terça-feira, 7 de dezembro de 2021

Os artistas que transformaram jornais em telas na pandemia

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À esquerda, fileiras de capas do jornal The New York Times coloridas com gradientes. À direita, uma capa do New York Times com uma ilustração de círculos concêntricos em diferentes cores 

Foto: Sho Shibuya/Fred Tomaselli/Instagram À esquerda, obras da série ‘Sunrise from a Small Window’, de Sho Shibuya. À direita, ‘January 8, 2021’, de Fred Tomaselli

Sho Shibuya e Fred Tomaselli manipulam as capas do jornal The New York Times em obras que comentam o noticiário

Sho Shibuya, um designer japonês com base em Nova York, nos EUA, começou a pintar gradientes na capa do jornal The New York Times em abril de 2020. A cidade passava pelo primeiro lockdown em resposta à pandemia de covid-19. Preso em casa enquanto as notícias se tornavam cada vez mais trágicas e surreais, o artista passou a observar a luz crepuscular que emanava de uma janela no seu apartamento.

Do contraste entre “a ansiedade do noticiário e a serenidade do céu”, nasceu a série “Sunrise from a Small Window” (“Nascer do sol em uma pequena janela”, em tradução livre), segundo disse o artista ao jornal britânico The Guardian. No início, Shibuya coloria apenas pequenas faixas da primeira página do Times nos tons de azul da alvorada.

Quando os EUA ultrapassaram a marca de 100 mil mortos por covid-19, em 24 de maio de 2020, o jornal cobriu sua capa com centenas de pequenos obituários em homenagem às vítimas. Pela primeira vez, a intervenção gráfica do designer também ocupou toda a página. “Esse foi o dia em que a severidade da pandemia se instaurou”, afirmou em entrevista ao próprio The New York Times.

Desde então, Shibuya continuou pintando a capa inteira do jornal, e seu projeto se expandiu de forma a introduzir comentários ocasionais sobre o noticiário. Em junho de 2020, quando protestos raciais do movimento Black Lives Matter tomaram as ruas dos EUA, o artista tingiu a página de preto. Em dias em que ocorreram tiroteios no país, o artista fez furos no gradiente, como se o papel estivesse crivado de balas.

Compartilhadas no Instagram, as obras reúnem dezenas de milhares de curtidas. Entre os 181 mil seguidores do perfil, está a cantora e escritora Patti Smith, de 74 anos, autora de “Só garotos” e conhecida como a “poetisa do punk”. Smith chegou a colaborar com Shibuya em uma peça que incentivou os americanos a votarem na eleição presidencial de 2020 (nos EUA, o voto é eletivo).

Também morador de Nova York, Fred Tomaselli é outro artista que se apropriou das capas do jornal americano em pinturas e colagens que refletem o caos do noticiário. Sua série “The Times” começou em 2005, durante o governo de George W. Bush, mas foi retomada em 2020 com a chegada da pandemia.

“Eu pensei, foda-se, eu vou simplesmente transferir meu estúdio ao quarto de hóspedes e fazer pequenos desenhos sobre a emergência da covid-19, porque todos os dias tinham uma manchete marcante. Em março, era como se todos os dias fossem um novo terremoto” Fred Tomaselli, artista americano, em entrevista à revista The New Yorker

As obras de Tomaselli manipulam as fotografias publicadas no jornal, sobrepondo ilustrações psicodélicas e geométricas em cores vibrantes. O artista por vezes troca imagens de página, fazendo com que dialoguem com outros textos. A intenção é “congelar o tempo e fazer com que as obras ressoem enquanto os fatos ‘evaporam em obsolescência’”, de acordo com a galeria londrina White Cube, que fez uma exposição da série em 2017.

 

Sob a manchete “Facing Afghan Chaos, Biden Defends Exit” (“Diante do caos no Afeganistão, Biden defende retirada”, em tradução livre), por exemplo, foi inserida a imagem de uma coruja com olhos rodeados por círculos concêntricos. Os elementos “não fazem sentido juntos, mas só pareceu certo”, disse Tomaselli à New Yorker.

Fonte:  https://www.nexojornal.com.br/expresso/2021/12/06/Os-artistas-que-transformaram-jornais-em-telas-na-pandemia

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