domingo, 23 de outubro de 2011

Nadir, Euripedes e Yuri

MARTHA MEDEIROS*

O Nadir poderia ter feito isso, assinado “Um abraço do Nadir”, e eu não teria passado a vergonha de ter mandado uma resposta iniciando com “Querida Nadir”
Quando acontece de eu receber um e-mail sem ter certeza se quem assina é homem ou mulher, geralmente descubro uma pista dentro da mensagem mesmo. Ou a pessoa diz sou sua fã ou termina enviando um abraço do.... O Nadir poderia ter feito isso, assinado Um abraço do Nadir, e eu não teria passado a vergonha de ter mandado uma resposta iniciando com Querida Nadir.
O Nadir, meu leitor, ficou bravo comigo. Disse que eu deveria saber que Nadir é um nome árabe masculino. Desculpe, Nadir. Mas é que há muitas Nadir também. Anos atrás, quando a Luiza Brunet pensou em se dedicar à carreira de atriz, ela fez um personagem de novela que se chamava Nadir. Tem coisa mais inquestionavelmente mulher do que a Luiza Brunet?
As Nadir e os Nadir talvez passem por esse tipo de engano com alguma frequência quando o contato não é visual. Por telefone, onde não raro confundimos voz de mulher e de homem, deve ser uma bola fora atrás da outra. Na hora de preencher cadastro, também. Como assim, Nadir, 1m89cm, 97 quilos, treinador de jiu-jitsu e casado com a Leila? Mas quem garante que uma Nadir não possa ser alta, forte e casada com uma moça? Ah, os tempos modernos. De qualquer forma, os pais, ao registrarem seus filhos, podiam ser mais facilitadores.
Eurípedes concorda. A dona Eurípedes. Ela conta que seus três filhos já ouviram muita piada por terem como pais Roberto e Eurípedes. E a Donizete fica furiosa quando não reconhecem seu nome como sendo de mulher. Diz que a família das “etes” não deixa dúvida: Elizabete, Claudete, Bernadete, Janete. Pelo visto ela nunca ouviu falar daquele jogador que chegou à Seleção e foi campeão brasileiro pelo Botafogo.
A Yuri, que é cabeleireira, também não gosta de dar explicação, mas se conformou. Sabe que existiu um Yuri Gagarin que foi mais famoso do que ela. As Yuri passaram a ser confundidas com os rapazes.
Nomes estrangeiros, uma sinuca. Kim Novak, Kim Basinger, Kim Kardashian: várias gerações de Kim glamurosas, e aí surge o belo Kim Ricelli, filho da Bruna Lombardi, pra mostrar que é tão Kim quanto. Se for nome francês, então. Pergunte a um Renê ou a uma Ettienne. Ou a uma Renê e um Etienne.
Sasha, todos sabem, é filha da Xuxa, e não filho, mesmo com um nome russo masculino. E admito, envergonhada, que a primeira vez que ouvi falar de George Sand, nome expressivo da literatura francesa do século 19, nem me passou pela cabeça que pudesse ser mulher. Chamava-se na verdade Amandine-Aurore, mas passou a assinar seus livros como George Sand e assim ficou eternizada. Diferentemente do Nelson Rodrigues, que publicou alguns folhetins como Suzana Flag, mas que nunca chegou a ser tratado por “senhorita”.
Do que se conclui que assinar e-mail com Abraço, Nadir é provocação. Do Nadir, da Nadir. E assim seremos todos felizes.
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* Escritora. Cronista da ZH
Fonte: ZH on line, 23/10/2011

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