Luli Radfahrer *
Nunca se viveu tanto nem se teve tanto acesso à informação; há motivos de sobra para ser otimista
Em países ricos e supostamente civilizados há um grande temor da morte
por ataque terrorista ou por desastre aéreo, mesmo que a probabilidade
seja irrisória. Enquanto isso, o que realmente mata é muito mais próximo
e mundano. Acidentes de automóvel, hipertensão, câncer, diabetes e
doenças cardiovasculares podem ser diminuídos com um pouco de bom senso e
a eliminação de maus hábitos. Mas isso dá trabalho, é mais confortável
se alienar ou se acomodar e crer no improvável.
Nunca se viveu tanto nem se teve acesso à informação em tamanha
profundidade. Desde o Iluminismo que se constatou não ser possível o
progresso em ambientes sem acesso universal ao conhecimento. Sócrates,
Kant e Newton são exceções em sociedades com grandes proporções de
analfabetos e místicos.
O século 20 não seria o mesmo se Einstein tivesse nascido em Uganda. A
internet, apesar de todos os seus defeitos, proporcionou um salto
evolutivo sem comparação na história. Ainda há muito a progredir, mas
existe cada vez menos ignorância. No entanto, o misticismo e a
superstição esotérica, alimentados por uma paranoia infundada e por
formas diversas de autoajuda, só crescem em todo o mundo.
É curioso perceber que, em meio a tantos avanços científicos, ainda
façam sucesso lendas de alquimia, contos medievais e a imagem de uma
vidinha pacata nas comunidades tradicionais. Um viajante no tempo saído
de séculos passados acreditaria, corretamente, que teríamos perdido a
razão ao reclamarmos tanto em uma época de liberdade, igualdade e
fraternidade sem par. Como não comemorar quando a saúde, a educação e a
democracia estão mais próximas do que nunca do universal?
Informação, já diziam, é poder. A ignorância não é uma bênção, e o
conhecimento não é reversível. Mas qualquer aprendizado gera novas
responsabilidades. Muitos consideram a carga de tantas decisões grande
demais para que seja aceita sem a proteção de uma figura paterna, seja
na forma de um rei, Deus, especialista ou professor.
O temor quanto ao desconhecido é um reflexo instintivo de um "homo" que
se recusa a ser "sapiens". Reforçado pelo catastrofismo marqueteiro da
mídia, pelo teor apocalíptico das religiões que perderam a
transcendência e pela pregação fatalista das instituições falidas, uma
espécie de miopia voluntária se desenvolve quanto às possibilidades que o
futuro próximo pode trazer.
Há motivos de sobra para ser otimista, uma vez que a revolução
tecnológica mal começou. Em garagens e galpões espalhados pelo mundo,
inventores atrevidos trocam informações e compartilham tecnologias,
criando novos debates e fomentando uma capacidade inventiva que seria
inacessível a governos inteiros há pouco tempo.
Inspirados pelo exemplo de Bill Gates em seu combate à malária e de
Craig Venter na sua busca pelo sequenciamento do genoma humano, muitos
deixam de lado as forças do destino e começam a ver o futuro como um
desafio, acessível, maleável e próximo. Recusam-se a aceitar qualquer
fatalidade e interferem nele corajosamente.
O cenário é promissor. Isto é, se conseguirmos vencer, de uma vez por
todas, as forças do ocultismo travestidas de mistérios da fé.
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* Colunista da Folha
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