Fernando Martins*
Réveillon e férias são quase sinônimos de viagem para muita gente. Mas, neste momento em que tantos arrumam as malas, talvez seja hora de refletir: por que viajamos?
É possível que haja algo em nosso DNA que nos impele a partir. Na maior parte da jornada humana na Terra, viver era viajar. Os povos nômades da Pré-História dependiam da caça e da coleta de frutos silvestres. Tinham de mudar de território à medida que a comida ficava escassa, tal qual ainda fazem os animais.
Foi a agricultura que subverteu a natureza errante do homem. A fartura dos campos cultivados permitiu aos nossos antepassados se fixarem em um mesmo local. E assim a viagem adquiriu novos significados. A sobrevivência e a tentativa de melhorar de vida continuaram (e continuam) a mover migrações. Mas a elas se somaram a cobiça por riquezas, a ânsia por desbravar o desconhecido, o desejo de se encontrar com o sagrado ou de difundir a fé na qual se acredita.
Viajantes contemporâneos ainda são impulsionados por essas razões ancestrais. No entanto, as facilidades de transporte multiplicaram os motivos para partir.
"Porque a vida é um caminho que nos
leva ao desconhecido. Porque a vida é
ela própria uma viagem."
A busca pelo lazer em outras paragens virou marca de nossos tempos, a ponto de ganhar um termo exclusivo para defini-la: turismo. Lazer, porém, é palavra insuficiente para explicar em profundidade a questão crucial: por que viajamos? Até mesmo porque o lazer no fundo é um escape – ainda que temporário – da realidade cotidiana. Sim, há quem viaje para fugir da própria vida, para se esconder de si e dos outros. Mas há viajantes que querem se encontrar. E também há quem deseja reencontrar. Reencontrar amigos e familiares distantes. Estes são os saudosos.
Já os gregários viajam acompanhados. Os solitários, sozinhos. Há ainda quem parta apenas para voltar. Para, na distância e na ausência, lembrar da importância do que deixou para trás.
Outros viajam para aprender. Descobrem sons, cores e sabores de uma terra diferente. São pessoas abertas. Trazem conhecimento na bagagem. Há quem só traga compras. Consumistas, para eles o mundo é um imenso shopping center. Status é outra força motriz, típica de quem viaja tão-somente para se exibir aos demais na volta.
Há, por fim, aqueles que nunca viajam. Uns por falta de dinheiro. Outros por medo do inesperado ou simples comodismo. São os avessos a mudanças.
Saber por que viajamos (ou por que ficamos em casa) é, enfim, descobrir um pouco de nós mesmos. É refletir sobre o rumo que damos à nossa existência. Porque a vida é um caminho que nos leva ao desconhecido. Porque a vida é ela própria uma viagem. Disso nossos antepassados remotos sabiam muito bem.
------------------------------------* Colunista do Gazeta do Povo
Fonte: Gazeta do Povo, acesso: 02/01/2012
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