segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Saint Steve

Ivan Lessa*
Corre acelerado o processo de canonização do recentemente falecido Steve Jobs. Pura pressão popular espontânea. Trata-se de um dos raros casos de paixão mundial coletiva por um zilionário.
Poucos dias após nos deixar para sempre, foi raro o país que não teve seu pequeno altar decorado com flores, velas, fotos de Steve e algumas brincadeiras amorosas, porém chorosas de saudade, com um dos mais conhecidos logotipos do mundo, aquele da maçã mordida.
Falar nisso: por que a Apple é chamadaApple? Um dos temas mais discutidos entre os vários seminários e congraçamentos religiosos que percorreram, e continuam a percorrer a Terra com a velocidade de um e-mail (via um aparelho da empresa em questão, está visto).
Uma reunião de adoradores em Boca Ratón, na Flórida, Estados Unidos, chegou à conclusão de que a explicação mais plausível está no fato de que Steve adorava maçãs, principalmente as maçãs Macintosh, tipo inexistente no Brasil, e que a mordida pouco tem a ver com a história de Adão, Eva e a expulsão do Paraíso.
Simples jogo de palavras de uma mente privilegiada: a maçã é tida como uma fruta forbidden (proibida), donde o jogo de palavras que só funciona em inglês for-bitten fruit, pegaram? Ênfase no bitten (mordida).
A questão não está encerrada. À exceção do próprio, nada a ver com Steve Jobs pode ser considerado encerrado. Ao menos pelos próximos 2 anos, afirmam gurus da informática, que insistem em manter a compostura quando todos ao redor já a perderam.
Casos bizarros de paixão ilimitada proliferam. Ao que parece, nas Filipinas um cidadão submeteu-se e continuará a se submeter a um processo de cirurgia plástica destinado a torná-lo mais parecido com o magnata desaparecido.
Mais parecido, claro, antes da moléstia que o roubou deste mundo ora mais triste e desolado sem ele, Steve.
Cartórios enfrentam filas de gente querendo mudar o nome para Steve Jobs, muitos insistindo em tê-lo grafado como iSteve iJobs. No Brasil e na República Dominicana máscaras do homem vendem como se fossem a mais recente versão do iPhone.
Mais recente versão do iPhone. O iPhone 4S. Foi à venda em quase todo mundo neste sábado que passou.
Milhões de fãs uivavam de tanta expectativa pelo pequeno engenho e pela dor da perda do desbravador informático. Houve flores, recados e maçãs nas lojas.
Foi como se Diana, a Princesa de Gales, batizada de "a princesa do povo" por outro multi-milionário, o ex-premiê Tony Blair, estivesse dando um bis de sua morte.
Quarteirões e mais quarteirões de filas teve o mundo e mais de 4 milhões de unidades foram vendidas, não havendo (chorai, brasileiros, chorai!) data marcada para seu lançamento no país do iGuaraná e do iAçaí. Em 17 cidades do mundo, Applemaníacos participaram de eventos místicos, uniformizados com a camiseta preta rulê e as calças jeans de seu líder e desbravador.
"...que um bando de desmancha-prazeres
gosta de negar e provar por A mais B que
Steve Jobs nunca inventou nada;
que não passava de um magnífico designer
e adaptador de bolações dos outros."

Num plano menos elevado, divulgou-se, logo após a douda vendagem, que as ações daApple bateram, a 15 de outubro, sábado, um recorde mundial: US$ 422. A empresa do pomo por muitos tido como de ouro atingiu um valor de mercado arrasador: US$ 391 bilhões.
Steve Jobs: mais um desses casos que os americanos gostam de dizer que só poderia acontecer no país deles. O filho de um imigrante muçulmano sírio, Abdulfatah Jandali, tornar-se no mais importante ícone e emblema da invenção, superando até mesmo o anglo-saxão Thomas Alva Edison, que um bando de desmancha-prazeres gosta de negar e provar por A mais B que Steve Jobs nunca inventou nada; que não passava de um magnífico designer e adaptador de bolações dos outros.
Sem falar de que era um terror trabalhar para ou com ele. Por outro lado, lembremos dos microsoftianos que apontam para a filantropia contumaz do Bill Gates, tipo acabado de poltrão bobo-alegre para os maçãneiros. A bancada Bill Gates prefere lembrar que Steve Jobs, ao contrário de Gates, nunca deu um cent furado para a caridade e deixou tudo para a família.
No fundo, não há luta ou disputa. A cerimônia da beatificação é uma questão de tempo. Mas um tempo rapidinho. Já se vislumbram os primeiros sinais de piriri entre aqueles que morderam a maçã. Nada detém a cibernética.
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*Colunista da BBC Brasil
Fonte: BBC Brasil on line, 17/10/2011
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