sexta-feira, 24 de março de 2023

Idade das coisas

por Juremir Machado da Silva

 Idade das coisas

Foto: Sergio Louruz/SMAMUS PMPA 

 

Qual a minha idade mental? Eis a questão que me obceca.

Eu me acho jovem em relação aos meus 61 anos de idade mais ou menos bem vividos. Vejamos, porém, como me posiciono diante de marcadores de geração. Uber ou táxi? Os dois. Mau começo. A ambiguidade é sempre lida negativamente. O jovem não hesita: Uber. Jura que é sempre mais barato, mais limpo, mais confortável e mais seguro. Recusa-se a usar táxi. Eu procuro bom serviço pelo melhor preço e com o sistema social menos injusto. Táxi e Uber não passam em teste de legislação trabalhista. No resto, alternam-se no bom e no ruim. Acho os dois sistemas interessantes. Sou a favor do táxi-uber.

No futebol, modelo clássico ou tike-taka, jogo posicional e saidinha de três? Os dois. Depende dos jogadores à disposição e das estatísticas? O que será estatisticamente mais eficaz, a saída de trás de pé em pé com o adversário marcando alto e podendo roubar e ficar na cara do gol a qualquer momento ou o goleiro chutar para colocar a bola em disputa depois do meio do campo? A primeira ideia pretende valorizar a posse da bola, sem ter de disputá-la. A segunda tem uma astúcia: se ganhar na disputa, o que parece ocorrer boa parte das vezes, fica mais perto do gol do oponente; se perder, está longe do próprio gol e corre menos perigo. A coisa continua mal. Jovem ama o novo modelo. Jovem é neotático. Chute para a frente é chutão. Deu.

“Tudo em todo lugar ao mesmo tempo” é obra-prima ou filme chato? Não vacilo: muito chato. Ferrou de vez. Jovem acha maravilhoso. Mas por que seria tão maravilhoso assim? Por ser novo, ora. Como se sabe que é novo? Por ser acelerado, diferente, com universos paralelos. Hora de botar os pingos nos is e no que aceitar pingos: o que define o velho é a sua relação com o novo. Quem gosta do novo por ser novo é novo (jovem). Quem gosta do novo por ser bom, na sua opinião, é velho. Creio que nunca fui tão didático. Outro sinal de velhice. Foi mal!

Sociologia, história e filosofia ou projeto de vida? Paulo Coelho ou Harry Potter? Talvez os dois já sejam coisa de velho. Sertanejo ou MPB? Chico Buarque ou Luan Santana? Gal Costa ou Maiara e Maraísa? Linguagem inclusiva ou português de sempre? Todos, todos e todas, ou todos, todas e todes? Aqui já há uma alternativa evolutiva fora do binarismo. Deitar tarde e acordar tarde? Deitar cedo e acordar tarde? Deitar cedo e acordar muito cedo? O jovem na plenitude deita cedo (da manhã) e acorda cedo (da tarde). O velho deita cedo (da tarde) e acorda tarde (da noite). Tem uma pergunta que facilita a definição: rock ou tudo o que veio depois? Como se sabe, rock é música de velhinho septuagenário. Papo reto ou complexidade? Cada vez pior.

Se ainda existir dúvida, Pelé ou Messi? A juventude passa. A velhice fica. Velho mesmo é quando se começa a saber que se sabe muito pouco e que as certezas da juventude eram pura teimosia ou falta de tempo para mudar de ideia. Enfim, velho é quem entra no “Meu INSS” para saber quanto tempo falta para a aposentadoria. Quem faz isso?

*Prof. Universitário PUCRS. Jornalista. Escritor.

Fonte: https://www.matinaljornalismo.com.br/matinal/colunistas-matinal/juremir-machado/juremir-idade-das-coisas/  24/03/2023

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