quarta-feira, 23 de agosto de 2023

Por que cada vez mais países enviam missões à Lua

Superlua vista da Espanha

Foto: Jon Nazca/Reuters 01/08/2023 - Superlua vista da Espanha

Espaçonave da Índia tenta pousar no satélite natural poucos dias depois de viagem da Rússia falhar. Nações como EUA, Japão, China e Coreia do Sul têm investido em programas de exploração lunar

A missão lunar indiana Chandrayaan-3 pretende pousar na quarta-feira (23) na Lua. Quatro dias antes, uma outra missão, a russa Luna-25, também fez uma tentativa de chegar ao satélite natural da Terra, mas falhou. Foi a primeira missão lunar operada pela Rússia desde 1976.

Essas são duas tentativas recentes feitas por países para explorar a Lua, cerca de 50 anos após as últimas missões da corrida espacial promovida pelos Estados Unidos e pela antiga União Soviética durante a Guerra Fria (1947-1991).

Neste texto, o Nexo lista as missões lunares recentes, contextualiza os interesses em torno desse tipo de exploração espacial e faz um breve histórico das investidas ao satélite natural.

Quais países têm missões lunares

Atualmente diversos países, como os Estados Unidos, Rússia, China, Índia, Japão e Coreia do Sul, têm realizado missões espaciais não tripuladas para explorar a Lua, e se preparam para enviar humanos nos próximos anos.

Até hoje apenas EUA e a antiga União Soviética conseguiram realizar pousos tripulados no satélite terrestre. Além deles, a China conseguiu fazer pousos não tripulados na Lua.

Pretensões lunares

EUA

Os Estados Unidos enviaram a missão não tripulada Artemis-1 em 2022 para dar uma volta na órbita da Lua e retornar à Terra. A Nasa, agência espacial americana, planeja circunavegar a Lua com a Artemis-2 em 2024, com quatro astronautas a bordo, sem pouso. A Artemis-3, programada para 2025, planeja realizar um pouso tripulado — com a primeira mulher negra a chegar ao satélite. Já a Artemis-4, prevista para 2027, quer fazer um pouso tripulado e levará equipamentos para o Lunar Gateway, laboratório que deve começar a ser construído pela Nasa em 2024 e servirá como uma base de estudos na Lua. As missões Artemis 5 e 6 estão planejadas para acontecer em 2028. Ambas com o objetivo de entregar outros módulos de monitoramento e experimentação para o Lunar Gateway.

RÚSSIA

A Rússia lançou a missão Luna-25, que falhou e colidiu com a Lua no sábado (19) ao se preparar para pousar. O objetivo da Roscosmos, agência espacial russa, era obter informações sobre rochas e poeira lunar, e tentar detectar água congelada no polo sul da Lua. O país pretende enviar orbitadores lunares, Luna 26, 27 e 28, nos próximos anos, mas o programa russo vem sofrendo atrasos — a Luna-25, por exemplo, estava prevista originalmente para ocorrer em 2021. Desde a invasão russa da Ucrânia, o país lida com sanções que têm impactado alguns projetos espaciais.

CHINA

A China tem um programa espacial ambicioso, o Chang’e. O país lançou o primeiro orbitador lunar em 2007 e repetiu em 2010 e em 2013 e pousou em 2019, capturando dados do satélite natural. O gigante asiático pretende voltar à Lua em 2024 e em 2026 e planeja realizar o primeiro pouso tripulado até 2030. Assim como os EUA, a China também quer construir uma estação espacial de pesquisa lunar, próximo ao polo sul do satélite, em parceria com a Rússia.

ÍNDIA

A Índia enviou a primeira sonda para orbitar a Lua em 2008 e, desde então, a Organização de Pesquisa Espacial Indiana tem desenvolvido seu programa de modo econômico. O programa espacial Chandrayaan-3 — que teve apoio da Nasa, agência espacial americana, e da ESA, agência espacial europeia — é a segunda tentativa indiana de pousar um veículo não tripulado no satélite. A primeira, com a Chandrayaan-2, falhou em 2019.

COREIA DO SUL

A Coreia do Sul enviou a sonda lunar não tripulada Danuri em 2022 para mapear e fotografar a órbita da Lua. O Instituto de Investigação Aeroespacial do país pretende realizar um pouso tripulado até 2030.

JAPÃO

O Japão realizou a primeira missão de observação lunar em 1990 e a segunda, em 2007. O satélite Selene fez uma cartografia da Lua e estudou a gravidade. A Jaxa, agência espacial japonesa, planeja novas missões para 2024 e também trabalha em cooperação com missões público-privadas com a Ispace, empresa espacial privada japonesa.

UNIÃO EUROPEIA

A ESA, agência espacial europeia, enviou em 2003 a sonda Smart-1 para a órbita lunar com o objetivo de testar novas tecnologias de propulsão solar-elétrica e técnicas de comunicação entre a espaçonave e a Terra. A agência europeia trabalha em parceria com a Nasa para novas missões.

Quais os interesses dos países na Lua

As missões lunares atuais têm como objetivo mapear o polo sul da Lua, onde há suspeita de que haja água congelada e outros recursos minerais. Essas missões também visam aperfeiçoar questões tecnológicas para o posterior envio de tripulações ao satélite.

Hannah Sargeant, cientista planetária da Universidade de Leicester, afirmou à rede britânica BBC que as missões têm o foco de examinar o ambiente lunar e testar equipamentos e experimentos no satélite, com o objetivo final de explorar Marte.

“A Lua também atua como uma plataforma de testes para tecnologias que gostaríamos de usar um dia no planeta vermelho [Marte]. Está muito mais perto de casa, a apenas três dias de distância, do que os pelo menos seis meses necessários para chegar a Marte”, disse Sargeant.

A nova corrida espacial carrega interesses técnicos e políticos, como reforçou na segunda-feira (21) Yury Borisov, chefe da Roscosmos, em entrevista à TV estatal Russia24, após o fracasso da missão russa.

“Não se trata apenas do prestígio do país e da conquista de alguns objetivos geopolíticos. Trata-se de garantir capacidades defensivas e alcançar a soberania tecnológica”, disse Borisov. “Hoje também tem valor prático porque, é claro, começou a corrida pelo desenvolvimento dos recursos naturais da Lua. E, no futuro, a Lua se tornará uma plataforma ideal para a exploração do espaço profundo.”

Nos últimos anos, a Nasa encontrou evidências de haver ferro e titânio na Lua. Já a China identificou também hidrogênio, silício, cálcio, alumínio, urânio, potássio, além de um novo mineral chamado changesite-(Y). Diversos desses minerais são importantes para as indústrias tecnológica, nuclear e de combustível, mas há também uma caça por novos minerais.

Os EUA veem a China como um adversário também no espaço e proibiram com uma lei de 2011 a cooperação espacial com o gigante asiático. Por isso, os chineses estão proibidos de participar da Estação Espacial Internacional — que é gerida pelos países que ajudaram na construção, como os EUA, Rússia, Canadá, Japão e os países da Europa por meio da ESA. Os chineses fecharam parceria com os russos para criar uma estação de pesquisa lunar.

“Eu penso que o que estamos vendo agora é uma corrida para a Lua, que é novamente política e baseada no poder, bem como tecnológica. A diferença, claro, é que a realidade geopolítica de hoje inclui muito mais países e também entidades comerciais”, afirmou Cassandra Steer, especialista em lei espacial e segurança espacial da Universidade Nacional Australiana, à revista americana de ciência e tecnologia Wired.

Os tratados que regem a exploração espacial

Poucos países tiveram sucesso em pousar no satélite, o que dá prestígio aos que conseguirem entrar no seleto grupo. Além disso, há muito o que se estudar e descobrir sobre o espaço em geral e a Lua, em particular. Uma série de leis e tratados internacionais tenta organizar a exploração fora da Terra.

A primeira resolução internacional sobre a exploração lunar foi criada em 1958 pela Assembleia Geral das Nações Unidas. A resolução reconhecia que o espaço ultraterrestre é de interesse comum da humanidade e deveria ser usado para fins pacíficos.

Em 1967, foi adotado o Tratado sobre Princípios Reguladores das Atividades Espaciais dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Cósmico, ou Tratado do Espaço Sideral, que inclui a Lua e os demais corpos celestes.

O tratado, ratificado por 111 países, incluindo o Brasil, assegura a liberdade de exploração e de uso do espaço para toda a humanidade e proíbe a apropriação por parte de qualquer país. O documento reforça que a exploração tem que ter propósitos pacíficos.

Os Acordos de Artemis, conjunto de princípios, diretrizes e práticas comuns aos países na exploração da Lua liderado pelos EUA, reafirma a ideia do Tratado do Espaço Sideral, aborda a exploração comercial para fins pacíficos, mas contém uma cláusula que analistas apontam como uma brecha para possíveis reivindicações de territórios.

Trata-se da zona de segurança, uma área na qual, se instalado algum equipamento ou infraestrutura de exploração, espera-se que outros países mantenham distância para evitar interferências prejudiciais. Não há especificação de distância ou do que seria interferência prejudicial.

Da Guerra Fria a empresas privadas

Durante a Guerra Fria os Estados Unidos, que comandavam o bloco capitalista, e a União Soviética, líder do bloco comunista, começaram a chamada corrida espacial nos anos 1950. À época, as duas potências buscavam vender suas ideologias em outros países por meio, dentre outras coisas, de influência cultural e desenvolvimento tecnológico.

A Rússia deu o pontapé inicial ao lançar o primeiro satélite artificial em órbita, o Sputnik-1, em 1957. A Rússia enviou no mesmo ano ao espaço a cadela Laika, que foi lançada em um foguete, intitulado R-7. Ela morreu em órbita devido ao superaquecimento no motor do foguete.

Os russos também enviaram a primeira pessoa em uma viagem espacial. Trata-se de Yuri Gagarin, lançado na nave Vostok-1 em abril de 1961. Ele não teve qualquer problema relacionado à viagem.

Foto: Wikimedia Commons
O astronauta Buzz Aldrin anda sobre a superfície da Lua na missão Apollo 11 em 1969

Em 20 de julho de 1969, os astronautas americanos Neil Armstrong e Buzz Aldrin se tornaram os primeiros a pisar na Lua. O pouso fez parte do programa Apollo, iniciado pela Nasa em 1961. Ao todo, o projeto teve 17 voos, com o último tendo sido realizado em 1972. Armstrong e Aldrin tocaram em solo lunar na missão Apollo 11.

A corrida espacial teve seu fim em 1975 com a missão Apollo-Soyuz, uma colaboração internacional entre EUA e União Soviética, que foi mais uma iniciativa diplomática do que uma viagem com objetivos práticos. A missão se tornou um símbolo não só do fim da corrida espacial, mas do início de uma fase menos tensa entre as potências. Em 1976, os soviéticos lançaram uma nova missão para orbitar a Lua.

A Guerra Fria teve seu fim oficial em 1991, com a dissolução da União Soviética. Após esse período, os EUA e a Rússia desenvolveram com outros países a Estação Espacial Internacional entre 1998 e 2011. A partir desse momento, a Nasa passou a cooperar com empresas privadas para que elas transportassem astronautas e equipamentos para o espaço.

Em 2007, a Fundação XPrize e o Google lançaram a Lunar XPrize, um prêmio para quem conseguisse realizar um pouso na superfície da Lua. O concurso foi reiteradamente adiado por falta de competidores viáveis até ser extinto, mas a competição estimulou missões posteriores.

Esses fatores representaram um impulso na corrida espacial privada.

Em 2014, a empresa privada luxemburguesa LuxSpace lançou a 4M (Manfred Memorial Moon Mission), a primeira missão com financiamento privado para a Lua. Foi uma pequena sonda a bordo de um foguete chinês Long Mark que sobrevoou ao redor da Lua. O objetivo era aumentar o interesse público na exploração espacial e promover sua abordagem de microssatélite para missões espaciais.

Cinco anos depois, em 2019, a empresa israelense SpaceIL lançou uma missão privada não tripulada rumo à Lua com a nave Beresheet, mas fracassou e não conseguiu pousar. A viagem tinha supervisão da Nasa. A companhia pretende fazer uma nova missão.

Em 2023, a Ispace Inc, uma empresa privada espacial japonesa, enviou, em parceria com a Jaxa, agência espacial japonesa, a sonda Hakuto-R, mas falhou. A espaçonave também levava Rashid, um veículo de exploração lunar dos Emirados Árabes Unidos, que pretendia estudar a poeira lunar.

Atualmente, os principais atores nessa corrida espacial privada são os bilionários Elon Musk, CEO da SpaceX e da Tesla e dono do X (antigo Twitter), Jeff Bezos, dono da Amazon e da Blue Origin, e Richard Branson, da Virgin Atlantic. Três dos homens mais ricos do mundo travam um duelo pelo mercado de turismo espacial.

A SpaceX, de Musk, começou com o lançamento de satélites para governos e universidades como principal atividade, mas realizou a primeira viagem espacial à órbita em 2021. A Blue Origin, de Bezos, realizou o primeiro voo turístico suborbital — quando o voo não atinge altitude suficiente para chegar à órbita terrestre — em 2021. Desde então, realizou seis viagens. Já a Virgin Atlantic, de Brandson, realizou duas viagens turísticas suborbital em junho e agosto de 2023.

Fonte:  https://www.nexojornal.com.br/expresso/2023/08/22/Por-que-cada-vez-mais-pa%C3%ADses-enviam-miss%C3%B5es-%C3%A0-Lua?posicao-home-esquerda=2

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