sábado, 17 de junho de 2023

As charadas da obra de Charles Darwin

 Por José Eli da Veiga*

 

 Foto: Marcos Santos/USP Imagens

 

]Não poderia ter surgido melhor aperitivo para a Série de Conversas do IEA/USP sobre Complexidade, que começará em setembro, do que a palestra do físico Bruno Mota (UFRJ), no âmbito da Cátedra Otavio Frias Filho, mantida pelo IEA (Instituto de Estudos Avançados) da USP em parceira com o jornal Folha de S. Paulo.

Principalmente por ter confirmado que as discussões científicas sobre a complexidade constituem uma espécie de Torre de Babel, sem que se possa visualizar algum tipo de aproximação entre os inúmeros arquipélagos de cientistas que se dedicam à temática. Não adianta fazer de conta de que existiria consenso sobre a tão repetida noção de “emergência”, ou que seja possível ignorar, por exemplo, a noção de “sinergia”.

Também foi imperdível a conferência de posse da neurocientista Suzana Herculano-Houzel (SHH) como titular dessa Cátedra, em 9 de maio. Como destacou o relato de Uirá Machado, em matéria publicada na Folha, a conferencista contrariou “uma das teorias mais difundidas nos últimos séculos: a seleção natural de Charles Darwin”.

Porém, o que realmente tem sido “difundido”, nos últimos 160 anos, são perversos arremedos da altamente desconhecida teoria darwiniana.

Os dois primeiros monstrengos – o mecanicismo do engenheiro liberal Herbert Spencer (1820-1903) e a eugenia proposta por Francis Galton (1822-1911) – geraram imediata confusão, desde a década de 1860, seguida de uma grande bifurcação.

Por um lado, surgiram meia dúzia de outras teorias evolucionistas (Morgan, Tylor, Gordon Childe, White, Steward e Talcott Parsons), todas equivocadamente confundidas com a de Darwin. Por outro, quatro reciclagens biológicas pretensamente darwinistas, das quais a mais conhecida é a do “gene egoísta” do zoólogo Richard Dawkins.

Em meio a tamanha algaravia, muita gente supõe conhecer o pensamento de Darwin, embora só tenha percorrido fragmentos de alguns de seus muitos escritos.

É frequente que a ele se atribuam algumas das piruetas de Spencer, por exemplo, sem que se saiba o quanto Darwin foi enfático ao dizer que elas nunca o convenceram, por não terem qualquer utilidade científica.

No entanto, dos deslizes cometidos na citada conferência de posse, o mais aberrante foi uma referência à religiosidade de Darwin. Naquele instante, SHH mostrou que, infelizmente, nem teve contato com sua bela e sucinta Autobiografia.

Confiável íntegra de tão importante documento está disponível – desde 1958 – quando foi devidamente restaurado por uma das netas, a botânica Nora Barlow. Há até uma razoável tradução, publicada em 2000, pela editora Contraponto.

Darwin conta que foi durante as viagens na expedição do Beagle – entre seus 22 e 27 anos – que começara a ter dúvidas sobre a veracidade da teologia assimilada, principalmente, nos três anos anteriores, quando estivera em Cambridge, estudando para se tornar pastor.

Lembrava de ter tido frequentes sonhos ou devaneios sobre a possibilidade de algum tipo de “conciliação”, contexto em que o seu amor pela ciência começou a vencer qualquer outro tipo de interesse.

De volta à Inglaterra, quando morou em Londres, ainda solteiro, foi levado a refletir mais intensamente sobre religião. Precisamente, entre outubro de 1836 e janeiro de 1839.

Darwin perdeu a fé antes de completar trinta anos, chegando a afirmar – quarenta anos depois -, na discreta Autobiografia, que o cristianismo é execrável e que, desfazer-se de tal crença, só pode ser algo tão difícil quanto é para um macaco livrar-se de seu instintivo medo e ódio das cobras.

Materialismo

Então, nada lhe pareceu mais admirável do que ter se tornado – ao longo do que teria sido a “segunda metade de sua vida” – adepto integral do “ceticismo ou racionalismo”. Não se declara materialista, certamente porque esse era um termo extremamente perigoso.

Quando bastante jovem, estudante em Edimburgo, viu a edição de um livro de fisiologia ser suspensa por acusação de materialismo. Seu autor, W. Lawrence, teve que se demitir do posto de professor da universidade. E ainda perdeu uma ação judicial contra a edição pirata de sua obra, pois nem se reconhecia direito autoral em caso de texto considerado “blasfemo, sedicioso ou imoral”.

Considerações sobre o repúdio de Darwin ao cristianismo e a sua admiração pelo ceticismo/racionalismo são imediatamente seguidas, na Autobiografia, da advertência de que nunca pretendeu lançar luz sobre os obscuros problemas que envolvem as crenças. Como o enigma do início de todas as coisas seria insolúvel, reitera que preferiu se contentar em permanecer agnóstico.

Também foi no contexto do original laboratório que lhe propiciou a expedição do Beagle que começou a ficar obcecado pela suposição de que as espécies se modificam gradativamente.

Foi assim que, no mesmo período londrino do rompimento com o dogma cristão, deu início às suas anotações evolucionárias. Em julho de 1837, aos 28 anos, organizou suas observações em vários cadernos que prepararam o lançamento de sua primeira grande obra: A Origem das Espécies. Mas só 22 anos mais tarde, quando já era cinquentão.

Todas as publicações de Darwin foram posteriores ao seu adeus aos labirintos da transcendência, com a exceção do relatório em coautoria com o comandante do Beagle, Robert Fitz-Roy, publicado em 1836. Antes de sua primeira grande obra, de 1859, lançou 11 trabalhos empíricos com observações geológicas, botânicas e zoológicas coletadas durante as longas viagens no Beagle.

No intervalo entre essa primeira e sua segunda grande obra, de 1871, cujo título em português é uma lástima – A Origem do Homem em vez de A Filiação do Homem – publicou mais duas monografias: sobre a fertilização das orquídeas por insetos (1862) e sobre as variações entre as plantas e animais domesticados (1868), tida como a sua terceira grande obra. De outras oito até sua morte, em 1882, a mais conhecida é certamente a de 1872: A expressão das emoções no homem e nos animais.

Primeira charada

Não demorou para que a importância da “seleção” lhe parecesse cabalmente comprovada, mediante observações e enquetes sobre os procedimentos de domesticação de plantas e animais. Mas, a charada da eventual aplicação de tal ideia a organismos que vivem em estado natural só foi solucionada 15 meses depois de ter começado tais anotações.

Antes de mencionar as circunstâncias de tal lampejo, é preciso ter em conta que, a rigor, no lugar do termo “seleção”, poderia ter surgido algo como “triagem” ou “peneiramento”. Mas foi uma imposição das longas observações de Darwin sobre a onipresente “seleção artificial”.

Em sete dias, de 27 de setembro a 3 de outubro de 1838, sucedeu-lhe ler – para se distrair – uma obra que, quarenta anos antes, fora anonimamente publicada: Um ensaio sobre o princípio de população. Deve-se, com certeza, à sexta edição da tão malhada obra do pai da demografia – Thomas Robert Malthus – o estalo que deu a Darwin um esquema teórico com o qual trabalhar: a inferência de que, na formação e evolução das espécies, variações favoráveis à sobrevivência dos organismos tendem a ser preservadas, enquanto as mais desfavoráveis vão sendo eliminadas.

Esta também parece ter sido a fonte que, paralelamente, iluminou o outro descobridor da seleção natural: Alfred Russell Wallace. Chegou a dizer – em livro publicado em 1905, como “registro de fatos e opiniões” – que não lhe parecia ter sido outra a leitura mais crucial de sua vida. O tempo que passara na biblioteca de Leicester, como professor de uma pequena escola local, fora o mais importante de sua juventude.

Merece muita atenção, portanto, a conexão entre a teoria da seleção natural e a desmentida tese de Malthus. Inclusive porque é motivo de um gigantesco mal-entendido, ainda bastante em voga. Pois atribuir malthusianismo ao núcleo da teoria darwiniana é um disparate que, no caso de Karl Marx, até pode ser atribuído ao fato de logo ter se alarmado diante das repercussões político-ideológicas da primeira grande obra de Darwin, sem que depois tenha sequer lido a segunda, de 1871.

Por incrível que possa parecer, o raciocínio demográfico do reverendo Malthus resultou diretamente de suas leituras sobre os fatos que, quase um século antes, haviam inspirado o escritor Daniel Defoe a criar Robinson Crusoé. O ocorrido na ilha em que o marinheiro escocês Alexander Selkirk permanecera por mais de quatro anos.

Antes de ser batizada com o nome de tão célebre personagem de Defoe, por muito tempo foi conhecida pela atual denominação do arquipélago: Juan Fernández. A mais de 600 km da costa chilena, tem ecossistemas endêmicos razoavelmente bem preservados, por estarem em Parque Nacional, criado em 1935 e declarado Reserva Mundial da Biosfera, em 1977. Além de ser a maior, Robinson Crusoé é a única ilha habitada: algumas centenas de pessoas que vivem da pesca da lagosta.

A atenção de Malthus foi suscitada por depoimentos de navegadores que motivaram uma dissertação sobre a Lei dos pobres, publicada em 1786, por um outro pastor (metodista) chamado Joseph Townsend.

A exótica introdução de alguns poucos caprinos, por precursores espanhóis, provocara superpopulação. Mas, assim que um casal de galgos foi ali deixado, por viajantes ingleses, não demorou para que se estabelecesse um equilíbrio dinâmico. Alguns rebanhos de caprinos sobreviveram em áreas rochosas de altitude, que chegam a 1.500 metros, enquanto as partes mais baixas passaram a ser superpovoadas pelos caninos.

Nesta convivência das duas espécies, houve óbvia persistência dos indivíduos que se mostravam mais tendentes a sobreviver em tamanha luta pela vida, dependente da competição por recursos escassos, essencialmente alimentares. Só puderam se ambientar às inóspitas condições do ecossistema de altitude os caprinos que se mostraram mais resilientes ao brutal choque provocado pela chegada dos galgos. Foram eliminados os menos adequados, capazes, preparados ou “aptos”.

Em notável pirueta lógica, Malthus, seguindo Townsend, fez a transposição para populações humanas de tão exemplar constatação ecológica (territorial e ambiental) a respeito de relações entre espécies animais e delas com espécies vegetais.

Por deixar de lado um dos principais vetores do processo civilizador – a capacidade de inovação – Malthus foi levado a prognosticar rápida e inevitável explosão populacional em nações que já se encontravam densamente povoadas. Deu força aos que há muito vinham combatendo as políticas britânicas de amparo aos menos favorecidos. Seria como proteger caprinos que fossem incapazes de se manter nos mais áridos meios das montanhas de Juan Fernández.

Se Darwin tivesse concordado com a pirueta malthusiana, em vez de tratar exclusivamente de espécies animais e vegetais em sua primeira grande obra, com certeza nela teria incluído ao menos um capítulo sobre a espécie humana. Notas sobre o tema não lhe faltavam, já que mantinha cadernos especialmente a ele destinados, desde 1838-1839. Os cadernos “M” e “N”, consagrados a questões “metafísicas” são simultâneos (1837-1839) aos dedicados à “transmutação das espécies” (de “B” a “E”) e à “geologia” (o “A”).

Segunda charada

Porém, ansioso por evitar preconceitos, primeiro decidiu não redigir sequer um esboço dessa sua teoria inicial. Em junho de 1842, arriscou um primeiro resumo de 35 páginas, a lápis, ampliado no verão de 1844 para outro de 230 páginas, carinhosamente guardado. Mas, até aí o atormentara um outro problema de grande importância: a tendência de os organismos descendentes de uma mesma origem divergirem em seu caráter enquanto se modificam.

A solução só lhe surgiu muitos anos depois, numa estrada dos arredores da residência campestre de Down, para a qual se mudara em 1842, no quarto ano de casamento. Foi em tal momento que se deu conta de que a prole modificada, de todas as formas dominantes e crescentes, tende a se adaptar a uma imensa diversidade de lugares, daquilo que chamou de “economia da natureza”. Ele não dispunha, é claro, do bem posterior conceito de “ecossistema”.

Darwin não precisa a data em que lhe ocorreu tamanha epifania, que chega a comparar a um ovo de Colombo. Mas é certeza que concluiu toda a sua conjectura entre finais dos anos 1840 e início dos anos 1850. Algo que ainda precisaria esperar meio século para ser empiricamente demonstrado, pois foi só em 1900 que os botânicos acordaram para os hoje célebres experimentos, várias décadas antes, do austríaco Gregor Mendel, com ervilhas.

Apesar de ter sido publicada em alemão, a descoberta de Mendel certamente teria chegado ao conhecimento de Darwin, não fosse por sua incapacidade matemática, deficiência sobre a qual lamenta bastante em seu depoimento autobiográfico.

Com o imediato sucesso da sua primeira grande obra, tornou-se inevitável que ela fosse indevidamente extrapolada para o caso da humanidade, pois isto jogava água no moinho de duas ideologias conservadoras já bem estabelecidas e muito em voga: uma radicalmente liberal e outra mais autoritária. Se só sobreviriam os “mais aptos”, qual poderia ser o sentido de ajudar os pobres, perguntavam os primeiros (Spencer). Enquanto os outros logo propunham que se ajudasse a natureza, eliminando os “menos aptos” mediante eugenia (Galton).

A discordância de Darwin sobre tais extrapolações foi fartamente confirmada com a publicação, em 1871, de sua segunda grande obra, A Filiação do Homem.

Três afirmações sintetizadas na conclusão são suficientes para que se perceba que a história da espécie humana o levou bem além da teoria exposta na primeira, publicada doze anos antes:

1 – no que diz respeito à natureza do homem, outros fatores superaram a luta pela existência, por mais que ela tenha sido importante e ainda o seja;

2 – as qualidades morais avançaram muito mais devido às consequências dos hábitos, dos poderes de raciocínio, da instrução, da religião etc., do que dos efeitos da seleção natural;

3 – foram instintos sociais que proporcionaram o desenvolvimento moral.

Se alguém ler apenas o último capítulo, consagrado a um resumo geral conclusivo, não poderá lhe escapar as poucas linhas que sintetizam estas três afirmações. Elas são suficientes para entender que, para Darwin, a parte não humana da natureza é absolutamente regida pela “lei da seleção natural”, mas a sua parte humana só o é de forma relativa, pois o processo civilizador generaliza e institucionaliza condutas que se opõem à livre operação de tal lei.

Uma suspeita que costuma surgir quando se evoca estes três grandes tópicos da antropologia darwiniana é de que ela poderia ser teleológica: quanto mais instintos sociais selecionados, mais sucesso ou progresso. É uma crítica que só pode decorrer da imensa influência que o engenheiro Herbert Spencer exerceu, especialmente sobre pesquisadores das humanidades.

De resto, o fato de só terem se afirmado cinco ou seis processos civilizadores, enquanto milhões de outros agrupamentos humanos iam sendo eliminados – inclusive por colapso de sociedades que até chegaram a graus elevados de desenvolvimento -, só pode ser evidência do rigor com que os instintos sociais foram sendo selecionados.

Por mais que possa ser equivocado o marco teórico de Jared Diamond, é incontestável sua narrativa empírica, de 2005, sobre sociedades que colapsaram.

Antropologia darwiniana

Justiça seja feita, ninguém parece ter se empenhado, mais e melhor, em realçar o princípio fundamental de uma antropologia darwiniana do que o historiador e teorizador das ciências, fundador do Instituto Charles Darwin Internacional, diretor de um dicionário do darwinismo e da evolução e autor de inúmeros trabalhos sobre o tema: o professor francês Patrick Tort.

Ele conta que, nos anos 1970, se interessou pela obra de Darwin ao estudar as ideologias do século 18 sobre o progresso, o que o levou a também discutir a ideia de evolução. Mas que foi somente em 1980, ao dar algumas aulas como professor visitante em Abidjã, o seu primeiro contato com a descabida acusação de que Darwin teria sido racista. Então, ao procurar onde poderia estar a causa de tão grave suspeita, ou recriminação, foi imediatamente fisgado – e para o resto da vida – pelo que logo passou a chamar de “efeito reversivo da evolução”.

Na passagem da animalidade ao processo civilizador, a dinâmica natural de eliminação dos menos aptos na luta pela vida, seleciona, entre os humanos, aqueles modos de vida social que tendem a excluir tais comportamentos eliminatórios mediante a influência crescente da moral e das instituições. Com o perdão por inevitáveis pleonasmos: a seleção natural seleciona a tendência civilizadora que, por sua vez, se opõe à seleção natural.

Para entender o aparente paradoxo, é preciso recorrer à própria lógica da teoria seletiva. Não somente variações orgânicas com vantagens adaptativas são objeto da seleção natural, mas também instintos. Entre os instintos que se mostram mais favoráveis às adaptações dos humanos estão justamente aqueles que fazem triunfar os modos de vida sociais.

Então, como resultado complexo do avanço da racionalidade, do aprofundamento também crescente de sentimentos como a empatia, assim como das diferentes formas de altruísmo, ocorre uma reversão cada vez mais acentuada dos comportamentos individuais e sociais relativos ao que seria o prosseguimento do puro funcionamento seletivo anterior.

No processo civilizador, em vez da eliminação dos menos aptos, aparecem deveres como os de assistência, de socorro e de reabilitação. Em vez da extinção natural de enfermos, doentes e portadores de deficiências, eles passam a ser protegidos e tratados, graças a avanços de conhecimentos nos âmbitos da higiene e da medicina, com o objetivo de reduzir ou compensar déficits orgânicos. Em vez da aceitação das consequências destrutivas das hierarquias naturais decorrentes da força, do número e de outras aptidões vitais, surge um intervencionismo que se opõe à desqualificação social.

Conforme a segunda grande obra de Darwin – A Filiação do Homem – foi assim, sem salto nem ruptura, que a seleção natural selecionou o seu contrário: um conjunto de normas e comportamentos antieliminatórios e, portanto, antisseletivos, no sentido em que o termo seleção foi usado em sua primeira grande obra, A Origem das Espécies.

Para evitar a suposição de que alguma ruptura teria se introduzido magicamente entre estes dois livros, Tort não se cansa de enfatizar a ocorrência de uma “operação reversiva”. A continuidade evolutiva, mediante o desenvolvimento (ele mesmo selecionado) de instintos sociais, provoca um efeito que decorre da própria dinâmica da evolução darwiniana. A nova vantagem adaptativa deixa de ser de ordem biológica.

Com o propósito de tornar ainda mais clara essa sua proposta conceitual, chamada de “efeito reversivo”, Tort recorre de maneira reiterada à imagem da fita (ou faixa) de Möbius (ou Moebius), conhecido espaço topológico obtido pela colagem das duas extremidades de uma faixa, após dar-se meia volta em uma delas. Um recurso muito usado na pedagogia da matemática, em grande parte por seu caráter inevitavelmente desconcertante. O que poderia ser mais didático para ilustrar o quanto uma oposição também pode ser uma continuidade?

É fundamental realçar, então, que a ideia geral sobre variações “selecionadas” devido a suas vantagens adaptativas – cerne do materialismo darwiniano – não constitui uma conjectura só aplicável ao reino orgânico ou biológico.

O próprio Darwin também a aplicou aos “instintos”, aos “hábitos”, e aos “poderes de raciocínio”, para explicar a evolução da humanidade. Em sentido mais amplo, pode-se usá-la na análise da evolução das instituições, das mais informais às mais formais. Todavia, é muito comum, entre os ditos darwinistas, que a separação se faça entre o que é genético e o que não o é, algo que Darwin sequer imaginava que existisse.

* professor sênior do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP

Fonte:  https://jornal.usp.br/artigos/as-charadas-da-obra-de-charles-darwin/

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