quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Ronaldinho e as festas

<br /><b>Crédito: </b> arte joão luis xavier

Juremir Machado da Silva*

Confesso, eu admiro jogadores festeiros. Não qualquer festeiro. Mas os festeiros que encantam. Futebol é, cada vez mais, resultado. Estou entre os que se atrevem a perguntar: resultado para quê? Ou: resultado como? Só admiro mesmo o resultado decorrente do espetáculo. A arte é que me interessa. Prefiro Nilmar perdendo gols com arte a Damião fazendo gols na trombada. Li que Ronaldinho Gaúcho continua fazendo grandes festas, agora em Belo Horizonte: funk, comida e cinco mulheres por homem. Aceito convite. Não sei o que eu faria com cinco mulheres, mas me vejo feliz descendo até o chão.

Estou numa fase funkeira. Sempre admirei Romário pelo futebol e pelas maravilhosas festas. Uma vez, ele disse que, nascido na favela do Jacarezinho, não precisava de ritmo de jogo para matar a pau. Adorei. Gosto dos virtuoses, esses caras que superam a lógica dos quartéis e fazem a diferença com lances geniais. Sou contra concentração, vibro com os jogadores boêmios e irreverentes. Não gosto, claro, de boêmio ruim. Ou de festeiro que engorda, fica barrigudo e não consegue jogar. Agora, quando o festeiro é o melhor em campo, estamos no melhor dos mundos. Futebol é circo, espetáculo, divertimento, isso aí, deve ser vivido com alegria e praticado com descontração. Tem gente que odeia festa e quer fazer dos jogadores soldados obrigados a viverem militarmente até mais de 30 anos de idade. Asco.

Futebol é metáfora de alguma coisa. De quê? Os chatos querem que seja da disciplina, da ordem, do progresso, da abstenção, do sacrifício para atingir metas, do neoliberalismo, do positivismo, do moralismo e da morte do eu. Todo mala tem um milico dentro dele. Como não acredito em nada disso, festejo os que vão além da norma, os que subvertem a ordem, os que inventam a arte, os que vivem até a última gota. A vida é curta. Precisamos festejar. Ronaldinho, no Atlético, vem sendo genial. Joga, cria e faz festa. É um jogador dionisíaco.

Tenho convicção de que, como Romário, ele se mantém longe do álcool. Ou suficientemente distante para ter êxito dentro de campo. Graças a ele, o Atlético teve a melhor campanha no primeiro turno da história do Campeonato Brasileiro de pontos corridos. Uma vitória da festa, da orgia, no bom sentido dessa palavra, e da vida. A festa, na linguagem do grande Georges Bataille, é a parte maldita da existência, a despesa que se faz pelo prazer, a vitória da consumição sobre a consumação. Estou cada vez mais fã de R10. Tenho pena de quem admite abrir mão do prazer em nome do triunfo. Obtida a vitória, surge a questão: e agora? O que fazer do troféu? O esporte tem uma lógica absurda: alcançada a conquista, começa tudo de novo. Que maldição! Os seres razoáveis, ponderados, sensatos, que são os seres mais extremistas do mundo, vão discordar dessa minha posição. São fundamentalistas da lógica, hediondos adeptos do resultado, perigosos inimigos da vida, odiosos oponentes ao gozo, malas. Baús. Quando alguém me diz, "eu só quero é ganhar", eu sei que estou diante de alguém tão perigoso quanto um terrorista.
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* Sociólogo. Prof. Universitário. Escritor. Tradutor. Cronista do Correio do Povo
 juremir@correiodopovo.com.br
 Crédito: arte joão luis xavier 
Fonte: Correio do Povo on line, 29/08/2012

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