Paulo Fernando Silvestre Jr.
Paulo Fernando Silvestre Jr.
“Não quero nem ver!”
Quem nunca disse isso diante de algo muito desagradável? Nosso cérebro confirma a veracidade do que nossos olhos veem. Ao encobrirmos nossa visão diante de algo ruim, é como se o fato desaparecesse e a dor fosse embora.
Infelizmente não é assim que funciona. Tudo permanece, temos que conviver com aquilo e, quem sabe, aprender algo da experiência.
Quando pensava nesse texto, lembrei-me da primeira página acima, umas das mais incríveis do jornalismo brasileiro, pela sua simplicidade e genialidade. O editor do Jornal da Tarde traduziu, apenas com uma foto, o sentimento de um país, um dia após a eliminação da Copa do Mundo da Espanha daquela que talvez tenha sido a melhor Seleção Brasileira de Futebol.
O fotógrafo Reginaldo Manente já havia capturado a tristeza dos jogadores ao final da partida, quando resolveu apontar suas lentes para as arquibancadas, que já se esvaziavam. Encontrou o então menino José Carlos Rabello, que misturava tristeza e orgulho no choro que se recusava a sair de um peito que ostentava o brasão do time.
Eu me lembro daquele dia, e de como chorei como a criança que era. Assim como José no Estádio Sarriá, eu vi a verdade, mas pela TV.
É interessante como o cérebro corrobora o que vemos, exceto quando sabemos de antemão que aquilo não é verdadeiro. É o caso do cinema, uma fábrica de sonhos desde a genialidade dos primeiros efeitos especiais do francês Georges Méliès, no início do século XX. Hoje a computação gráfica consegue realizar qualquer fantasia.
Em escala muito menor, a TV e a publicidade também bebem dessa fonte. Com os recursos digitais se tornando mais baratos e poderosos, podemos ver coisas inimagináveis até pouco tempo atrás.
Foi o que aconteceu no comercial da Volkswagen que, na semana passada, colocou Elis Regina (morta em 1982) em um dueto com sua filha, Maria Rita. A peça emocionou muita gente, mas também provocou protestos de quem achava que a imagem da Elis não deveria ser usada daquela forma.
Assim como sabemos que o cinema é fantasia, ninguém achou que Elis estivesse viva no comercial. Por isso, para mim, foi um bom uso desse recurso. Mas temo que, com a popularização da tecnologia, muitos comecem a usá-la para deliberadamente tentar distorcer a realidade, enganando pessoas para seu benefício.
Precisamos estar atentos para lembrar nosso cérebro de separar a verdade da mentira, mesmo quando essa última parecer cristalina diante de nossos olhos. Esse é um desafio que enfrentaremos de agora em diante.
Adoraria poder mudar a história daquele trágico jogo de 1982, simplesmente recriando imagens e alterando o placar para Brasil 3 X 2 Itália. Mas os fatos são os fatos, por mais que os olhos e o coração queiram dizer o contrário.
E você, como faz para distinguir a verdade da mentira?
*LinkedIn Top Voice e Creator, Mestre em Tecnologias da Inteligência e Design Digital, consultor de customer experience, mídia, cultura, reputação e transformação digital, professor, jornalista. @paulosilvestre
Fonte: https://www.linkedin.com/in/paulosilvestre/
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