sábado, 22 de setembro de 2012

“Internet em excesso pode fazer o cérebro regredir”

ENTREVISTA

Neurocientista britânica afirma que usar redes sociais em excesso pode fazer com que crianças se isolem do mundo real

Membro da secular Câmara dos Lordes, a psicofarmacóloga e neurocientista Susan Greenfield esteve em Porto Alegre essa semana para participar de conferência no seminário Fronteiras do Pensamento. Como baronesa, sua militância política leva temas sobre a neurocognição e ciência para dentro do Parlamento inglês. Como diretora do Instituto para o Futuro da Mente, promove estudos que exploram os paralelos entre os cérebros dos muito jovens e dos muito idosos e como eles são vulneráveis à tecnologia. Hospedada em um hotel na Capital, no bairro Moinhos de Vento, ela concedeu uma entrevista ao caderno Vida. Confira:

Vida – Sobre o impacto das tecnologias de informação, por que você disse uma vez que elas infantilizam o cérebro?

Susan Greenfield – Quando nós dizemos infantilizar, é porque o cérebro fica em um estágio parecido com o de uma criança. Navegar em excesso por redes sociais pode fazer o cérebro regredir, pois a exposição repetida a flashes de imagens em programas de TV, jogos de videogame ou redes sociais pode torná-lo similar ao de uma criança, que se atrai por manifestações sonoras e luminosas.

Vida – Como as tecnologias impactam na cognição das crianças que, desde cedo, dominam tablets e games?

Susan – O cérebro adolescente é muito sensível e vulnerável a essas tecnologias e ao ambiente externo. Principalmente aqueles que ficam muito tempo expostos a jogos. Uma delas pode ser a supressão neurastênica (debilidade) de uma parte do cérebro que ainda está em desenvolvimento. E a consequência principal seria uma espécie de síndrome da falta de atenção. O sintoma mais comum é não ser capaz de se concentrar em uma coisa só e não ser capaz de viver no aqui e agora.

Vida – As redes sociais não acrescentam nada ao cérebro?

Susan – Como tudo na vida, tem um lado bom e um lado ruim. Mas o ponto seria avaliar como usamos essas redes. Claramente, em algumas situações, pode ser muito positivo. Até a minha mãe, que tem 85 anos, está no Facebook. Ela mora sozinha e isso é bom, porque isso a mantém conectada. O que preocupa são as crianças pequenas, pois isso impacta no desenvolvimento de sua comunicação. Há muitas informações que não estão disponíveis no Facebook. Nós conhecemos crianças que têm problemas de relacionamento no mundo real, mas ficam confortáveis no mundo das telas. Não se pode trocar as interações do mundo real pela rede social. As tecnologias podem ser muito poderosas e úteis para as pessoas se não usarem de maneira excessiva.

Vida – Com o excesso de informação, nós ficamos mais seletivos?

Susan – Isso é um efeito da era Google. Alguns até dizem que ele é ruim, pois em vez de memorizar as coisas, a gente apenas vai lá e olha. Em um sentido, não vejo problema nisso, pois historicamente nós usamos enciclopédias, referências literárias. O que me preocupa é como nós entendemos isso. Quando temos um fato isolado, ele não parece tão interessante. Mas quando olhamos o que está em torno dele, fazendo interelações, ele fica mais interessante. O ponto, então, é relacionar com outros temas, pois aí você se dá conta do que ele representa realmente.

Vida – Estudos relacionam o excesso de informação a algumas doenças degenerativas, como Parkinson e Alzheimer. Como preveni-las?

Susan – Não há garantias. Cinquento por cento da chance é genética. Mas o que se pode fazer é exercitar o cérebro constantemente. Nós sabemos que mantê-lo ativo ajuda, assim como uma boa alimentação também colabora. Para a maioria das pessoas, porém, o problema é a falta de interação e de estímulos. Há quem passe o dia sentado em um quarto, sozinho, especialmente pessoas mais velhas. Por outro lado, há pessoas muito espertas e estimuladas que também sofrem desse problema. Exercitar o cérebro não quer dizer que você tem uma garantia que ele vai funcionar bem para sempre.

Vida – Sobre os estudos que apontam para o futuro, há alguma novidade? Será possível ler pensamentos, detectar mentiras?

Susan – Como cientista, eu nunca poderia excluir o que pode vir a acontecer no futuro. A detecção de mentiras, por exemplo, é algo plausível, porque nós já sabemos que uma pessoa que conta uma mentira pode mexer no nariz, entre outros aspectos psicológicos que podem ser interpretados. Detectar mentiras não é exatamente ler mentes: é algo bem mais possível de se fazer. Ler os pensamentos de alguém, eu, pessoalmente, penso que não posso fazer isso. Não seria competente. Para isso, precisaríamos analisar alguns tópicos da física em conjunto com imagens do cérebro.

Vida – Esses estudos podem contribuir para outras áreas do conhecimento?

Susan – Creio que temos, ainda, muitas pesquisas isoladas. As mais importantes estão na área de imunologia, endocrinologia e neurologia. Por exemplo: a massa cinzenta pode controlar sistemas do seu corpo, como o sistema imunológico e o centro do seu sistema nervoso. Isso deve estar linkado. E nós sabemos que estão linkados. Se alguém te dá pílulas de açúcar, e te fala que vai fazer você melhorar, elas realmente funcionam. O efeito placebo é uma realidade. Nosso grande desafio é entender de que forma o sistema imunológico controla ou descontrola o sistema nervoso.
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lara.ely@zerohora.com.br
LARA ELY
Fonte:  http://www.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jsp?uf=1&local=1&source=a3893199.xml&template=3898.dwt&edition=20462&section=1028

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