segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Nobel de Química diz que ciências têm de estimular matemática

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Ele levou o Prêmio Nobel de Química em 1996 por descobrir uma nova molécula composta por 60 átomos de carbono. Desde 2007, porém, o inglês Harold Kroto, 71, tem se esforçado para fazer com que professores e alunos do mundo todo se interessem mais pelas ciências.
Kroto é criador do Geoset (Global Educational Outreach for Science Engineering and Technology), um programa que utiliza a internet para o ensino de ciência, engenharia e tecnologia (geoset.fsu.edu) e vinculado à Universidade do Estado da Flórida (EUA).
Para ele, a melhor forma de avançar na educação é com as ideias de outros professores. Kroto prepara suas apresentações online em um pequeno estúdio na universidade, onde ele ainda leciona. No site do programa, há também material original de cientistas de todo o mundo, incluindo de vários colegas premiados com o Nobel.
"A Enciclopédia Britânica foi a melhor fonte por muito tempo. Mas não é nada comparado ao que você pode aprender agora acessando a internet, a Wikipedia, o Google e mesmo o YouTube. É a maior revolução de nosso tempo. Foi criado algo novo. Eu chamo "o mundo GooYouWiki", diz.
Kroto afirma que o trabalho no Geoset permitiu resgatar seu amor pelas artes e pelo design gráfico e incorporá-los ao ensino. Ele tem desenvolvido parcerias com universidades no Japão, Índia, Malásia, Austrália, Nova Zelândia e Inglaterra.
O Geoset também apoia um projeto de educação on-line do físico brasileiro Alexandre Leoni Fonseca, o Landau Global (landauglobal.co.uk), que visa a despertar o interesse dos jovens para carreiras baseadas em ciência e tecnologia.
Mesmo depois de ter sido nomeado cavaleiro pela rainha Elizabeth II em 1996 e carregar agora o título de peso de "Sir", Harold Kroto prefere ser chamado simplesmente de Harry. A seguir, trechos da entrevista concedida à Folha.

FOLHA - Por que é necessário melhorar as técnicas de ensino de ciências?
HAROLD KROTO - Embora seja uma verdade e um grande problema que os professores não estejam bem preparados, precisamos trabalhar com eles, porque isso é tudo que temos. Eles têm um trabalho muito difícil que é ensinar 30, 40 crianças em uma sala de aula onde cada aluno é diferente do outro. É ridículo pensar que um bom professor pode ensinar um assunto a todos os alunos com diferentes interesses.

O que sr. propõe então?
Há muitas maneiras de resolver o problema. Mas para mim, a internet tem sido uma revolução incrível, porque é uma excelente plataforma para capturar essas informações e, ao mesmo tempo, é uma ferramenta muito boa para melhorar as técnicas de ensino.

É o que vocês propõem no Geoset?
Sim, nós olhamos para os professores com boas ideias. Então colocamos essas ideias em vídeos na internet para que outros professores possam implementá-las ou melhorar as suas próprias aulas.

Por que tentar melhorar a educação só por meio dos professores?
Os professores vão continuar sendo, por muito tempo, a melhor rota para transmitir o conhecimento. Claro que sempre haverá crianças que podem aprender sozinhas, mas a maioria precisa de guia para fazê-lo.

No Brasil, metade dos estudantes está "desconectada", e as escolas brasileiras estão entre as piores em relação ao contato dos alunos com a tecnologia. Como reverter essa situação?
Esse é um problema complexo e que a solução não está necessariamente na internet. Nosso objetivo é manter as crianças motivadas pela escola, o que pode ser associado ou não à tecnologia. Queremos catalisar o entusiasmo dos estudantes.

Mas ainda há muita diferença no que é feito nos países desenvolvidos e nos países em desenvolvimento, como o Brasil...
A China e a Índia estão trabalhando duro para estimular as crianças inclinadas à ciência e tecnologia. Nessas grandes nações, jovens escolhem essas áreas porque as vêem como uma forma de sair da pobreza, uma vez que é altamente provável encontrar trabalho relacionados a elas. Agora, é claro, se você não tem emprego para oferecer para as pessoas que se especializam em ciência ou tecnologia, os jovens não vão estudar essas áreas.

Por que é tão difícil ensinar e aprender sobre ciência?
Um dos problemas para tornar essa aprendizagem eficiente na escola é fazer com que os alunos entendam que é preciso saber matemática. É a linguagem da ciência. Se eu não falo nem entendo português, dificilmente conseguirei compreentender a cultura brasileira. Se não sabemos usar a matemática, é impossível entender em profundidade as ciências.

Para ler mais:

Ciência em baixa

Oferecer mais museus e atividades lúdicas não adianta; é preciso mais realidade nos currículos

SABINE RIGHETTI DE SÃO PAULO

Iniciativas lúdicas para atrair estudantes para as ciências funcionam. Mas, de acordo com especialistas, só se houver continuidade na escola, com um ensino que relacione fórmulas a problemas do cotidiano dos jovens.
"Precisamos de mais espaço para o aluno pesquisar o que lhe interessa e que tenha utilidade. Não adianta saber as leis de Newton e não saber o que é mudança climática", diz Paulo Blikstein, professor da Universidade Stanford (EUA).
Ele defende uma reforma no currículo do ensino de ciências, com a cobertura de menos tópicos com mais profundidade. O Brasil ocupa hoje um dos últimos lugares (53ª posição entre 65 países) em educação de ciências. A avaliação é da OCDE (Organização de Nações Desenvolvidas).
Os principais problemas por aqui são professores pouco qualificados e laboratórios (quando há) nada atrativos.
Além de deixar o país menos competitivo internacionalmente, com menos jovens motivados a seguir carreiras científicas e engenharias, a educação de má qualidade nessa área também é um instrumento de exclusão social.
"Não há como viver num mundo estruturado pela cultura científica sem estar informado sobre ela", diz Carlos Vogt, coordenador de um grupo de estudos da Unicamp que pesquisa a relação entre ciência e sociedade.
Jorge Werthein, doutor em educação pela Universidade Stanford, concorda. "Só quem entende um pouco de ciência consegue interpretar rótulos de alimentos e bulas de remédios", exemplifica.
Para ele, a relação entre educação, ciência e inclusão social é "evidente".
A "exclusão" mencionada por Werthein e Vogt pode também ser traduzida na maneira como a sociedade fica de fora de debates científicos importantes.
É isso que tem pregado Miguel Quintanilla, professor de lógica e filosofia da ciência da Universidade de Salamanca, na Espanha. "Se meu país desenvolve transgênicos com dinheiro público, por exemplo, eu tenho de entender minimamente o que é transgenia e tenho a obrigação de opinar", analisa o especialista.

ESTÍMULOS

O problema é que o Brasil vai mal na escola e também fora dela: de acordo um levantamento do MCTI (Ministério de Ciência Tecnologia e Inovação), apenas 8% da população frequenta museus de ciência.
"A gente tem de estimular os professores e os estudantes", defende o físico da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) Ildeu Moreira.
Ele é coordenador da Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, do MCTI. O evento mobiliza instituições de todo o país a criarem atividades para para chamar atenção dos jovens para o tema.
A edição deste ano começa hoje e vai até o dia 23. São mais de 650 instituições inscritas na programação, oferecendo mais de 9.000 atividades.
Em Rio Branco, a Biblioteca Pública Estadual do Acre vai exibir gratuitamente documentários sobre ciência. No Rio de Janeiro, a Fundação Planetário fará sessões sobre "as maravilhas do Universo". E por aí vai. Para Moreira, esses "eventos mobilizadores" podem estimular o sistema educacional. Mas melhorar o ensino de ciências nas escolas continua sendo fundamental.
"Não podemos deixar que a criança, quando volta para a escola, encontre o mesmo ensino desestimulante e de má qualidade de sempre", conclui Blikstein. (Fonte: Folha on line, 17/10/2011)
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Reportagem por CLÁUDIA COLLUCCI DE WASHINGTON

Fonte: Folha on line, 17/10/2011
Imagens da Internet

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