Resenha por Prof. Dr. Moacir Gadotti*
Acompanhei meu filho Dimitri, astrônomo
do European Space Observatory, numa apresentação para uma classe de
crianças de 6 anos de idade, que queriam que ele falasse sobre galáxias.
Perguntei a ele o que achou da experiência. Ele me disse: “pai, eu só
quis mostrar a eles que ser astrônomo podia ser divertido”. Eu
retruquei: “ser filósofo também pode ser divertido”.
Diverti-me e aprendi muito lendo o livro de Paulo Ghiraldelli Jr., As lições de Paulo Freire: filosofia, educação e política (Manole, 2012).
Ghirardelli tem um estilo literário que seduz e inspira o leitor, incitando-o à reflexão. É um bom intérprete de Freire.
Por que gostei do livro? Porque tenho
lido muitos textos que vem sendo escritos sobre Freire, muitas teses
cheias de citações e muitos desses escritos repetem a Freire. Aqui
encontrei uma nova leitura de Freire, aberta, destemida, inteligente e…
divertida! Não podemos deixar de concordar com Ghirardelli de que
existem “maus usos” de Freire. Um deles é a repetição acrítica do seu
pensamento; outro, é reduzir Paulo Freire a um “metodólogo”, ignorando
que se trata de um filósofo da educação.
Ghirardelli lê Paulo Freire com
imaginação, tocando em pontos estruturantes do seu pensamento, como o
tema do “oprimido”. Ele entende o “oprimido” em Freire como o
“desenraizado”, aquele que, no meio em que vive, é “comprimido”: “o peso
do meio esmaga-o” (p. 3).
Dewey e Freire aparecem em diversos
momentos no livro, com suas semelhanças e diferenças. Muito boa a
diferenciação que faz entre a “experiência” em Dewey, e a “vivência” em
Freire, no capítulo V, que tem um sugestivo título: “Um grego erótico:
Paulo Freire”. Diz que Paulo Freire falava muito de amor mas “nós nunca
conseguimos entender essa palavra” (p. 28). Para Ghirardelli a
“pedagogia do amor” de Freire não se confunde com “colocar afetividade
no ato pedagógico” (p. 29). Freire, como um bom hegeliano, entendia o
amor como “eros”, como “construção cultural” (idem). Eu acrescentaria
que a “pedagogia do amor” em Freire é, ao mesmo tempo, uma pedagogia da
luta e da esperança.
Ghirardelli revisita o tema da “educação
bancária” de Freire sob uma nova ótica, realçando o papel do professor
como aquele que se comunica, que “transmite” mas não “transfere”
conhecimento (p. 38), superando uma interpretação ingênua e
espontaneísta de Freire: “quando eu, como professor, produzo um livro,
organizo o conhecimento e o transmito ao deixar o livro pronto” (p. 39).
Trata-se de um livro composto de
pequenos ensaios, um texto literário, com boas imagens e narrativas
sedutoras, por vezes indignadas, como quando se insurge, de um lado,
contra a crítica “feroz contra Paulo Freire” (p. 51) e, de outro, contra
a estupidez de um “bando de dementes tentando criar gênios analfabetos
inventivos” (p. 50). Mas esse é o Ghirardelli que conhecemos. Sempre
contundente e provocativo.
Quando a gente se diverte lendo algum
livro, acha muitas coisas bonitas e interessantes. Haveria outros temas
que gostaria de comentar – inclusive a sua análise crítica ao tema do
“preconceito linguístico”, da “interdisciplinaridade”, do “bullying” e
da relação “teoria e prática” – mas vou deixar que o leitor descubra por
si só.
Valeu Ghirardelli! Boa contribuição.
Paulo Freire não deve ser idolatrado. Ele não queria isso de jeito
nenhum. Respeitamos e admiramos um autor quando o lemos criticamente.
---------------------------------
* Presidente de Honra do Instituto Paulo Freire, Professor Titular da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP
Fonte: http://ghiraldelli.pro.br/2012/08/27/paulo-freire-revisitado/
Nenhum comentário:
Postar um comentário