CLÁUDIO MORENO*
William James, psicólogo e pensador americano, sempre fez questão de
frisar, ao longo de toda sua obra, que nunca chegaremos a captar
realmente o que nosso semelhante pode estar pensando ou sentindo –
especialmente se nos basearmos apenas naquilo que podemos enxergar. Como
espectadores, somos verdadeiros fiascos na hora de avaliar o drama dos
outros, pois nosso olhar e julgamento, condicionados por nossos próprios
valores, não conseguem perceber os sentimentos secretos que animam o
comportamento alheio.
James ilustra essa ideia com um belíssimo exemplo que foi buscar nas memórias de Robert Louis Stevenson, o autor de O Estranho Caso de Dr. Jeckyll e Mr. Hyde (que ganhou, no Brasil, o título caricato de O Médico e o Monstro). Na pequena obra-prima intitulada Os Portadores de Lanternas, Stevenson relembra, saudoso, as férias que costumava passar numa cidadezinha do litoral da Escócia, cheia de trilhas selvagens, grutas e penhascos à beira-mar – um local que “parecia ter sido criada especialmente para a diversão de meninos”. Das inúmeras recordações que guardou dessa época dourada, nenhuma lhe foi mais preciosa que a sensação de portar uma lanterna.
Entenda o leitor que estamos na metade do séc. 19 e que estas lanternas primitivas queimavam óleo de baleia. Eram de construção muito simples: tinham a forma cilíndrica de um pequeno lampião, mais ou menos do tamanho de uma lata de ervilhas, dentro da qual ardia uma chamazinha vacilante; para deixar a luz sair, bastava abrir uma pequena portinhola redonda que ficava na lateral. Pois nas últimas semanas do verão, quando as noites já eram escuras como piche e os ventos traziam as primeiras chuvas frias do outono, Stevenson e seus amigos saíam com as lanternas presas ao cinto, protegidas debaixo do capote.
Não eram práticas nem úteis: a luz produzida era ínfima, o metal ficava muito quente, a fumaça do óleo queimado que subia por dentro da roupa era nauseabunda. Nada disso, porém, estava em questão: para um menino daqueles, a essência da felicidade consistia em sair no negror da noite, sozinho, com o casaco abotoado até o pescoço, exultando simplesmente por saber, “no mais profundo de seu ingênuo coração, que a lanterna estava lá”. As pessoas que os viam passar assim, sujos e molhados, deviam fazer o mesmo que nós, injustos e arrogantes, quando nos pomos a julgar a vida de outra pessoa e as decisões que ela toma – esquecendo que, por escuro que nos pareça o caminho escolhido por ela, é possível, se não provável, que ela traga no cinto, escondida de nossos olhos, a sua própria lanterna.
James ilustra essa ideia com um belíssimo exemplo que foi buscar nas memórias de Robert Louis Stevenson, o autor de O Estranho Caso de Dr. Jeckyll e Mr. Hyde (que ganhou, no Brasil, o título caricato de O Médico e o Monstro). Na pequena obra-prima intitulada Os Portadores de Lanternas, Stevenson relembra, saudoso, as férias que costumava passar numa cidadezinha do litoral da Escócia, cheia de trilhas selvagens, grutas e penhascos à beira-mar – um local que “parecia ter sido criada especialmente para a diversão de meninos”. Das inúmeras recordações que guardou dessa época dourada, nenhuma lhe foi mais preciosa que a sensação de portar uma lanterna.
Entenda o leitor que estamos na metade do séc. 19 e que estas lanternas primitivas queimavam óleo de baleia. Eram de construção muito simples: tinham a forma cilíndrica de um pequeno lampião, mais ou menos do tamanho de uma lata de ervilhas, dentro da qual ardia uma chamazinha vacilante; para deixar a luz sair, bastava abrir uma pequena portinhola redonda que ficava na lateral. Pois nas últimas semanas do verão, quando as noites já eram escuras como piche e os ventos traziam as primeiras chuvas frias do outono, Stevenson e seus amigos saíam com as lanternas presas ao cinto, protegidas debaixo do capote.
Não eram práticas nem úteis: a luz produzida era ínfima, o metal ficava muito quente, a fumaça do óleo queimado que subia por dentro da roupa era nauseabunda. Nada disso, porém, estava em questão: para um menino daqueles, a essência da felicidade consistia em sair no negror da noite, sozinho, com o casaco abotoado até o pescoço, exultando simplesmente por saber, “no mais profundo de seu ingênuo coração, que a lanterna estava lá”. As pessoas que os viam passar assim, sujos e molhados, deviam fazer o mesmo que nós, injustos e arrogantes, quando nos pomos a julgar a vida de outra pessoa e as decisões que ela toma – esquecendo que, por escuro que nos pareça o caminho escolhido por ela, é possível, se não provável, que ela traga no cinto, escondida de nossos olhos, a sua própria lanterna.
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* Professor. Ensaista. Escritor. Colunista da ZH
Fonte: http://www.clicrbs.com.br/zerohora/02/10/2012
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