segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Piloto de Fórmula-1 diz que acidente é "a melhor maneira de morrer"

O vaticínio é feito pelo inglês Lewis Hamilton (foto).
Um dos assuntos mais comentados do final de semana no GP da Índia de F-1 foi a morte de dois pilotos nos últimos dias: o inglês Dan Wheldon, na Fórmula Indy, e do italiano Marco Simoncelli, na Moto GP.
O inglês Lewis Hamilton deu uma declaração polêmica, dizendo que os pilotos assumem o risco de acidentes por amar o que fazem.
"Você faz o que faz porque é aquilo que você ama. Ninguém quer estar nessas situações, mas, para mim, se for para morrer, não posso imaginar uma maneira melhor. Eu sempre disse que se eu for partir, então em um carro de corrida seria a maneira de fazê-lo. É o que eu amo" - disse Hamilton.

Antes da largada do GP da Índia, foi respeitado um minuto de silêncio pela morte dos dois pilotos.
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Eu Laiko!

 Luciano Pires
Num dos eventos em que palestrei um dos apresentadores foi um jovem executivo de uma grande agência de propaganda global. Coube a ele tratar das novas mídias e formas de fazer negócios utilizando a internet. Ele anunciou que trataria de “retail”, “mobile”, “social media”, “devices” e uma sucessão de termos em inglês que não estavam apenas nas imagens projetadas na tela, mas em seu vocabulário. Se um iPad pudesse falar acho que falaria como ele, um cruzamento de português com iPad, uma espécie de dialeto, o aipedês... Em cada frase uma palavra em aipedês, como “basta uploudar”. E lá pelas tantas ele colocou na tela a imagem daquele sinal de positivo, a mãozinha com o dedão levantado característica do Facebook, dizendo que aquele sistema do “like it” (“curtir”) é a grande sensação. E soltou o petardo:
- Todo mundo quer ser laikado!
Todo mundo quer ser laikado... puro aipedês!
Quando uma tendência passa a influenciar a forma como falamos, significa que deixou de ser um modismo para ser um fenômeno social. A tecnologia, especialmente aquela voltada ao mundo dos computadores, da internet, já é um fenômeno cultural que influencia vários aspectos de nossa vida.
O desenvolvimento da internet e de tudo aquilo que ela proporcionou, sofreu uma virada no ano 2000, quando estourou a bolha especulativa que produziu (e destruiu) negócios bilionários. Ali tivemos certeza de que vivíamos uma mudança profunda. Mais de uma década se passou a ainda não entendemos direito como tirar proveito desse novo mundo virtual.Eu faria uma aposta. O grande estouro da internet, o momento de mudança definitiva na humanidade começará mesmo por volta de 2018, basicamente por dois motivos:
Pouco dias atrás anunciou-se que a Índia estava lançando um modelo de tablet (olha o aipedês!) que custará entre 20 e 40 dólares, com o objetivo de atender a uma população de 200 milhões de estudantes indianos. Você leu direito: 200 milhões! Esse barateamento e conseqüente multiplicação daquilo que o rapaz do começo deste texto chamou em aipedês de “devices” acontecerá rapidamente em todo o mundo. Dá para imaginar o impacto em 8 anos?
Mas o mais importante vem agora: em 2018 a garotada que tinha 10 anos de idade em 2000 estará completando 28 anos. Uma geração que cresceu dentro da internet, que interage e se comunica diferente das gerações mais antigas, a minha e a sua... Aos 28 anos de idade, essa moçada estará assumindo postos de chefia, de gerência, de direção no governo e nas empresas.
Seu chefe falará aipedês! No Brasil, nos Estados Unidos, na França, na Índia, na Indonésia, no Butão e na Rodésia.
Começo a achar que o aipedês um dia conseguirá aquilo que se tentou com o esperanto: uma linguagem universal. Você duvida?
Pois então... Prepare-se meu amigo, minha amiga. O mundo que vem por aí não fala nossa língua. É melhor ir treinando...
Eu laiko, tu laikas, ele laika. Nós laikamos, vós laikais , eles laikam.
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*Luciano Pires é editor do Café Brasil
Fonte: http://www.portalcafebrasil.com.br 27/10/2011

Siri: 8 formas como ele vai mudar o mundo e o cérebro humano

Adriele Marchesini*
Apple
Muito mais do que comando de voz. O que a tecnologia de Inteligência Artificial Siri, presente no iPhone 4S, traz é uma quebra de paradigma total da forma como interagimos com tecnologia e entre nós mesmos. Depois do pontapé dado pela Apple, podemos esperar um mundo ainda inimaginável para o futuro, no qual dividir homem e máquina, digital e físico, serão coisas tão difíceis quanto separar cérebro e pensamento, alma e corpo.
“O fato de estar presente em uma plataforma móvel, agregado a uma série de serviços, vai fazer com que sistemas inteligentes aprendam em uma faixa muito maior do que qualquer sistema já aprendeu antes. Era difícil fazer um sistema preditivo. Para fazer interação com usuário, ou eu fazia uma pesquisa, com papel, ou apostava em métodos extremamente lentos. A internet conseguiu quebrar essas barreiras”, pontuou João Bernartt, diretor da Chaordic Systems .
Bráulio Medina Dias, especialista no tema, sócio da e-Brane e Advisor na Lifeboat Foundation, organização mundial focada em prevenir a humanidade de qualquer tipo de catástrofe que possa colocá-la em risco, inclusive no caso de problemas envolvendo o tema de Inteligência Artificial, pontuou oito grandes mudanças que a iniciativa da Apple pode trazer para nossas vidas. Se você é fã de ficção científica, vá em frente. Se tem medo de mudanças, pare por aqui.

1.Busca: o primeiro deles é mais simples. A interação que temos com mecanismos de buscas, que engloba quase todo o conteúdo disponível na web, vai mudar totalmente. Hoje, cerca de 90% dos brasileiros vão até a caixa branca do Google e digitam o que querem encontrar. Agora, as pessoas apenas falarão para o Siri qual sua dúvida, que ele varre sites como Wikipédia para encontrar a informação. “Se o usuário quiser uma informação rápida, como qual o hotel mais barato na região, ele terá uma indicação em segundos”, sugeriu Medina.

2.Além do comando de voz: A grande questão é que o Siri não será um sistema de comando por voz, do tipo: ligue para tal contato. Ele trará uma interação com o usuário, podendo, por exemplo, falar frases do tipo: “Fulano, faz X meses que você não vai ao médico. Como você tem mais de 40 anos, os riscos são altos”. Uma mamãe virtual – que está sempre ao seu lado e que não se magoa se você esquecer seu aniversário, mas nunca se esquece de avisar para você levar o guarda-chuva ou o casaco quando for sair de casa.

3.Óculos substituindo aparelhos: segundo o próprio Medina, esta “é uma grande viagem ainda, mas já há muitas coisas sendo testadas”. Segundo o especialista, a forma como interagimos como aparelhos é muito ruim, pelo fato de não ser nem ergonômica e nem humana. Ele prevê que iremos para comandos de voz, apenas, passando por óculos com monitores já acoplados. Segundo eles, existem, atualmente, protótipos toscos da tecnologia, o que já permite pensar em uma produção comercial em um futuro não tão distante.

4.Chips de memória: após os óculos, o próximo passo seria a evolução da neurociência. Segundo ele, chips neurais poderão ser uma realidade em 2030, daqui a 19 anos. “Nosso pensamento vai muito rápido, e a gente é submetido à velocidade do dedo. Com chips neurais será tudo instantâneo”, disse, Além disso, os processadores melhorariam, também, nossa memória RAM. “Conseguimos gravar um número de telefone com sete dígitos, mas não gravamos 13. Com mais memória randômica, podemos aumentar esta e outras funções cognitivas de uma forma impressionante”, prevê.

5.Capacidade extraordinária de processamento. Entre 2020 e 2030, a capacidade de processamento de toda a humanidade poderá ser armazenada em apenas um computador. “Hoje não conseguimos colocar o equivalente a um homem em uma máquina”, disse. E toda essa capacidade estará em um computador que poderá ser comprado em uma loja convencional, até mesmo em um supermercado.

6.O fim do Paradigma de Turing: entre 2025 e 2030, será construída uma máquina que quebre o Paradigma de Turing, ou seja, um software conseguirá conversar com uma pessoa como se fosse um ser humano. Será impossível notar a diferença. “Temos subsídios para treinar redes artificiais. Há um bando de dados abertos, como Twitter e Facebook, que podem servir de subsídio.”

Mais distantes, mas não impossíveis de serem alcançados:

7.Softwares com emoções: a capacidade de sentir tristeza, remorso, amor, entre outras emoções está em outro patamar, na visão de Medina. Antes disso será preciso desvendar muito mais o cérebro humano. Mas, claro, não é algo impossível.

8.Nossa cabeça na nuvem: quando chegarmos nesse estágio de completo desvendamento do ser humano, especialistas da neurociência poderão transportar toda a nossa consciência para um data center de nuvem. A interação será total e nosso corpo será espécie de uma ferramenta de um ambiente muito mais complexo e abstrato. “Quero viver até lá”, suspira Medina.
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*Editora do IT Web, Adriele Marchesini gosta bastante de uma tecnologia e abre espaço, neste blog, para ter mais contato com os leitores e dar pitaco onde não deve. Até outro dia jornalista apaixonada por finanças, faz pós em análise econômica na Fipe (aquela da tabela de preços de carro), é formada pela Metodista, tem cinco sobrinhos, um blog abandonado e, quando chove muito forte, não consegue sair do ABC para chegar em São Paulo, onde fica a redação do IT Web. Neste espaço, falará sobre de tudo um pouco sobre TI quando der na telha. Se não gostar, reclame. Ela adora uma discussão!
Fonte:http://itweb.com.br/26/10/2011

Os mortos na rede

Fernanda Dias

Tributos na internet para pessoas que morreram se tornaram comuns
 (Reprodução/Internet)

Familiares e amigos criam sites para manter
 viva a memória de
quem já se foi.
Há alguns anos, os santinhos distribuídos nas missas de sétimo dia eram a última lembrança a ser guardada de um amigo ou ente querido que se foi. Agora, tributos criados na internet em homenagem a pessoas que morreram já se tornaram comuns e parecem dar sobrevida a quem já não está mais entre nós: são comunidades ou perfis nas redes sociais, blogs e até sites que incluem apresentações de slides, vídeos, músicas, narrativas e um cronograma da vida do homenageado.
Alguns portais no exterior já oferecem serviços profissionais para tornar mais fácil para os enlutados criarem a presença online de um parente falecido. E a interação não para por aí: uma empresa americana começou a vender um serviço que permite que qualquer pessoa em vida possa construir o seu próprio memorial virtual. O I-Memorial.com (https://www.i-memorial.com/) promete oferecer uma página ao cliente que se divide em três espaços: “Meu Memorial” (onde as pessoas podem deixar mensagens), “Minhas Mensagens” (no qual o usuário pode deixar gravações para amigos e familiares, que só terão acesso ao conteúdo se forem selecionados pelo cliente e souberem responder a questões de segurança) e “Meus Últimos Desejos” (onde o usuário dá instruções sobre como quer que seja realizado seu funeral, além de poder colocar dados sobre seguros, investimentos, senhas, etc). Depois da morte, um administrador determinado pode assumir o controle do site, pagando uma taxa anual. Ele será uma espécie de curador do falecido, aprovando novos depoimentos.
Por causa do risco de vazamento de dados, um código de comportamento ético – que abrange administração, direitos e responsabilidades – foi acordado por representantes de sites de memorial respeitáveis na internet. Até mesmo as redes sociais estão se adequando ao assunto. Em 2009, o Facebook decidiu não apagar os perfis de usuários que morreram. Mas, para proteger a privacidade do falecido, só os amigos podem ver o perfil ou localizá-lo em uma busca. O site também remove qualquer informação de contato e impede que as pessoas façam login na conta.
"Depende de cada caso.
O luto é considerado normal
quando se estende por um período
de cerca de dois anos."
- Vera Lucia Soares Chvatal - psiquiatra -

Para manter viva a união da família após a morte da avó, o empresário André Rodrigues, de 40 anos, criou uma comunidade e um perfil no Orkut para ela. Segundo ele, a ideia foi manter um álbum de família coletivo, restrito a familiares, que vivem em cidades diferentes e poderiam usar o espaço para se comunicar e relembrar os momentos vividos com a matriarca: “No início, muitos adicionaram o perfil. Mas, poucos enviaram fotos. Pensei que daria mais resultado, mas as pessoas não assimilaram a ideia”.
Iniciativas como a de André podem ser uma boa maneira de lidar com o luto, mas não são bem vistas por todos. A estudante Amanda Lisboa, de 25 anos, não gostou quando a irmã mudou o perfil dela no Orkut e colocou uma foto com a avó, que havia acabado de morrer:
“Ao mudar a foto do perfil, minha irmã nos obrigava a ficar vendo o retrato com a minha avó a cada atualização. Para ela, podia ser uma maneira de superar o luto. Mas, para mim, não. Ficar vendo o rosto de minha avó toda hora e saber que eu não poderia mais falar com ela ou abraçá-la era algo que me incomodava”.
Segundo a doutora Vera Lucia Soares Chvatal, pesquisadora do Departamento de Psicologia Médica e Psiquiatria da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, a atitude de criar ou manter um perfil na internet de alguém que morreu tanto pode ajudar a pessoa a elaborar um luto normal quanto pode prolongar o sofrimento indefinidamente:
“Depende de cada caso. O luto é considerado normal quando se estende por um período de cerca de dois anos. Após esse tempo, obviamente aproximado, se a pessoa não conseguiu se desligar do ente perdido e dar prosseguimento a sua vida normal, passa a ser considerado luto patológico. Nesse caso, ela vai precisar de ajuda especializada”.
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Fonte: http://opiniaoenoticia.com.br/31/10/2011
Imagem da Internet

O novo campo de batalha para o movimento ‘Morte com Dignidade’

New York Times
Três estados nos EUA já autorizam o suicídio assistido
(Reprodução/Internet)

Massachussets pode se tornar
o quarto estado nos EUA a permitir
o suicídio assistido de pacientes
com doenças terminais

Desde meados de setembro, um pequeno grupo de voluntários de Massachussets já reuniu cerca de 70 mil assinaturas com o objetivo de transformar o estado no quarto nos EUA onde doentes terminais podem requerer legalmente a assistência de médicos para pôr fim às suas vidas. Os organizadores, que chamam sua campanha de “Dignidade 2012″, só precisam de 70 mil votantes na petição para levar a questão às urnas do estado em novembro de 2012, mas para garantir que eles tenham o suficiente para passar pelo escrutínio, têm como objetivo chegar a 100 mil apoiadores. As assinaturas precisam ser entregues até o final de novembro.
O estatuto proposto, baseado em uma iniciativa aprovada pelos votantes do estado de Washington em 2008, permitiria a pacientes, cuja expectativa de vida é de menos de seis meses, a auto-administração de medicação letal.
A petição inclui uma longa lista de precauções e proteções: ampla orientação médica; dois médicos precisam verificar se o paciente é mentalmente apto e está agindo voluntariamente; e há um período de espera de 15 dias entre a primeira e a segunda solicitação, e mais 48 horas antes que a prescrição seja completa. Pelo menos uma das duas testemunhas à solicitação em escrito não pode ser um parente ou um herdeiro. E claro, o paciente sempre pode mudar de ideia.

"A Igreja Católica e suas armas políticas
 foram responsáveis pela parte
mais significativa das contribuições
à campanha de oposição."

Caso obtenha sucesso, a iniciativa apresentaria o Ato Massachussetts Morte Com Dignidade perante a Assembleia Legislativa estadual. Mas nenhuma assembleia jamais aprovou uma lei desse tipo. É seguro apostar que os legisladores de Massachussetts vão tentar contornar o assunto, o que levará a um referendo em novembro de 2012 e a um grande choque emocional em um estado fortemente católico.
A Conferência Católica de Massachussetts já denunciou a iniciativa em um relatório que afirma que “os bispos católico-romanos de Massachusetts permanecem firmes na crença de que uma sociedade compassiva deve trabalhar para prevenir o suicídio, que é sempre uma terrível tragédia, não interessa em que forma ele se dê.”
Nos estados onde o suicídio assistido recebeu a aprovação dos eleitores (Oregon em 1994 e de novo em 1997, e Washington em 2008) ou que falharam em consegui-la (Michigan em 1998, Maine em 2000), defensores de pessoas com deficiências, organizações antiaborto, grupos religiosos e outros se posicionaram firmemente contra a iniciativa. Mas a Igreja Católica e suas armas políticas foram responsáveis pela parte mais significativa das contribuições à campanha de oposição.
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Fontes: New York Times - The next death-with-dignity battleground
http://opiniaoenoticia.com.br 31/10/2011

Disneylândia de Jesus

LUIZ FELIPE PONDÉ

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Logo teremos em Jerusalém Judas-Patetas,
Tio Pôncio-Patinhas e, para completar,
Mickey-Jesus-Mouse
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O mundo acabou. Não viaje. Assista a filmes em casa ou vá para cidades sem graça do interior. O mundo foi tomado por um tipo de praga que não tem solução: os gafanhotos do sucesso da indústria do turismo.
O horror começa nos aeroportos, que, graças ao terrorismo fundamentalista islâmico, ficaram ainda piores com seus sistemas de segurança infernais. Esse mesmo terrorismo fundamentalista que faz as "cheerleaders" dos movimentos sociais sentirem "frisson" de prazer na espinha.
Uma grande figura do mercado de análise de comportamento me disse recentemente que, em poucos anos, só os pobres (de espírito?) viajarão.
Tenho mais certeza disso do que da aritmética de 2 + 2 = 4. Aeroportos serão o último lugar onde você vai querer ser visto. Gostar de viajar hoje pode ser um forte indício de que você não tem muita imaginação ou opção na vida.
Veja, por exemplo, o que aconteceu com os lugares sagrados de Jerusalém. Aquilo virou uma Disneylândia de Jesus. Imagino que, dentro de alguns anos, teremos atores fracassados do Terceiro Mundo vestidos de Judas-Patetas, Maria-Branca de Neve, Tio Pôncio-Patinhas, Pedro-Duck e, é claro, Mickey-Jesus-Mouse.
Locais religiosos sempre atraíram todo tipo de histeria. A proximidade com ela pode fazer você duvidar da existência de Deus.
Ateus são fichinha em comparação à histeria religiosa como argumento contra a viabilidade de um Deus bom e generoso. Nesse caso, a náusea faz de você um ateu.
Às vezes, tristemente, a diferença entre visitas belas a locais sagrados parece ser apenas o número maior ou menor de nossos semelhantes crentes em Deus.
Ou, dito de outra forma, o inferno é um lugar onde tem muita gente em surto místico.
Jesus deve ter uma paciência de Jó, com seus fiéis cheios de máquinas digitais e filmadoras chinesas querendo devassar a intimidade de sua mãe e de seus discípulos mortos já há tantos séculos.
Aliás, estou seguro de que, em breve, Jesus será "made in China", "at last". Se assim acontecer, terão razão aqueles que afirmavam ter sido ele um Messias "fake"?
Pessoalmente, torço para que Jesus sobreviva a essa "nova paixão", por obra da qual ressuscitar deverá ser algo como um show de efeitos especiais feitos por computação gráfica barata. Os fiéis pós-modernos deram um novo significado à expressão nietzschiana "Deus está morto". Nesse caso, Deus virou batata chips de free shop.
No início dos anos 90, ainda era possível ir à catedral de Córdoba, na Espanha, e experimentar sua beleza moura. Já em meados dos anos 2000, ela era um terreno baldio para as invasões de gafanhotos.
Hoje, estive (escrevo dias antes de você ler esta coluna) na igreja da Agonia, em Jerusalém, conhecida também como igreja de Gethsêmani, local onde Jesus teria suado sangue antes de ser preso. Um belíssimo local.
Em seguida, alguns passos descendo a ladeira do monte das Oliveiras (onde fica Gethsêmani), fui a outro local, maravilhoso, que não vou dizer qual é porque espero que ninguém fique sabendo; assim, quem sabe, esse lugar ainda durará algum tempo antes de virar mais um Hopi Hari de Jesus com seu ruído de famílias de classe média em excursões místicas.
É importante dizer que já fui a esses locais inúmeras vezes e que, portanto, tive o desprazer de ver Jerusalém virar uma cidade devastada pela horda de tarados com máquinas digitais e filmadoras chinesas. Além de suas camisetas com slogans pela paz mundial.
Depois da destruição de Jerusalém pelos romanos por volta do ano 70 d.C., vemos agora a infestação da cidade santa pelos histéricos pentecostais e seus berros em nome do Espírito Santo.
Além, é claro, dos judeus ortodoxos obsessivos mal-educados e dos muçulmanos fanáticos com seu grito bárbaro "Allah Akbar" (Deus é grande). A população secular de Jerusalém é cada vez mais oprimida pelos homens de preto da ortodoxia judaica.
Alguns desses são mesmo contra o Estado de Israel, porque só o Messias pode reconstruir o "verdadeiro Estado judeu". Acho que deveriam ser todos despachados para o Irã. Enfim, um filme de horror estrelado por fanáticos, batatas e patetas.
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* Filósofo. Prof. Universitário. Escritor. Colunista da Folhaponde.folha@uol.com.br
Imagem da Internet

Steve Jobs e o declínio americano

RUBENS RICUPERO*
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A ameaça à superioridade dos americanos
 vem de um modelo que não dá poder
a criadores como Jobs

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Pode impressionar como sinal de mau agouro o desaparecimento de Steve Jobs justamente no momento em que mais se discute o suposto ou real declínio dos EUA. Se examinarmos, um por um, os fatores responsáveis pelo longo predomínio dos americanos, a capacidade de invenção e inovação -da qual Jobs foi a encarnação viva- aparece não só como o mais indiscutível, mas também o mais difícil de emular e superar.
Li uma vez o artigo de um economista chinês que relativizava o êxito da China como "fábrica do mundo" e imbatível exportadora de manufaturas. O artigo lembrava que nenhum dos três produtos que haviam revolucionado o mercado nos anos recentes -o iPhone, o iPod e o iPad- tinha sido inventado pelos chineses, embora a fabricação se fizesse na China devido ao custo.
Essas três novidades se devem à inventividade de Jobs, mas é óbvio que sua morte não esgota a capacidade de inventar e renovar que os EUA não cansam de demonstrar há mais de século e meio. O que me chama a atenção nos americanos não é tanto o talento para as invenções mecânicas, a aplicação de avanços da ciência a máquinas e aparelhos que simplificam a vida cotidiana. Desse tipo de inventor, o símbolo maior foi, sem dúvida, Edison.
Há, porém, outro tipo de invenções, as intangíveis, como foram, no passado medieval ou no começo da modernidade, a criação pelos italianos da letra de câmbio, do contrato de seguro marítimo, da contabilidade de partida dupla, dos bancos e mais tarde, pelos holandeses, da sociedade por ações.
Nessa área, os americanos inovaram em quase tudo, a começar pelo comércio, que quase não havia mudado desde os tempos de fenícios e gregos. Começaram com as vendas por catálogo e reembolso postal, passaram para o supermercado, em seguida para o shopping center, o drive-in, as franquias, o fast food, só para ficar nesses exemplos.
Muito mais transformadoras e imateriais foram as invenções do cartão de crédito e do comércio e do caixa eletrônicos. O que essas invenções trouxeram foi não só a modificação por meios mecânicos de atividades tradicionais como lavar e cozinhar. Aliadas às inovações no domínio da recreação e do relacionamento -a TV, as redes sociais na internet-, elas na verdade recriaram a própria vida, a maneira como as pessoas empregam a maior parte do tempo e se relacionam.
Inovadores não convencionais, sem diploma, de gostos alternativos como Jobs são o produto de uma sociedade inquieta que continuamente se questiona e reinventa a si mesma. Sociedades hierarquizadas e autoritárias como a chinesa não possuem esse dom para inovar.
Enquanto predominava a destruição criadora ("creative destruction"), isto é, a inovação que destruía coisas antigas para dar lugar a novas e melhores, a superioridade americana não corria perigo. Se ela agora está em jogo, é por causa da criação destruidora ("destructive creation"), a financeira, aniquiladora de riqueza e geradora de injustiça.
A ameaça à superioridade americana não vem dos chineses, mas de dentro, de um modelo que dá mais poder e influência a lobistas corruptos e banqueiros destrutivos que a criadores como Jobs.
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* Economista. Jurista. Colunista da Folha.
Fonte: Folha on line, 31/10/2011
Imagem da Internet

domingo, 30 de outubro de 2011

Para onde rumam as crenças religiosas?

Por Pe. John Flynn, L.C.

 
Jovens avaliam a moral entre o certo e o bobo
Dois livros recentes oferecem uma interessante perspectiva sobre a situação da religião nos Estados Unidos e o que podemos esperar de quem está chegando à idade adulta.
O primeiro, FutureCast: What Today's Trends Mean for Tomorrow World (Barna Books), foi escrito por George Barna, um prolífico escritor que fundou o Barna Research Group. Baseado em pesquisas de opinião, o livro analisa onde está a sociedade atual numa série de temas sociais.
Três dos capítulos tratam da prática religiosa. A pertença religiosa se manteve estável, com 84% das pessoas se considerando cristãs em 1991 e 85% em 2010. Barna observa, porém, que muitos se consideram cristãos mas não praticam a religião.
Por exemplo, só 45% crêem “firmemente” que a bíblia acerta em todos os princípios que ensina. Esta cifra cai para 30% entre os nascidos de 1984 em diante. Só 34% dos adultos acreditam que existe uma verdade moral absoluta.
Barna indica que entre os adultos pertencentes a uma igreja cristã só a metade afirma estar comprometida de modo profundo com a fé cristã.
Espiritual

Uma das últimas mudanças na identidade religiosa é o aumento dos que se consideram “espirituais mas não religiosos”. Cerca de um quarto dos adultos se qualificam assim; entre os menores de 30 anos, esta é a norma.
Também há um aumento de formas alternativas de igreja. As igrejas-lar, de grupos de pessoas que se reúnem numa casa, começam a ficar populares nos Estados Unidos. Outras formas alternativas incluem o que Barna denomina cyberigrejas, com reuniões via internet.
Tornou-se também comum que os norte-americanos mudem de igreja. Barna descobriu que não são os fatores doutrinais os que mais motivam a trocar de igreja, e sim razões muito mais subjetivas, ligadas a personalidades, conveniência, potencial de relações e experiências.

Adultos emergentes

O segundo livro se concentra num grupo mais reduzido de pessoas. Christian Smith, professor de sociologia na Universidade de Nôtre Dame, fez uma série de entrevistas com uma ampla gama de pessoas de 18 a 23 anos, grupo que os sociólogos chamam de “adultos emergentes”. Os achados estão no livro Lost in Transition: The Dark Side of Emerging Adulthood (Oxford University Press).

O livro enumera fatores cruciais da formação desses jovens:

- O espetacular crescimento da educação superior, que significa que muitos estendem sua educação até depois dos 20 anos de idade.
- O adiamento do casamento, que trouxe uma liberdade sem precedentes durante a década posterior ao fim dos estudos.
- Mudanças econômicas que tornam mais difícil para os jovens encontrar um trabalho estável e bem remunerado.
- A vontade dos pais de apoiar economicamente os filhos até bem depois dos 20 anos.
- A disponibilidade do controle de natalidade, que desligou as relações sexuais da procriação.
- A difusão de teorias pós-estruturalistas e pós-modernistas que promovem o subjetivismo individualista e o relativismo moral.

O livro começa com o longo capítulo “À deriva moral”. Os jovens têm uma visão muito individualista da moral, que os leva a dizer que não devemos julgar ninguém moralmente, porque todos têm direito a opiniões pessoais. Uma estudante universitária explicou, por exemplo, que não colava nas provas, mas se abstinha de julgar os companheiros que colavam.

Bobo

Segundo esta postura, “algumas coisas estão certas e outras são bobas, mas não está provado que algo seja objetiva e moralmente bom ou mau”.
O relativismo moral caracteriza muitos dos entrevistados, grande parte dos quais expressaram ideias racionalmente inconsistentes.
A ideia de que a moral é uma construção da sociedade e da cultura pode chegar tão longe num debate que um jovem não exprimiu juízo negativo algum sobre a escravidão. Outro defendeu a retidão moral dos terroristas que causam a morte de multidões.
“Eles [os terroristas] são assim, fazem o que acham que é o melhor, e por isso fazem o bem”. Esta foi uma parte da explicação dada por esse jovem.
Um terço dos entrevistados manifesta um relativismo muito forte, e os outros dois terços, embora menos intensamente, também se mostram relativistas.
Todos os adultos emergentes acreditam, de alguma forma, em algo chamado “moral”. Os sociólogos descobriram que, ao serem perguntados sobre as fontes da moral, a maior parte de suas respostas não resistia a um exame crítico básico.
34% declarou que não sabia o que tornava algo moralmente correto ou incorreto, e alguns sequer entenderam as perguntas sobre o assunto.
As respostas dos demais foram bastante diversas. Alguns acham que a moral se baseia no que outras pessoas pensam de alguém. 40% citou este critério.
Outros descreveram a base da moral em função de melhorar ou não a situação das pessoas.
Em sua conclusão do capítulo sobre a moral, os autores apontaram que os adultos emergentes têm muito pouca bagagem para encarar os desafios do presente e do futuro, e formam uma geração que fracassou na formação moral.
Mesmo evitando generalizar as pesquisas de opinião feitas com grupos pequenos, as evidências em ambos os livros indicam a dimensão dos desafios das igrejas e de todas as pessoas preocupadas com a moral.
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Fonte: ROMA, domingo, 30 de outubro de 2011 (ZENIT.org)
Imagens da Internet

A depravação da América

John Kozy*


A cultura dos Estados Unidos foi inundada por um tsunami de mentiras. O marketing se tornou a atividade predominante da cultura. É uma coisa seguida por pessoas de negócios, políticos e pela mídia. O dinheiro é tudo o que importa. Foi-se o tempo em que a ética protestante definia o caráter dos EUA. Ela foi usada pelos sociólogos como fator responsável pelo sucesso do capitalismo na Europa do Norte e nos EUA, mas a ética protestante e o capitalismo se tornaram incompatíveis. A "América" está se tornando uma região de depravação raramente superada pelas piores nações da história.

Foi-se o tempo em que a ética protestante definia o caráter dos Estados Unidos. Ela foi usada como fator responsável pelo sucesso do capitalismo na Europa do Norte e na América, pelos sociólogos, mas a ética protestante e o capitalismo são incompatíveis, e o capitalismo, em última análise, faz com que a ética protestante seja abandonada.
Há um novo ethos que emergiu, e as elites governamentais não o entendem. Trata-se do etos da “grande oportunidade”, do “prêmio”, da “próxima grande ideia”. A marcha lenta e deliberada em direção ao sucesso é hoje uma condenação do destino. Junto à próxima grande ideia comercial está o novo modelo do "sonho americano". Tudo o que importa é o dinheiro. Dada essa atitude, poucos na América expressam preocupações morais. A riqueza é só o que se tem em vista; vale inclusive nos destruir para alcançá-la. E se não chegamos lá ainda, certamente em breve chegaremos.
Eu suspeito que a maior parte das pessoas gostaria de acreditar que sociedades, não importa as bases de suas origens, tornam-se melhores com o tempo. Infelizmente a história desmente essa noção; frequentemente as sociedades se tornam piores com o tempo. Os Estados Unidos da América não é exceção. O país não foi benigno em sua origem e agora declina, tornando-se uma região de depravação raramente superada pelas piores nações da história.
Embora seja impossível encontrar números que provem que a moralidade na América declinou, evidências cotidianas estão onde quer que se veja. Quase todo mundo pode citar situações nas quais o bem estar das pessoas foi sacrificado pelo bem das instituições públicas ou privadas, mas parece impossível citar um só exemplo de instituição pública ou privada que tenha sido sacrificada em nome do povo.
Se a moralidade tem a ver com o modo como as pessoas são tratadas, pode-se perguntar legitimamente onde a moralidade desempenha um papel no que está se passando nos EUA? A resposta parece ser: “Em lugar nenhum!” Então, o que tem aconteceu nos EUA para se ter a atual epidemia de afirmações de que a moralidade na América colapsou?
Bem, a cultura mudou drasticamente nos últimos cinquenta anos. Foi isso o que aconteceu. Houve um tempo em que a "América", o "caráter americano", era definido em termos do que se chamava de Ética Protestante. O sociólogo Max Weber atribuiu o sucesso do capitalismo a isso. Infelizmente, Max foi negligente; ele estava errado, completamente errado. O capitalismo e a ética protestante são inconsistentes entre si. Nenhum dos dois pode ser responsável pelo outro.
A ética protestante (ou puritana) está baseada na noção de que o trabalho duro e a ascese são duas consequências importantes para ser eleito pela graça da cristandade. Se uma pessoa trabalha duro e é frugal, ele ou ela é considerado como digno de ser salvo. Esses atributos benéficos, acreditava-se, fizeram dos estadunidenses o povo mais trabalhador do que os de quaisquer outras sociedades (mesmo que as sociedades protestantes europeias fossem consideradas parecidas e as católicas do sul da Europa fossem consideradas preguiçosas).
Alguns de nós afirmam agora que estamos testemunhando o declínio e a queda da ética protestante nas sociedades ocidentais. Como a ética protestante tem uma raiz religiosa, o declínio é frequentemente atribuído a um crescimento do secularismo. Mas isto seria mais facilmente verificável na Europa do que na América, onde o fundamentalismo protestante ainda tem muitos seguidores. Então deve haver alguma outra explicação para o declínio. Mesmo que o crescimento do secularismo tenha levado muita gente a dizer que ele destruiu os valores religiosos juntamente aos valores morais que a religião ensina, há uma outra explicação.
No século XVII, a economia colonial da América era agrária. Trabalho duro e ascese combinam perfeitamente com essa economia. Mas a América não é mais agrária. A economia dos EUA hoje é definida como capitalismo industrial. Economias agrárias raramente produzem mais do que é consumido, mas economias industriais o fazem diariamente. Assim, para se manter a economia industrial funcionando, o consumo deve não apenas ser contínuo, como continuamente crescente.
Eu duvido que haja um leitor que não tenha escutado que 70% da economia dos EUA resulta do consumo. Mas 70% de um é 0,7, ou de dois é 1,4, de três, 2,1, etc. À medida que economia cresce de um a dois pontos do PIB, o consumo deve crescer de 0,7 para 1,4 pontos. Mas o aumento crescente do consumo não é compatível com a ascese. Uma economia industrial requer gente para gastar e gastar, enquanto a ascese requer gente para economizar e economizar. A economia americana destruiu a ética protestante e as perspectivas religiosas nas quais foi fundada. O consumo conspícuo substituiu o trabalho duro e a poupança.
No seu A Riqueza das Nações, Adam Smith afirma que o capitalismo beneficia a todos, desde que cada um aja em benefício dos outros. Agora estão nos dizendo que “economizar mais e cortar gastos pode ser um bom plano para lidar com a recessão. Mas se todo mundo proceder assim isso só vai tornar as coisas piores....aquilo de que a economia mais precisa é de consumidores gastando livremente”. A grande recessão atingiu Adam Smith na sua cabeça, mas o economista admitiria isso. “Um ambiente em que todos e cada um quer economizar não pode levar ao crescimento. A produção necessita ser vendida e para isso você precisa de consumidores”.
Poupar é (presumivelmente) bom para indivíduos, mas ruim para a economia, a qual requer gasto contínuo crescente. Se um economista tivesse dito isso na minha frente, eu teria lhe dito que isso significa claramente que há algo fundamentalmente errado com a natureza da economia, que isso significa que a economia não existe para prover as necessidades das pessoas, mas que as pessoas existem apenas para satisfazer as necessidades da economia. Embora não pareça isso, uma economia assim escraviza o povo a quem diz servir. Então, de fato, o capitalismo industrial perpetrou a escravidão; ele tem reescravizado aqueles que um dia emancipou.
Quando o consumo substituiu a poupança na psique americana, o resto de moralidade afundou junto na depravação. A necessidade de vender requer marketing, o que nada mais é que a mentira das mentiras. Afinal de contas, toda empresa é fundada no que disse o livro de Edward L. Bernays, de 1928: Propaganda. A cultura americana tem sido inundada por um tsunami de mentiras. O marketing se tornou a atividade predominante da cultura. Ninguém pode se isolar disso. É uma coisa seguida por pessoas de negócios, políticos e pela mídia. Ninguém pode ter certeza de estarem lhe contando a verdade a respeito de alguém. Nenhum código moral pode sobreviver numa cultura de desonestidade, e de resto, ninguém pode!
Tendo subvertido a ética protestante, a economia destruiu toda ética que a América um dia promoveu. O país tornou-se uma sociedade sem um etos, uma sociedade sem propósito humano. Os americanos se tornaram cordeiros sacrificáveis para o bem das máquinas. Então, um novo etos emergiu do caos, um etos que a elite governamental desconhece completamente.
Diz-se frequentemente que Washington perdeu o contato com as pessoas que governa, que não entende mais seu próprio povo ou como sua cultura comum funciona. Washington e a elite do país não entendem isso, mas a cultura não valoriza mais o certo sobre o errado ou o trabalho duro e a ascese sobre a preguiça e a extravagância. Hoje os americanos estão buscando a “grande oportunidade”, o “prêmio”, a “próxima grande ideia”. O Sonho Americano foi hoje reduzido ao “acertar em cheio!”. A longa e deliberada estrada para o sucesso é uma condenação. Vejam American Idol, The X-Factor e America’s Got Talent e testemunhe a horda que se apresenta para os auditórios. Essas pessoas, em sua maior parte, não trabalharam duro em nada na vida. Contem o número de pessoas que regularmente apostam na loteria. Esse tipo de aposta não requer trabalho algum. Tudo o que essas pessoas querem é acertar em cheio. E quem é nosso homem de negócios mais exaltado? O empreendedor!
Empreendedores são, na sua maior parte, fogo de palha, mesmo que haja exceções notáveis. O problema com o empreendedorismo, no entanto, é a alta conta em que passou a ser tomado. Mas o único valor ligado a ele é a quantidade de dinheiro que os empreendedores têm feito. Raramente ouvimos alguma coisa a respeito do modo nefasto como esse dinheiro foi feito. Bill Gates e Mark Zuckerberg, por exemplo, dificilmente representam imagens de pessoas com moralidade exemplar, mas na economia sem escrúpulos morais, ninguém se importa; tudo o que importa é o dinheiro.
Dada essa atitude, por que alguém, nessa sociedade, expressaria preocupações morais? Poucos na América o fazem. Assim, enquanto a elite americana fala na necessidade de produzir força de trabalho sustentável para as necessidades de sua indústria, as pessoas não querem nada disso.
A elite frequentemente lastima a falência do sistema educacional americano e tem tentado melhorá-lo sem sucesso, por várias décadas. Mas se alguém presta atenção no atual estado de coisas na América, vê que a maior parte dos empreendedores de sucesso são pessoas que abandonaram faculdades. Como se pode convencer a juventude de que a educação universitária é um empreendimento que vale a pena? Assim como Bill Gates, Steve Jobs e Mark Zuckerberg mostraram, aprender a desenhar um software não requer graduação universitária. Nem ganhar na loteria ou vencer o American Idol. Fazer parte da Liga Nacional de Futebol pode requerer algum tempo na universidade, mas não a graduação. Todo o empreendedorismo requer uma nova ideia mercantil.
Entretenimento e esportes, loterias e programas de jogos e disputas, produtos de consumo de que as pessoas não tiveram necessidade por milhões de anos são agora as coisas que formam a cultura americana. Mas não são coisas, são lixo; não podem formar a base de uma sociedade humana estável e próspera. Esta é uma cultura governada meramente por um atributo: a riqueza, bem ou mal havida!
A capacidade humana de autoengano é sem limites. Os estadunidenses vêm se enganando com a crença de que a riqueza agregada, a soma total de riquezas, em vez de como ela é distribuída, dá certo. Não importa como foi obtida ou o que foi feito para se obter tal riqueza. A riqueza agregada é a única coisa que se tem em vista; é algo pelo que vale à pena destruir a nós mesmos. E mesmo que não o tenhamos alcançado ainda, em breve certamente o conseguiremos.
A história descreve muitas nações que se tornaram depravadas. Nenhuma delas jamais se reformou. Nenhum garoto bonito pode ser convocado para desfazer a catástrofe do Toque de Midas. O dinheiro, afinal de contas, não é uma coisa de que os humanos precisem para sobreviver, e se o dinheiro não é usado para produzir e distribuir as coisas necessárias, a sobrevivência humana é impossível, não importa o quanto de riqueza seja agregada ou acumulada.
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(*) John Kozy é professor aposentado de filosofia e lógica que escreve sobre assuntos econômicos, sociais e políticos. Depois de ter servido na Guerra da Coréia, passou 20 anos como professor universitário e outros 20 trabalhando como escritor. Publicou um livro de lógica formal, artigo acadêmicos. Sua página pessoal é http://www.jkozy.com onde pode ser contatado.
Tradução: Katarina Peixoto
Fonte: http://www.cartamaior.com.br/29/10/2011 e IHU on line, 30/10/2011

Quando Ratzinger encontrou Gandhi


Seu avô, o Mahatma, transformou
a "não violência" na arma mais
poderosa da história. Na cidadela franciscana,
o intelectual hindu Rajmohan Gandhi (foto)
assinou o pacto pela paz proposto por Bento XVI
a todos os homens de boa vontade. No almoço,
o pontífice quis que ele estivesse na sua mesa.

Ao lado de carismáticos líderes religiosos, ministros de culto e presidentes de associações confessionais mundiais, no refeitório do convento de Santa Maria dos Anjos, destacava-se a sua timidez de professor. Uma presença de "baixo perfil", mas de grande significado evocativo que trazia a marca da "Grande Alma" à festa das religiões.
O neto e biógrafo de Gandhi chegou a Assis desde o Estado norte-americano de Illinois, onde leciona na universidade. O "pai da pátria" indiano teria gostado do "espírito de Assis", assegura Rajmohan Gandhi, tendo já estado presente, há 25 anos, no histórico primeiro encontro inter-religioso convocado em 1986 por João Paulo II na capital mundial da paz.
De mãos dadas com a sua esposa, Usha, ele percorreu novamente os lugares da sua primeira peregrinação à fortaleza do pacifismo. Seu avô, Gandhi, não tinha uma visão sincrética das religiões. Ao contrário, ele convidava hindus, muçulmanos e cristãos a penetrar e praticar a sua fé antes de pensar em abraçar outra.
Educar à abertura para as grandes verdades comuns a todas as religiões, começando pela ajuda a redescobri-las na sua própria tradição. A missão de Gandhi não foi a de politizar a religião, mas sim a de espiritualizar a política. Por isso, ele queria ligar à moral as ações cotidianas realizadas na esfera pública. O retorno a Assis do neto de Gandhi conecta idealmente a perspectiva inter-religiosa do Mahatma à do encontro convocado por Bento XVI.
De acordo com o profeta da "não violência", os melhores homens sempre aceitaram os melhores ensinamentos, em qualquer época e em qualquer lugar que se encontrem: na religião, na moral, na cultura ou nas vidas dos indivíduos. Buscar a verdade é uma natural aspiração humana, um resultado da inteligência e da mente humana. Consequentemente, todos os fundadores religiosos tinham uma motivação pura, e os seus ensinamentos são um grande recurso para a felicidade do homem.
Gandhi, por isso, não considerava que todas as religiões devessem ser unificadas, nem que todos os seres humanos devessem estudar e praticar todas as religiões. No entanto, "as pessoas não deveriam considerar as religiões como contrapostas uma às outras, ou intocáveis, mas sim como recursos de felicidade".
Todas as vezes em que o nome de uma religião se torna sinônimo de destruição, isso não acontece por causa da religião ou do seu fundador, mas por causa das pessoas que entendem equivocadamente o significado e o uso da religião. Assim falava Gandhi. Assim fala Joseph Ratzinger hoje.
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A reportagem é de Giacomo Galeazzi, publicada no sítio Vatican Insider, 27-10-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto
Fonte: IHU on line, 30/10/2011

Um novo humanismo em dez princípios

Julia Kristeva*

Do humanismo cristão, entendido como um "ultrapassamento"
do humano, como o acoplamento dos desejos e do sentido
através da linguagem, o humanismo secularizado é o herdeiro
muitas vezes inconsciente. Ele se separa dele afinando
as suas próprias lógicas, das quais eu gostaria de delinear
dez princípios, não mandamentos, mas sim dez convites
para pensar pontes entre nós.

O que é o humanismo? Um grande ponto de interrogação a ser abordado com a máxima seriedade? É na tradição europeia, grego-judaico-cristã, que se produziu esse evento que não cessa de prometer, de desiludir e de se refundar. Quando Jesus se descreve (João 8, 24), nos mesmos termos de Elohim que se dirige a Moisés (Êxodo 3, 14), dizendo: "Eu sou", ele define o homem – antecipando, assim, o humanismo – como uma "singularidade indestrutível" (segundo a expressão de Bento XVI).
Singularidade indestrutível que não só o reconecta ao divino por meio da genealogia de Abraão (como já fazia o povo de Israel), mas que inova. Já que o "Eu sou" de Jesus se estende do passado e do presente para o futuro e ao Universo, a Sarça Ardente e a Cruz se tornam universal.
Quando o Renascimento, com Erasmo, depois o Iluminismo, com Diderot, com Voltaire, com Rousseau, mas também com o Marquês de Sade, e assim por diante até aquele judeu ateu que foi Sigmund Freud, proclamam a liberdade dos homens e das mulheres de se rebelarem contra os dogmas e as opressões, a liberdade de emancipar os espíritos e os corpos, de colocar em discussão toda certeza, mandamento ou valor – eles abrem, talvez, a porta para um niilismo apocalíptico?
Agarrando-se ao obscurantismo, a secularização esqueceu de se interrogar sobre a necessidade de crer que está subentendido ao desejo de saber, assim como sobre os limites a serem postos ao desejo de morte – para viver juntos. No entanto, não é o humanismo, são os desvios sectários, tecnicistas e negacionistas da secularização que se precipitam na "banalidade do mal" e que hoje favorecem a automatização em curso da espécie humana.
"Não tenhais medo!": essas palavras de João Paulo II não eram dirigidas somente aos crentes, que encorajavam a resistir ao totalitarismo. A invocação desse papa – apóstolo dos direitos humanos – nos incita a não temer a cultura europeia, mas, ao contrário, a ousar o humanismo: construindo cumplicidade entre humanismo cristão e aquele que, tendo surgido do Renascimento e do Iluminismo , ambiciona a arriscar as vias perigosas da liberdade.
É por isso que, nesta terra de Assis, os meus pensamentos se voltam para São Francisco: que não busca "tanto ser compreendido, mas compreender", "não tanto ser amado, mas amar", que suscita a espiritualidade das mulheres com a obra de Santa Clara; que coloca a criança no coração da cultura europeia criando a festa de Natal; e que, pouco antes de morrer, como verdadeiro humanista ante litteram, envia a sua carta "a todos os habitantes do mundo".
Penso também em Giotto, que desdobra os textos sagrados em um conjunto de imagens vivas da vida cotidiana dos homens e das mulheres do seu tempo, e desafia o mundo moderno a se sacudir do rito tóxico do espetáculo hoje onipresente.
E é Dante Alighieri que me interpela, neste instante, quando celebra São Francisco no Paraíso da sua Divina Comédia. Dante fundou uma teologia católica do humanismo demonstrando que o humanismo existe só e enquanto nós transcendemos a linguagem através da invenção de novas linguagens: como ele mesmo fez, escrevendo em um "Stil novo" a língua italiana corrente e inventando neologismos. "Ultrapassar o humano no humano" (transumanar, Paraíso I, 69): esse – diz Dante – será o caminho da verdade. Tratar-se-á de "amarrar" – no sentido de "unir", de ver como se amarram o círculo e a imagem dentro de uma rosácea (como uma se "coloca" na outra, como se posiciona, como se coloca naquele "onde", Paraíso XXXIII, 138) –, tratar-se-á de amarrar o divino com o humano em Cristo, de amarrar o físico e o psíquico no humano.
Desse humanismo cristão, entendido como um "ultrapassamento" do humano, como o acoplamento dos desejos e do sentido através da linguagem – contanto que se trate uma linguagem de amor –, o humanismo secularizado é o herdeiro muitas vezes inconsciente. Ele se separa dele afinando as suas próprias lógicas, das quais eu gostaria de delinear dez princípios. Que não são dez mandamentos, mas sim dez convites para pensar pontes entre nós.

1. O humanismo do século XXI não é teomorfismo. O Homem Masculino não existe. Não existem nem "valores" nem "fins" superiores, não há nenhum atracadouro do divino junto aos atos mais altos daqueles homens que, do Renascimento em diante, se chamaram "gênios". Depois do Holocausto e do Gulag, o humanismo tem o dever de lembrar os homens e as mulheres que, se nos consideramos como os únicos legisladores, é somente graças ao contínuo questionamento da nossa situação pessoal, histórica e social que podemos decidir a sociedade e a história.

2. Processo de contínua refundação, o humanismo se desenvolve necessariamente por meio de rupturas que são inovações (o termo bíblico hiddouch significa inauguração-inovação-renovação; enkainosis e anakainosis; novatio e renovatio). Conhecer intimamente a herança greco-judaico-cristã, colocá-la sob rigoroso exame, transvalorar (Nietzsche) a tradição: não há outro meio para combater a ignorância e a censura, e, assim, facilitar a coexistência das memórias culturais que se construíram ao longo da história.

3. Filho da cultura europeia, o humanismo é o encontro de diferenças culturais favorecidas pela globalização e pela informatização. O humanismo respeita, traduz e reavalia as variantes das necessidades de crer e dos desejos de saber que são patrimônio universal de todas as civilizações.

4. Humanistas, "nós não somos anjos, mas temos um corpo". Assim se expressava, no século XVI, Santa Teresa d'Ávila, inaugurando a idade barroca, que não é uma Contrarreforma, mas sim uma Revolução Barroca que inicia o século das Luzes. Porém, o desejo livre é um desejo de morte. E era preciso esperar a psicanálise para reunir na única e última regulamentação da linguagem essa liberdade dos desejos que o humanismo nem censura nem lisonjeia, mas que se propõe a pôr em evidência, a acompanhar e a sublimar.

5. O humanismo é um feminismo. A libertação dos desejos necessariamente devia conduzir à emancipação das mulheres. Depois dos filósofos do Iluminismo que abriram o caminho, as mulheres da Revolução Francesa pretenderam essa emancipação com Théroigne de Méricourt, com Olympe de Gouges, e assim por diante com Flora Tristan, com Louise Michel e com Simone de Beauvoir, acompanhadas pelas lutas das sufragistas inglesas. E quero lembrar aqui as mulheres chinesas da Revolução Burguesa de 4 de maio de 1919. As lutas por uma paridade econômica jurídica e política requerem uma nova reflexão sobre a escolha e a responsabilidade da maternidade. A secularização é a única civilização que ainda está isenta de um discurso sobre a maternidade. O vínculo passional entre a mãe e a criança, este primeiro outro, aurora do amor e da hominização – aquele vínculo no qual a continuidade biológica se torna sentido, alteridade e palavra é um confiar, um confiar-se. Diferente da religiosidade assim como da função paterna, a confiança materna completa ambas, participando assim, plenamente, da ética humanista.

6. Humanistas, é por meio da singularidade compartilhada da experiência interior que podemos combater aquela nova banalidade do mal que é a automatização da espécie humana a que estamos assistindo. A partir do momento que somos seres falantes e escritores, já que desenhamos, e pintamos, e tocamos, e jogamos, e calculamos, e imaginamos, e pensamos: justamente por isso não somos condenados a nos tornar "elementos de linguagem" na hiperconexão acelerada. O infinito das capacidades de representação é o nosso habitat, a nossa dimensão profunda e libertadora, a nossa liberdade.
"Devemos ter a coragem de apostar
na renovação contínua das capacidades
 dos homens e das mulheres de crer e de saber juntos."

7. Mas a Babel das línguas também gera caos e desordens que o humanismo jamais conseguirá regular com a simples escuta, embora atenta, prestada às línguas dos outros. Chegou o momento de retomar os códigos morais do passado: sem enfraquecê-los com a pretensão de problematizá-los, e renovando-os a despeito das novas singularidades. Longe de serem puros arcaísmos, as proibições e as limitações são obstáculos que não podem ser ignorados, se não se quer suprimir a memória que é o pacto dos humanos entre si e com o planeta, com os planetas. A história não pertence ao passado: a Bíblia, os Evangelhos, o Alcorão, o Rigveda, o Tao habitam o nosso presente. É utópico criar novos mitos coletivos, e não é suficiente nem mesmo interpretar os antigos. Cabe-nos reescrevê-los, repensá-los, revivê-los: dentro das linguagens da modernidade.

8. Não existe mais um Universo. A pesquisa científica descobre e investiga continuamente o Multiverso. Multiplicidade de culturas, de religiões, de gostos e de criações. Multiplicidade de espaços cósmicos, de matérias e de energias que coabitam com o vácuo, que se compõem com o vácuo. Não tenhais medo de serdes mortais. Capaz de pensar o multiverso, o humanismo é chamado a se confrontar com uma tarefa epocal: inscrever a mortalidade nos multiversos da vida e do cosmos.

9. Quem poderá fazer isso? O humanismo, porque ele sabe como cuidar disso. Poder-se-á dizer que o cuidado amoroso do outro, o cuidado ecológico da Terra, a educação dos jovens, a assistência aos doentes, aos deficientes, aos idosos, aos fracos não detém nem a corrida das ciências nem a explosão do dinheiro virtual. O humanismo não será um regulador do liberalismo: ao contrário, será capaz de transformá-lo, sem inversões apocalípticas ou promessas de futuros gloriosos. Tomando-se o seu tempo, criando uma nova vizinhança e solidariedades elementares, o humanismo acompanhará a revolução antropológica que é anunciada tanto pela biologia que emancipa as mulheres, quanto pelo deixar-fazer da técnica e das finanças, e pela impotência do modelo democrático-piramidal, que não consegue canalizar as inovações.

10. O homem não faz a história, mas a história somos nós. Pela primeira vez, o Homo sapiens é capaz de destruir a terra e a si mesmo em nome das suas religiões, crenças ou ideologias. E, pela primeira vez, os homens e as mulheres são capazes de reavaliar em total transparência a religiosidade constitutiva do ser humano. O encontro das nossas diversidades, aqui em Assis, testemunha que a hipótese da destruição não é a única possível. Ninguém sabe quais seres humanos sucederão a nós, que estamos comprometidos nessa transvaloração antropológica e cósmica sem precedentes. A refundação do humanismo não é nem um dogma providencial, nem um jogo do espírito: é uma aposta.

A era da suspeita não é mais suficiente. Diante das crises e das ameaças cada vez mais graves, chegou a era da aposta. Devemos ter a coragem de apostar na renovação contínua das capacidades dos homens e das mulheres de crer e de saber juntos. Para que, no multiverso cercado de vácuo, a humanidade possa perseguir longamente o seu destino criativo.
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* Publicamos aqui o discurso da filósofa, linguista e psicanalista búlgaro-francesa Julia Kristeva na Jornada de Assis. Kristeva foi colaboradora de Foucault, Barthes, Derrida e Philippe Sollers, com quem se casou em 1967.O discurso foi publicado no jornal Corriere della Sera, 27-10-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Fonte: IHU on line, 30/10/2011
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CONSCIÊNCIA, O QUE ELA ESCONDE?

Novo livro do neurocientista português
quer responder como o cérebro
torna a mente consciente António Damásio
Há mais de 30 anos o neurocientista português António Damásio escreve sobre a mente em revistas científicas e livros, mas, segundo ele, foi ficando insatisfeito com suas respostas, especialmente sobre questões como "a origem e a natureza dos sentimentos e o mecanismo por trás da construção do self". Esses são problemas críticos que Damásio investiga desde O Erro de Descartes, no qual parecia mais empenhado em saber como funcionavam as emoções.
Já em seu novo livro, E o Cérebro Criou o Homem, a consciência ocupa o centro do palco. Sem ela, lembra Damásio, as culturas e as civilizações não teriam surgido, mas a grande surpresa, de acordo com o autor, é que mesmo seres vivos sem cérebro algum, como os monocelulares, apresentam um comportamento inteligente e deliberado como Lady Gaga.
É sobre esse fato, injustamente ignorado, que o cientista se debruça no livro cujo título em português suprime o que lhe parece mais interessante no original (Self Comes to Mind), ou seja, o self como protagonista de uma mente consciente, não uma entidade metafísica que cria o homem como Roger Vadim criou a mulher no corpo de Brigitte Bardot.

O problema da consciência parece mais um assunto de filósofos do que neurocientistas. Por que ela se tornou um tópico obrigatório entre eles e como essa nova abordagem pode afetar nossos conceitos éticos e morais?
Quando queremos compreender nosso comportamento, é inevitável perguntar como é possível saber o que se passa na própria mente. Ser consciente é ter uma mente que se conhece. Chamo essa consciência de self, fundamental para que possamos respeitar os outros, compreender o que somos e o que os outros são, o que nos força a ter respeito pelo sofrimento alheio. Não acho, porém, que nossa visão ética ou moral mude por causa da descoberta da importância do self para a construção da mente consciente, pois até os animais têm consciência.

Inclusive seres unicelulares, segundo seu livro.
Sim, ela não é propriedade humana. A nossa consciência, claro, é mais complexa, por termos maior capacidade de aprendizagem e uma linguagem. Mas o organismo unicelular parece ter uma atitude, que é a da manutenção da vida, apresentam um comportamento aparentemente inteligente.

As pessoas, de modo geral, identificam neurocientistas como seres materialistas, subservientes a Darwin e pouco propensos a discutir espiritualidade.
Se se definir materialista como alguém que diz que corpo e cérebro são capazes de produzir a beleza que produzimos, então chame-me materialista. Mas, mesmo um cientista materialista não pode desrespeito pela vida do espírito - não o espírito como pensou Descartes, separado do corpo. Não é assim que as coisas se passam. Há uma maneira estreita de conceber a matéria, o corpo, como um edifício, um objeto, quando é uma vida extraordinária com trilhões de células. Essa dicotomia entre matéria e espírito não existe. A vida, como está organizada, permite esse tipo de resposta, mas estaria um deus na origem desse processo? Não posso responder, não tenho esse conhecimento. Parece-me que nenhum cientista pode.

As ideias discutidas em seu livro inspiraram o compositor Bruce Adolphe a usar seus conceitos. Ao que parece, os cientistas mostram-se mais identificados com a música do que com as artes visuais. Existe uma razão para isso?
Não sei se é verdade. A música, certo, tem uma capacidade de produzir emoções e sentimentos, é mais direta. Nas artes visuais, é preciso de um tempo de contemplação, pois somos nós que introduzimos o tempo, enquanto na música ele nos é imposto.
O problema da memória parece cada vez mais grave no mundo contemporâneo. O senhor diria que a transferência de nosso "banco de dados" para os computadores, que realizam uma tarefa de armazenamento que é nossa, estaria nos conduzindo à amnésia?
Não me parece provável. Claro que todo exercício mental ajuda. Conto no livro que estava trabalhando no laboratório numa tarde quando, ao levantar da cadeira e andar pela sala, comecei a pensar num colega sem razão aparente para isso. Percebi que me movimentava de um modo parecido com o dele e só depois, forçando a memória, lembrei de o ter visto passando sob a minha janela. Eu havia processado a sua presença sem prestar atenção.

A construção do self autobiográfico é uma das partes mais interessantes do livro. O senhor diz que, com todos os registros que temos, nem mesmo Proust precisaria revirar seu passado "para construir um típico momento de self proustiano". Como o senhor vê a evocação do passado pelos escritores contemporâneos?
Hoje é possível compreender nosso raciocínio criador, entender de que forma o cérebro funciona. No fim do século 19 e começo do 20, as pessoas tinham grande capacidade de memória, de armazenar conteúdos. Havia menos distrações. As pessoas liam, contemplavam. Hoje veem clipes e usam a internet. Não há um tempo muito grande para analisar e armazenar memórias.
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Reportagem por ANTONIO GONÇALVES FILHO
Fonte: Estadão on line, 30/10/2011 e IHU
Imagem da Internet

Sofrer de ansiedade mostra que ainda somos humanos

ENTREVISTA ANA BEATRIZ BARBOSA SILVA

PSIQUIATRA LANÇA LIVRO SOBRE ANSIEDADE;
PARA ELA, APESAR DO RISCO TRAZIDO PELO TRANSTORNO,
A INDIFERENÇA É A MAIOR AMEAÇA

Enquanto ainda formos ansiosos, há esperança. Para a psiquiatra carioca Ana Beatriz Barbosa Silva, que está lançando "Mentes Ansiosas", quinto livro de uma série de obras que já trataram de bullying, psicopatia e deficit de atenção, o problema é quando as pessoas viram as costas e não se importam mais com nada.
O novo livro da médica trata dos principais transtornos de ansiedade, passando por pânico, timidez e estresse pós-traumático, detalhando sintomas e formas de tratamento. A obra traz ainda depoimentos de pessoas que sofreram desses problemas

Folha - Que tipo de pessoa é mais propensa a sofrer transtorno de ansiedade?
Ana Beatriz Silva - As mais perfeccionistas, as que não toleram atrasos, que são mais rígidas com os acontecimentos. Essas pessoas são mais controladoras e têm mais chance de sentir ansiedade em situações que as atrasam, que fogem do "script".
Por que um medo normal pode virar uma fobia?
Muitas vezes esse medo está deslocado e é relacionado a situações de estresse. A gente sempre associa o estresse ao trabalho, mas o maior desencadeador de ansiedade patológica é o estresse prolongado e afetivo. Isso inclui estar num casamento ruim, ter uma pessoa da família com uma doença como Alzheimer, que vai destroçando uma família.
O transtorno, na verdade, vai surgir depois de um ano e meio, dois. Muitas pessoas, mesmo vivendo uma situação assim, tendem a negar o problema. Isso pode fazer a ansiedade se manifestar como fobia. Já em quem assume os problemas, o que pode acontecer é a evolução para depressão ou transtorno de pânico, que causa crises de sudorese, sensação de morte.

Mas há situações que logo desencadeiam transtornos.
O que ocorre num espaço de tempo curto, como quando alguém sofre um sequestro-relâmpago, é o estresse pós-traumático. A pessoa não quer mais sair, começa a ter pesadelos, flashbacks. Isso surge um mês depois do episódio. Não é como pânico, que é relacionado a uma coisa cotidiana. O estresse pós-traumático acontece quando você vive uma situação que ninguém está preparado para viver: ver alguém se matando ou um assassinato.

Estamos vivendo uma epidemia desse transtorno?
Tem aumentado muito o número de casos. Uma pesquisa recente mostra que a violência está em segundo lugar entre as preocupações do brasileiro e que 51% já mudaram seus hábitos por causa da violência. Cerca de 80% já presenciaram uma cena de violência. Nessas condições, surge a possibilidade do estresse pós-traumático.

O mundo está se adaptando para abrigar tantos ansiosos?
Sim. Mas uma das formas de reagir a esse ambiente é se tornar indiferente. Um vídeo que está rodando a internet mostra uma menina na China sendo atropelada, e ninguém para. É uma cena dantesca. O mundo pode estar criando uma população de indiferentes, e isso é é muito perigoso. Adoecer de ansiedade é sinal de que somos humanos, mas que precisamos mudar algo para sobreviver com dignidade. Um quarto da população vai desenvolver transtorno. É um número assustador. Isso diz também que não estamos perdendo nossa humanidade. Mas, para preservá-la, muita coisa vai ter de mudar.

O que dá para mudar?
Tentaram nos convencer de que quanto mais ansioso você é, mais você é produtivo. Isso é uma grande mentira. Estão querendo nos convencer de que não dar conta disso é uma incapacidade. É preciso ter o mínimo de ansiedade. Mas não precisa ficar "pilhado", com uma sineta tocando para dizer se cumpri uma meta. As pessoas precisam se juntar para combater isso, e também a corrupção. Isso funciona como um ansiolítico para a sociedade.
MENTES ANSIOSAS
AUTORA Ana Beatriz Barbosa Silva
EDITORA Fontanar (Objetiva)
PREÇO R$ 32,90 (208 págs.)

RAIO-X ANA BEATRIZ


A psiquiatra Ana Barbosa


IDADE E ORIGEM
45 anos, nascida no Rio de Janeiro
FORMAÇÃO
Médica pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro e psiquiatra pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.
LIVROS
"Mentes Perigosas", sobre psicopatia, "Mentes e Manias", entre outros, publicados pela ed. Fontanar
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Reportagem por DÉBORA MISMETTI EDITORA-ASSISTENTE DE SAÚDE
Fonte: Folha on line, 30/10/2011
Imagens da Internet

VISÃO GLOBAL: Futuro dos EUA passa pelos sem-diploma?

A salvação pode estar nos jovens que
deixam a faculdade para se dedicar
a novos empreendimentos
e criar empregos


 
MICHAEL ELLSBERG, THE NEW YORK TIMES, É AUTOR DE THE EDUCATION OF MILLIONAIRES: ITS NOT WHAT YOU THINK AND ITS NOT TOO LATE, MICHAEL , ELLSBERG, THE NEW YORK TIMES, É AUTOR DE THE EDUCATION OF MILLIONAIRES: ITS NOT WHAT YOU THINK AND ITS NOT TOO LATE

Digitei essas palavras num computador projetado pela Apple, e Steve Jobs, um de seus fundadores, abandonou a Universidade antes de se formar. O programa que usei para escrevê-las foi criado pela Microsoft, fundada por Bill Gates e Paul Allen, que também largaram os estudos.
Assim que esse texto for publicado, o compartilharei com meus amigos pelo Twitter, que tem entre seus fundadores Jack Dorsey, Evan Williams e Biz Stone, que não concluíram os estudos, e no Facebook – inventado, entre outros, por Mark Zuckerberg e Dustin Moskovitz, que também deixaram a escola antes do término, e alimentado por Sean Parker, outro que nunca tirou diploma.
O ambiente acadêmico americano é ótimo para produzir escritores, críticos literários e historiadores, e também para produzir profissionais com diplomas universitários. Os EUA não têm escassez de advogados e professores. Os EUA têm escassez de gente capaz de criar empregos. E as pessoas que criam empregos não são os profissionais tradicionais, mas os empreendedores.
Num discurso pronunciado recentemente para promover um projeto de lei, o presidente Barack Obama disse ao Congresso: “Todos aqui sabem que é nas pequenas empresas que surge a maior parte dos novos empregos”.
Quase certo. O setor onde quase todos os empregos são criados nos EUA é o das empresas que acabam de entrar no mercado, e não necessariamente empresas pequenas. Se a atividade das startups é o verdadeiro motor da criação de empregos nos EUA, uma coisa é clara: o atual sistema educacional funciona como freio. Em palavras simples, do jardim da infância até a universidade, aprendemos a nos dotar de algumas aptidões ou atitudes que poderiam nos ajudar a começar um empreendimento: aptidões nas áreas de comércio, networking, criatividade, e para enfrentar o fracasso sem nos deixarmos abater.
Nos EUA, não surge nenhuma empresa sem que alguém compre alguma coisa. Mas não é na faculdade que a maioria dos estudantes aprende alguma coisa sobre vendas. Muito provavelmente, eles farão um curso sobre o quanto o comércio (e o capitalismo) é um mal.
"Apostaria nos jovens que deixam
a faculdade a fim de se dedicar
a novos empreendimentos. Se quisermos
sair da situação calamitosa do emprego,
deveremos imaginar que outros seguirão
 o exemplo deles."
Além disso, poucas startups decolam sem uma ampla e vibrante rede de assessores e mentores, clientes e consumidores em potencial, vendedores de qualidade e talentos valiosos para empregar. Nós não aprendemos a usar uma rede debruçados sobre uma escrivaninha, estudando para provas de múltipla escolha. Aprendemos fora da sala de aula, conversando cara a cara com os nossos semelhantes. As startups são por definição realizações criativas. Mas nossas atuais salas de aulas, onde os alunos são preparados para testes sobre assuntos acadêmicos estritamente delimitados, asfixiam a criatividade.
Finalmente, os empreendedores precisam aceitar o fracasso. Passei os dois últimos anos entrevistando estudantes que deixaram a escola e tornaram-se milionários e bilionários. Todos falaram entusiasmados sobre a importância dos fracassos em seu empreendimento ao caminhar para o sucesso. Nosso sistema educacional estimula os estudantes a serem cautelosos e a desistirem ao primeiro sinal de fracasso (pressupondo que poderá dar uma péssima impressão nos seus currículos).
Segurança. Evidentemente, se uma pessoa quer se tornar médico, advogado ou engenheiro, precisa cursar uma faculdade. Mas, além de campos como esses, rigorosamente definidos, encarar a educação superior como o único caminho para um emprego estável constitui um grave equívoco, exacerbado por pais que consideram as profissões clássicas o melhor caminho para a segurança no emprego.
Talvez isso fosse válido há 50 anos, mas não agora. Em nossa economia imprevisível, caótica, até os jovens que não têm nenhum interesse em começar um empreendimento e querem se tornar profissionais ainda precisarão aprender as aptidões para seguir em frente.
Na verdade, as pessoas com diplomas universitários em geral ganham mais. Mas talvez isso ocorra porque a maioria das pessoas ambiciosas costuma ir para a universidade. Não há muitas evidências de que as mesmas pessoas ambiciosas ganhariam menos sem um diploma universitário.
Embora a maioria das pessoas que fundam uma empresa provavelmente tenha diploma universitário, pressupor que a faculdade é responsável pelo sucesso equivale a dar ao ensino superior mais crédito do que ele merece. Afinal, não há um mercado único de emprego nos EUA, mas dois. O mercado formal – empregos preenchidos por meio de apresentações de currículos em resposta a anúncios – representa 20% dos empregos. Os outros 80% são preenchidos no mercado informal. O empregador precisa de uma pessoa para ocupar um cargo, pede a amigos, colegas e empregados se conhecem alguém que gostaria de fazer um bom trabalho.
Nesse mercado informal, as exigências acadêmicas mencionadas nos anúncios costumam ser extremamente negociáveis e menos importantes do que os resultados no mundo real e o entusiasmo da indicação pessoal.
As aptidões adquiridas na sala de aula colocam a pessoa em uma posição de vantagem no mercado formal, mas, no informal, a aptidão obtida por meio de uma aguda percepção nas relações comuns da vida cotidiana é infinitamente mais importante. Mas os nossos filhos crescem numa cultura que os obriga a tirar boas notas, fazer bons testes de avaliação escolar e a gastar em média US$ 45 mil com educação assumindo uma dívida de US$ 23 mil para obter uma educação superior em quatro anos de universidade.
Está na hora de os EUA aceitarem um fato fundamental. Você não precisa de um diploma (e muito menos de um MBA) para começar um empreendimento e criar empregos.Os pais poderiam mudar completamente o sistema se não tivessem mentalidades fechadas, moldadas na economia estável dos anos 50. Os empregadores poderiam modificar esse panorama se oferecessem explicitamente os caminhos para o emprego àqueles que não tiraram um diploma porque deixaram a escola para se lançar num empreendimento.
E o governo poderia destinar parte das verbas que agora gasta no programa da universidade para todos à promoção da ideia de que criar uma startup é uma alternativa válida e respeitável à formação acadêmica.
Se eu apostasse nos motores da futura criação de empregos, não colocaria meu dinheiro nos jovens dos cursos superiores que se matam de estudar para passar nos testes e redigir textos com citações devidamente formatadas no estilo dos manuais a fim de incrementar seus currículos, em busca de carreiras nas profissões tradicionais e empregos nos escalões médios de grandes máquinas burocráticas empresariais ou oficiais.
Apostaria nos jovens que deixam a faculdade a fim de se dedicar a novos empreendimentos. Se quisermos sair da situação calamitosa do emprego, deveremos imaginar que outros seguirão o exemplo deles.
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TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA
Fonte: Estadão on line, 26/10/2011