Assis Brasil folheia o livro de Aimé Bonpland que serviu de gatilho para seu novo romance
Foto:
Tadeu Vilani / Agencia RBS
Livro inspirado na trajetória de Aimé Bonpland (1774 - 1858) deve ganhar lançamento em outubro deste ano
Sem foco, mesmo um grande talento pode passar pela vida sem lugar. É esse o tema de Figura na Sombra,
romance novo do escritor e secretário de Cultura do Estado Luiz Antonio
de Assis Brasil. A obra, que estará nas livrarias no início de outubro,
editada pela L&PM, reconstitui a vida do personagem real Aimé
Bonpland (1774 – 1858), explorador e aventureiro que conheceu as
Américas do século 19.
Figura na Sombra encerra um ciclo de quatro romances focados
em viajantes que estiveram ou se estabeleceram no Rio Grande do Sul. A
série começou com O Pintor de Retratos (2001), romance no qual um artista europeu que deplora a fotografia termina seus dias como fotógrafo em Porto Alegre. A Margem Imóvel do Rio (2003) e Música Perdida (2006)
mostravam o Rio Grande do Sul pelo olhar de um emissário da corte
imperial, no primeiro caso, e do mineiro Maestro Mendanha, no segundo. Figura na Sombra é o episódio final da tetralogia, e o que mais demorou a ser escrito.
– Com a passagem do tempo, a gente tem que escrever um livro bom, ou
pelo menos que seja melhor do que os outros. A dificuldade não foi a
pesquisa, porque hoje em dia isso não é particularmente complicado. Foi
uma cobrança interna: não posso, a essa altura da vida e do campeonato,
publicar algo que não esteja à altura da obra anterior. Não pode fazer
feio nem representar um passo atrás – comenta o escritor, que explica
também que o esqueleto do livro estava pronto e vinha sendo editado há
dois anos.
"São personagens que estão em uma
situação limite, ou estão na
velhice
ou não encontram lugar no mundo.
Nenhum deles vem porque está
bem.
Não são viagens iniciáticas
nem transformadoras."
Figura na Sombra tem como protagonista o botânico francês
Aimé Bonpland, que acompanhou o naturalista alemão Alexander von
Humboldt a uma viagem de cinco anos às Américas, de 1799 a 1804. Ainda
jovens (nenhum dos dois tinha 30 anos), percorreram Venezuela, Colômbia,
Peru, Equador, Brasil, Cuba, México e Estados Unidos, recolhendo
amostras de plantas e insetos – milhares delas, enviadas à Europa,
ampliaram os horizontes científicos de então. Na segunda metade de sua
vida, Bonpland renunciou à Europa e se estabeleceu na América do Sul,
vindo a morrer na Argentina.
O que atraiu Assis Brasil na história de Bonpland, mais do que a
magnitude de sua aventura, foi como seu nome foi relativamente
obscurecido em comparação com o de Humboldt. No romance, Assis Brasil
arrisca uma interpretação para isso, dotando o Bonpland personagem de um
temperamento indisciplinado, hesitante entre as exigências do trabalho
científico e a vida propriamente dita. Como nos demais romances da
série, a viagem é vista por um prisma crítico. Melancólicos, os
viajantes não encontram epifanias, e sim carregam suas angústias outros
cenários:
– São personagens que estão em uma situação limite, ou estão na
velhice ou não encontram lugar no mundo. Nenhum deles vem porque está
bem. Não são viagens iniciáticas nem transformadoras.
Assis Brasil conta que, mais do que encontrar a história, foi
encontrado por ela. Ele havia recém publicado seu primeiro romance, Um Quarto de Légua em Quadro,
em 1978, quando ganhou de presente um exemplar do livro no qual o
explorador narrava viagens pela América do Sul. O livro ficou com o
escritor por quase 30 anos, até o dia em que, ao abrir uma página ao
acaso, deparou com o sucinto relato de Bonpland sobre uma conversa com o
brasileiro Antônio Rodrigues Chaves Filho, antepassado do próprio Assis
Brasil.
– O romance nasceu desse acaso – relembra o escritor.
Companheiros de viagem
O título do novo romance de Assis Brasil, Figura na Sombra,
nasceu da observação de uma pintura realizada por Eduard Ender por volta
de 1850, retratando Humboldt e Bonpland em plena selva amazônica. Em
uma composição que se revelaria simbolicamente profética, o pintor
posicionou Humboldt no centro de um indeterminado foco de luz. Bonpland,
seu parceiro na viagem que àquela altura já era famosa, foi posto ao
fundo, engolido pelas sombras.
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Reportagem por
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