Manuel Castells*
“O essencial é ensinar a selecionar uma informação e recombiná-la. No entanto, isso coloca em questão a autoridade e as formas tradicionais de ensino”, avalia Manuel Castells,
A rápida disseminação do ChatGPT em ambientes educacionais disparou os alarmes. Um olhar sereno sobre um processo imparável exige lembrar o que já sabemos sobre o efeito da introdução de computadores conectados à internet nas escolas.
A principal conclusão estabelecida pelos estudos da OCDE-PISA é que o efeito na aprendizagem é nulo ou mesmo negativo. Pode ser positivo quando há um forte envolvimento dos professores, orientando os alunos. E como os educadores já têm muito trabalho, e como as administrações não se encarregam de formá-los, a conexão com os alunos é deficiente.
Deixados a si mesmos, os alunos não possuem critérios para discernir entre a massa de informações que encontram. E mais, os especialistas sugerem que os livros didáticos têm efeitos mais positivos para a aprendizagem, pois são supervisionados por comissões acadêmicas teoricamente competentes.
Claro que os textos de história são menos confiáveis, porque frequentemente incluem uma visão ideológica. Contudo, matemática, ciências, gramática e assim por diante são pouco permeáveis à ideologia.
Segundo os primeiros estudos disponíveis, a inteligência artificial altera as regras do jogo. O ChatGPT e outros modelos são interativos e permitem ir refinando a consulta, utilizando seu acesso a gigantescos bancos de dados.
De acordo com as pesquisas, são particularmente úteis para os educadores, que podem atualizar seus conhecimentos, em um mundo onde a informação muda constantemente. Mas, em todos os níveis de ensino, os estudantes também parecem se beneficiar, majoritariamente, para buscarem informações (como até agora fazíamos com o Google e a Wikipédia), preparar um plano de trabalho e treinar em provas acadêmicas, antes de fazê-las.
No entanto, a reação generalizada da administração dos centros educacionais é de desconfiança em relação aos estudantes e medo de que a IA faça os exames. Nos Estados Unidos, a maioria dos distritos escolares proibiu o uso do ChatGPT. Na Espanha e em outros países, espalha-se o pânico diante da quebra de controle baseado em exames. Algo que deve ser questionado, pois em um mundo onde a informação está na internet, a memorização e a repetição são uma perda de tempo.
O essencial é ensinar a selecionar uma informação e recombiná-la. No entanto, isso coloca em questão a autoridade e as formas tradicionais de ensino. Os exames deveriam ser gradualmente substituídos pela avaliação contínua e por provas realizadas com acesso à internet, como eu faço com um bom resultado. É claro que trapacear com o ChatGPT deve ser vetado, quando for uma pura cópia.
Mas existem programas de IA que detectam se essa IA fez um texto (GPTZero é o mais popular, mas existem outros), assim como passamos tempo detectando plágios. Desde já, é preciso avaliar e regulamentar a IA em todas as suas aplicações, quando ainda estamos a tempo. Contudo, sem histeria, aproveitando o que tem de aproveitável, ainda que tenhamos que mudar nossas rotinas ancoradas em uma cultura parcialmente obsoleta.
*Sociólogo espanhol, em artigo publicado originalmente por La Vanguardia e reproduzido por Clarín, 01-07-2023. A tradução é do Cepat.
Fonte: https://www.ihu.unisinos.br/630158-inteligencia-artificial-e-educacao-uma-mudanca-de-paradigma-artigo-de-manuel-castells
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