
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