Fernando Reinach*
Para os animais sociais, os idosos podem ser um
problema. Como o bem-estar da comunidade depende do trabalho de todos os
membros, os idosos, por terem uma menor capacidade, contribuem menos
para o grupo. Entre os Homo sapiens (nós) esse problema foi
resolvido com o sistema de aposentadoria. A solução é compatível com
nossa organização social por causa da grande ligação afetiva que existe
entre as gerações.
Além disso, acreditamos que existe um grande valor no conhecimento
acumulado pelos mais velhos durante sua vida. Imaginar que soluções
semelhantes existam em outras sociedades complexas é um engano. Entre as
formigas, as trabalhadoras mais velhas se dedicam à defesa do
formigueiro, uma tarefa de alto risco que geralmente leva à morte. Do
ponto de vista biológico faz pouco sentido sacrificar os jovens, que têm
um alto potencial de contribuição, se existem indivíduos mais velhos
que já não podem contribuir com o bem-estar do formigueiro.
Como disse Edward O. Wilson, um famoso estudioso das formigas:
"Enquanto nós enviamos machos jovens para o campo de batalha, as
formigas enviam senhoras idosas". Mas agora foi descoberto um processo
ainda mais estranho em uma sociedade de cupins. Ao envelhecer, os
animais se transformam em verdadeiras bombas ambulantes. Quando atacados
por invasores, explodem. É o suicídio dos idosos em prol da segurança
do grupo. Sem dúvida, um fim nobre em uma sociedade em que o afeto não
existe.
Os Neocapritermes taracua são uma espécie de cupim que vive
em florestas tropicais, no interior de troncos de madeira em
decomposição. Observando esses animais, os cientistas verificaram que
uma parte dos trabalhadores possuía duas manchas azuis nas costas,
localizadas na junção do tórax com o abdome. Ao longo da vida, esses
insetos sofrem diversas mudas (trocam de casca) à medida que crescem.
Mas, apesar de trocarem todo seu esqueleto (que nos insetos está por
fora do corpo e é chamado de exoesqueleto), as mandíbulas não são
trocadas.
As mesmas mandíbulas são usadas durante toda a vida do animal. Com o
passar do tempo, as mandíbulas se desgastam e vai ficando difícil para o
animal cumprir suas tarefas. Esse desgaste das mandíbulas foi medido
pelos cientistas e serve como uma indicação da idade do animal. O que
foi observado é que, à medida que os animais envelhecem, surge essa
mancha azul, que vai crescendo e inchando. Parece que o animal está
carregando nas costas uma mochila azul.
Quando o ninho dos N. taracua é atacado por inimigos, os membros
idosos do grupo, com sua mochila azul nas costas, podem ser observados
na primeira linha de defesa. Eles são muito mais agressivos e atacam
imediatamente o inimigo. Ao serem mordidos pelo inimigo, a mochila azul
explode e espalha seu conteúdo gosmento e tóxico sobre o inimigo. Os
cientistas observaram que também é possível induzir a explosão desses
insetos-bomba com um pinça - basta apertar o corpo do animal, simulando
uma mordida.
Método. Usando esse truque, os cientistas
conseguiram isolar o "explosivo" azul presente nas mochilas. Ele é
composto por uma proteína que se liga a íons de cobre (por isso é azul) e
diversas enzimas poderosas produzidas pela glândula salivar do inseto.
Os cientistas ainda não sabem como essa meleca grudenta elimina o
inimigo, mas a observação dos combates entre os velhinhos azuis e os
invasores mostra que o método é eficiente. No passo seguinte, os
cientistas estudaram a anatomia das mochilas azuis. Elas são sacos que
se formam na costas do inseto e o material azul acumulado no seu
interior é produzido por uma glândula que se desenvolve com a idade e
tem a função específica de produzir o "explosivo" azul. Quando as
mochilas explodem, elas também libertam o conteúdo das glândulas
salivares que se localizam exatamente abaixo da mochila. Nesses animais
mais velhos, as glândulas salivares estão repletas de enzimas
digestivas, uma vez que as mandíbulas já desgastadas não permitem que os
vovôs mastiguem eficientemente a madeira do tronco onde vivem.
Esses resultados demonstram que nessa espécie de cupim, durante o
processo de envelhecimento, os animais, além de perderem sua capacidade
de trabalho, passam por mudanças profundas, desenvolvendo essa nova
glândula, produzindo seu conteúdo azul, acumulando as enzimas da saliva e
se transformando lentamente em verdadeiros "velhos-bomba". Tudo isso
para se prepararem para sua última tarefa, defender o ninho do ataque
inimigo, explodindo gloriosamente.
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* BIÓLOGO
MAIS INFORMAÇÕES: EXPLOSIVE BACKPACKS IN OLD TERMITE WORKERS. SCIENCE, VOL. 337, PÁG 436, 2012
Fonte: Estadão on line, 23/08/2012
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