sábado, 25 de fevereiro de 2012

Comer consciente evita exageros

Tente fazer: coloque uma garfada de comida na boca. Não importa qual comida, mas tem que ser algo de que você goste - digamos que seja aquela primeira porção de três raviólis quentes, cheirosos e perfeitamente cozidos.
Agora vem a parte difícil. Ponha o garfo sobre a mesa. Isso pode ser muito mais desafiador do que você imagina, porque essa primeira garfada foi muito boa e uma outra imediatamente chama. Você está com fome.
O experimento de alimentação de hoje, no entanto, consiste em desenvolver a atenção a esse reflexo impulsivo de se jogar na comida como o Come-Come da Vila Sésamo. Resista. Deixe o garfo sobre a mesa. Mastigue lentamente. Pare de falar. Sintonize-se na textura da massa, no sabor do queijo, na cor brilhante do molho no prato, no aroma do vapor que sobe.
Continue assim por toda uma refeição, e você experimentará os reveladores prazeres e frustrações de uma prática conhecida como comer consciente.
O conceito tem raízes nos ensinamentos budistas. Assim como há formas de meditação que envolvem sentar-se, respirar, ficar em pé e caminhar, muitos mestres budistas encorajam seus discípulos a meditar com a comida, expandindo a consciência através da atenção à sensação e ao propósito de cada bocado. Num exercício comum, um estudante recebe três uvas, ou uma tangerina, para passar cerca de dez ou vinte minutos olhando-as, meditando, segurando e pacientemente mastigando.
Mais tarde, no entanto, tais experimentos da boca e da mente começaram a se infiltrar na arena secular, da Faculdade de Saúde Pública de Harvard às instalações do Google na Califórnia. Aos olhos de alguns especialistas, o que parece o ato mais simples de todos - comer lentamente e genuinamente saborear cada mordida - poderia ser o remédio para uma nação acelerada, movida a comida gordurosa, na qual uma lista infinita de novas dietas nunca parece desacelerar a explosão da obesidade.
Comer consciente não é uma dieta, nem é desistir de tudo. Trata-se de vivenciar a comida de maneira mais intensa - especialmente o prazer que ela dá. Você pode comer um cheeseburguer conscientemente, se quiser. Pode assim aproveitá-lo muito mais, ou decidir, a meio caminho, que o seu corpo já está satisfeito, ou que, na verdade, ele precisa de um pouco de salada.
"Esta é uma antidieta", diz o doutor Jan Chozen Bays, pediatra e professor de meditação no Oregon e autor de "Mindful Eating: A Guide to Rediscovering a Healthy and Joyful Relationship with Food" ("Comer consciente: Um guia para a redescoberta de uma relação saudável e feliz com a comida"). "Creio que o problema fundamental é que ficamos inconscientes enquanto comemos."
Os últimos anos trouxeram consigo uma enxurrada de livros, blogs e vídeos sobre o comer hiperconsciente. Uma nutricionista de Harvard, a Dra. Lilian Cheung, dedicou-se a estudar seus benefícios e hoje encoraja apaixonadamente as corporações e os serviços de saúde a tentar essa alternativa.
No Laboratório de Alimentos e Marcas da Universidade Cornell, Brian Wansink, autor de "Mindless Eating: Why We Eat More Than We Think" ("Comer inconsciente: Por que comemos mais do que pensamos"), conduziu conjuntos de experimentos sobre os fatores psicológicos que desencadeiam o nosso consumo sem limites. Uma hora de almoço consciente tornou-se recentemente parte da agenda do Google, e gurus de autoajuda como Oprah Winfrey e Kathy Freston tornaram-se defensoras da prática.
Tendo deixado para trás as comilanças do fim de ano, vale a pena ponderar se o comer consciente não é algo de que a população mais ampla deveria estar, bem, mais consciente. Será que uma disciplina desenvolvida por monges e monjas budistas poderia nos ajudar a nos tornar mais saudáveis, a aliviar o estresse e a nos livrarmos de muitas das neuroses que hoje associamos à comida?
Cheung está convencida de que sim. Ela recentemente se reuniu a membros de sua equipe no Serviço de Saúde Harvard Pilgrim e lhes pediu que passassem um tempo razoável com uma amêndoa coberta de chocolate.
"O ritmo da vida está ficando cada vez mais rápido, portanto na verdade não temos a mesma atenção e a mesma habilidade de nos observar", diz Cheung, que, com o monge budista vietnamita Thich Nhat Hanh, coescreveu "Savor: Mindful Eating, Mindful Life" ("Saborear: Comer consciente, viver consciente"). "É por isso que o comer consciente está se tornando mais importante. Precisamos retornar a nós mesmos e nos perguntar: 'Meu corpo precisa disto? Por que estou comendo isto? Ou só estou comendo por estar triste e estressado?'."
O tema já chegou até mesmo aos círculos culinários que tendem a se focar mais nos excessos rabelaisianos que nas restrições monásticas. Em janeiro, o doutor Michael Finkelstein, um médico holístico que supervisiona o centro holístico SunRaven, em Bedford, no estado norte-americano de Nova York, fez uma palestra sobre jardinagem e comer consciente na sede da Fundação James Beard na cidade de Nova York, organização de foodies mais amiga dos banquetes que das dietas.
"Penso que a questão não é quais alimentos comer", diz ele numa entrevista. "A maior parte das pessoas sabe mais ou menos quais os alimentos saudáveis, mas não os come. Para mim, comer consciente é aquilo que você tem na cabeça enquanto come". Bays recomenda práticas que podem soar como a volta aos ritmos simples de uma vila, talvez um tanto idealizados. Se é impossível comer conscientemente todos os dias, considere planejar uma refeição especial por semana. Desligue a televisão, sente-se à mesa com seus entes queridos.
"Que tal se, nos primeiros cinco minutos da refeição, apenas comermos em silêncio e realmente aproveitarmos a comida?", diz ela. "Isso se faz passo a passo."
Mesmo ela fica às vezes ocupada demais para contemplar um grão-de-bico. Assim, há dias em que Bays toma três goles de chá conscientemente, "e daí, bem, preciso fazer meu trabalho", explica. "Qualquer pessoa pode fazer isso. Em qualquer lugar."
Mesmo traçar um burrito no carro oferece uma oportunidade para um insight. "Comer consciente inclui também o comer inconsciente", diz ela. "Estou consciente de estar comendo e dirigindo."
Poucos lugares nos Estados Unidos são tão freneticamente ativos quanto a sede do Google em Mountain View, na Califórnia, mas quando Thich Nhat Hanh esteve ali para um dia de consciência em setembro, centenas de empregados compareceram.
Parte do evento era dedicada a comer pensativamente e em silêncio, e a prática foi tão bem recebida que um almoço vegano de uma hora é agora um compromisso mensal nas instalações do Google.
"O interessante é que muitos dos participantes são os engenheiros, isso nos agradou muito", diz Olivia Wu, diretora executiva da empresa. "Acho que aquieta a mente. Creio que realmente as pessoas se sentem restauradas, para depois voltarem ao ritmo enlouquecido de onde vieram."
Afinal, não é tão frequente que os técnicos hiperprodutivos consigam parar para sentir o cheiro do pesto. "Alguém dirá: 'Comi tão menos'", diz Wu. "E outra pessoa vai dizer: 'Sabe, eu nunca tinha percebido o quanto a rúcula é ardida'."
E esse pode ser o ingrediente a ajudar o comer consciente a ganhar impulso na cultura mais geral: o sabor.
"É trágico que tantas pessoas tenham caído numa relação de guerra com a comida", diz Bays. "Comer devia ser uma atividade prazerosa."
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The New York Times News Service/Syndicate
Fonte: http://nytsyn.br.msn.com/

Um comentário:

  1. Um bom texto sobre alimentação consciente: http://comeceaemagrecer.com.br/emagrecer-alimentacao-consciente/

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