FOLHA - Há uma cena em sua vida, quando toca trompete para os "partigiani" [movimento antifascista], aos 13 anos, na praça de Alexandria, que transmite felicidade... O sr. sempre parece estar tão feliz!
UMBERTO ECO - Aqui há duas coisas: aquele garoto e a felicidade. São diferentes, não podem coincidir. Não acredito na felicidade -estou lhe dizendo a verdade. Acredito apenas na inquietude. Ou seja, nunca estou feliz por completo -sempre preciso fazer outra coisa. Mas admito que na vida existem felicidades que duram dez segundos ou meia hora, como quando nasceu meu primeiro filho -naquele instante, eu estava feliz. Mas são momentos muito breves. Alguém que é feliz a vida toda é um cretino. Por isso, antes de ser feliz, prefiro ser inquieto. Aquele menino é o que irá aparecer em "O Pêndulo de Foucault", e aquele foi um momento feliz, sem dúvida, mas não estou certo se o foi realmente naquele momento ou no momento em que o estava narrando. Existem momentos de felicidade quando você consegue expressar alguma coisa que o deixa contente. Além disso, enquanto contava sobre aquele menino, eu estava feliz porque -sei bem que é uma afirmação muito reacionária- acredito que a vida serve apenas para recordar nossa própria infância.
PERGUNTA - Aí entra a literatura.
ECO - É o que dizem. Cada momento em que consigo me recordar bem de um instante de minha infância é um momento de felicidade, mas isso não quer dizer que os momentos de minha infância tenham sido momentos de felicidade. A infância e a adolescência são períodos muito tristes. As crianças são seres muito infelizes. Talvez eu, enquanto tocava trompete, com medo de que fosse a última vez em que tocaria aquele instrumento, tenha sido um menino infeliz. Sinto-me feliz agora, ao lembrar disso, e talvez seja essa a razão pela qual escrevo, para encontrar esses momentos muito breves de felicidade que consistem em relembrar momentos da própria infância. Sim, é por isso que escrevo. (Partes da Entrevista na FSP on line com o tïtulo: O professor aloprado, 11/05/2008)
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