João Luiz Mauad*
Pouca gente sabe, mas há bons indícios de que a teoria da
relatividade esteja sendo revista. Cientistas do CERN – Organização
Européia para Pesquisa Nuclear – estão analisando evidências de que
algumas partículas subatômicas são capazes de locomover-se em
velocidades superiores a da luz, algo que seria impossível, segundo
Einstein. Caso confirmada, tal descoberta viria atestar, mais uma vez,
que a verdadeira ciência é um processo contínuo, raramente conclusivo e,
acima de tudo, despolitizado.
Ciência não é matéria sujeita a consensos ou escrutínios. Ao
contrário, espera-se que as teorias sejam constantemente testadas e, se
for o caso, falseadas. Imagine como seria a física hoje se Galileu não
tivesse questionado a teoria aristotélica, se Newton não tivesse
estendido e generalizado o trabalho de Galileu e Einstein estivesse
plenamente satisfeito com as conclusões de Newton. Na verdade, o esforço
para “negar” as teorias científicas é tão antigo e saudável quanto a
própria ciência.
É assim que as ciências da natureza trabalham. Observações levam a
hipóteses. Hipóteses são testadas através de experimentos. Os resultados
são divulgados, examinados e duplicados antes que uma boa teoria seja
divulgada. Certezas são raras, leis são muito poucas. Ciência não é
fonte de autoridade, mas de conhecimento.
"Ciência não é matéria sujeita a consensos
ou escrutínios"
Cientistas não são deuses. São seres humanos sujeitos aos mesmos
impulsos que todos nós. Einstein, por exemplo, queria tanto demonstrar
que a teoria quântica era determinística e não probabilística que chegou
a invocar o Todo-Poderoso: “Deus não joga dados com o universo”, teria
dito o alemão, gerando a resposta jocosa de seu colega Nils Bohr:
“Einstein, pare de dizer a Deus o que fazer”.
Esses mesmos impulsos humanos quase sempre nos levem a acreditar que
estamos certos, ou pelo menos do lado certo. No entanto, isso não é
desculpa para endossar métodos e comportamentos não científicos. Muitos
cientistas subscrevem a teoria do Aquecimento Global Antropogênico sem
que tenham feito qualquer pesquisa ou estudo mais aprofundado a
respeito. Adotam tal postura simplesmente porque este seria o lado “in”
da questão. Na maioria dos casos, é assim que o chamado “consenso”
científico é estabelecido.
Infelizmente, estamos cercados de gente que diz saber muito mais do
que realmente sabe. Quando essas pessoas sonham e fazem projetos
contando com seu próprio tempo e dinheiro, tudo bem. O problema é que
muitas dessas pessoas confiam tanto na própria sabedoria que pretendem
impor aos demais os seus planos, utilizando-se para isso da força dos
governos. Esses indivíduos sentem-se capazes de planejar cada detalhe de
nossas vidas, não importa quão bem (ou mal) planejem as suas.
O antídoto contra o uso político da ciência é realçar a própria
falibilidade científica, além de estimular o ceticismo. Não é justo, nem
inteligente, sair por aí chamando de herético quem desconfia da
atividade humana como causa do aquecimento global, ou duvida das
catastróficas previsões dos computadores. Heresia tem a ver com fé, e
ciência não é assunto de fé. A ciência não prescreve dogmas, nem evolui
conforme a opinião da maioria.
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* Administrador de empresas formado pela Escola Brasileira de
Administração Pública da Fundação Getulio Vargas (EBAP/FGV-RJ), João
Luiz Mauad é articulista dos jornais “O Globo” e “Diário do Comércio”.
Escreve regularmente para os sites “Midia@Mais” e “Ordem Livre”.
Fonte: O Globo, 14/10/2012
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