Laurel Bellows: EUA não tomarão nenhuma medida até que
o Brasil decida se está disposto à reciprocidade.
Os Estados Unidos estão dispostos a abrir seu mercado para os advogados brasileiros, desde que haja reciprocidade. Foi essa a mensagem deixada pela advogada Laurel Bellows durante sua visita ao Brasil. Presidente eleita da American Bar Association (ABA), entidade americana equivalente à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), ela defendeu maior liberdade de atuação aos profissionais estrangeiros no país. Em encontro com o presidente da Ordem, Ophir Cavalcante, pediu a criação de uma comissão de advogados para discutir o assunto. Ela também manifestou preocupação com os cerca de 20 processos nos tribunais de ética e disciplina da OAB para questionar parcerias entre bancas brasileiras e estrangeiras. "Nos Estados Unidos, estamos no processo de rever nossas regras para abrir novas oportunidades, mas somente se houver reciprocidade", disse.
À frente de uma pequena banca em Chicago, Laurel atua há 30 anos no contencioso empresarial e assessora executivos na negociação de contratos de trabalho. Ela será a quinta mulher a ocupar a presidência da ABA, a partir de agosto de 2012. A advogada veio ao Brasil para o encontro da Federação Interamericana de Advogados (FIA), em Brasília, que discutiu a abertura dos mercados jurídicos nas Américas.
Valor: O que foi tratado no encontro com o presidente da OAB, Ophir Cavalcante?
Laurel Bellows : Entre outras coisas, propus a criação de uma comissão para discutir a atuação dos advogados estrangeiros no Brasil. Na medida em que o mundo se torna mais plano, precisamos entender as leis de todos os países, precisamos construir relações entre os advogados, não somente em torno dos direitos individuais, mas também em questões econômicas. O Brasil é certamente um daqueles países muito importantes para nós.
"Uma das ideias seria permitir que
o advogado estrangeiro defenda
seus clientes nas Cortes americanas"
Valor: O que motivou a proposta?
Laurel : A OAB governa a ética que regula os advogados aqui. E há processos (nos tribunais de ética e disciplina da Ordem) contra cerca de 20 escritórios estrangeiros, afirmando que eles estão atuando de forma não autorizada. Essas bancas (acusadas de se associarem de forma irregular a escritórios brasileiros) rejeitam esse argumento, e apontam que a Constituição as autoriza a praticar o direito em parceria com advogados ou escritórios brasileiros. A ABA não pode intervir nisso, mas temos uma opinião sobre a importância da abertura das fronteiras para a prática da advocacia, porque essa é a forma em que sistemas econômicos saudáveis crescem.
Valor: Como seria formada essa comissão?
Laurel : Propusemos ao Dr. Ophir uma forma de continuar a discussão, fora do litígio, desses casos que já começaram e geraram muita indignação. De um lado, teríamos alguns advogados dos Estados Unidos ou de outros países que gostariam de atuar aqui. Devemos pensar como poderiam fazer isso. Haveria certamente representantes nomeados pela OAB, e com a participação da ABA. Mais que uma conversa entre escritórios, trata-se de uma discussão mais ampla de comércio.
Valor: A diplomacia dos dois países está engajada nessa discussão?
Laurel : O Departamento de Estado dos Estados Unidos está ciente do problema. Já tivemos discussões principalmente sobre o caso da Índia, que fechou seu mercado para advogados do mundo inteiro, numa forma muito estreita de lidar com uma economia tão grande.
Valor: Que tipo de abertura vocês defendem?
Laurel : A OAB, a ABA e outras entidades de advogados do mundo entendem, claro, que estaríamos atuando segundo as leis do país de origem. Na maior parte das vezes, os advogados dos Estados Unidos estariam atuando somente segundo as leis americanas. A questão é se podem formar parcerias com advogados brasileiros. Por que não? Eles vêm ao Brasil para representar um cliente que quer que eles estejam aqui de forma permanente. Pode ser uma grande empresa de petróleo ou de computação.
Valor: A OAB está prestes a decidir se mantém ou não as regras atuais.
Laurel : A ABA não tem competência para dizer nada à OAB, somos colegas e iguais, mas como essa é uma conversa tão difícil, e temos o luxo de começá-la num nível tão bom, seria maravilhoso se talvez eles pudessem postergar essa decisão. A partir do momento em que você toma uma decisão, está mandando uma mensagem internacional que seria infeliz. Seria uma mensagem aos advogados dos Estados Unidos de que o Brasil está fechando suas portas para sua atuação. E nós, advogados americanos, enquanto revemos nossas próprias regras éticas, questionaremos a possibilidade de abrir as portas aos advogados do Brasil.
Valor: O que está em revisão?
Laurel : Nos Estados Unidos, estamos no processo de rever nossas regras para abrir novas oportunidades, mas somente se houver reciprocidade. Atualmente, você precisa ser consultor em direito estrangeiro e pode estabelecer parcerias. Uma das ideias seria permitir que o advogado estrangeiro defenda seus clientes nas Cortes americanas, desde que com a presença de um advogado americano ao seu lado. Outra é que nossos clientes nos Estados Unidos tenham a oportunidade de contratar advogados brasileiros, que poderiam trabalhar dentro do escritório da empresa, sem a necessidade de tirar uma licença de atuação, que hoje é necessária.
Valor: Quando a ABA pretende tomar uma decisão?
Laurel : A situação com o Brasil está postergando o processo. Não tomaremos essa decisão até que o Brasil decida se está ou não disposto a se engajar em alguma forma de reciprocidade.
------------------------------Fonte: Valor Econômico on line, 24/10/2011
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