Michiko Kakutani, do The New York Times
Com o novo romance de J.K. Rowling, The Casual Vacancy (A
Vaga Casual, em tradução livre), entramos definitivamente na "terra dos
trouxas" - quase o mais longe que pudermos do mundo encantado de Harry
Potter. Não há mágica no livro - nem em termos de bruxaria nem de magia
narrativa.
Ao contrário, esse romance para adultos é composto por vários
personagens com os mesmos atributos da tia e do tio de Harry, Petunia e
Vernon Dursley: egocêntricos, mesquinhos, esnobes e julgadores, cujas
histórias nem cativam nem empolgam.
Infelizmente, o mundo real que ela delineou nas páginas do livro é
intencionalmente banal, tanto que foi rotulado negativamente não só como
decepcionante, mas também como bobo.
O enredo, que acontece no pequeno vilarejo fictício de Pagford, na
Inglaterra, é uma crônica sobre o desastre político e pessoal causado
pela morte inesperada de um membro do conselho paroquial local chamado
Barry Fairbrother. É como se a história fosse uma novela sombria que
descreve a vida provinciana restrita e circunspecta.
Esse definitivamente não é um livro para crianças: suicídio, estupro,
vício em heroína, espancamentos e considerações sobre patricídio
permeiam as páginas da obra; há uma cena de sexo em um cemitério, uma
grotesca descrição de um preservativo usado e uma cena alarmante de
abuso sexual doméstico.
O romance tem momentos de autêntico drama e alguns flashes aqui e ali
de humor, mas termina de forma desanimadora. Mais duas mortes
repentinas e cruéis ocorrem na história, deixando o leitor atrapalhado
com algo que nada tem a ver com as emoções evocadas pelo desfecho da
série Harry Potter.
Um mundo genérico
É claro que muitos autores já criaram retratos da vida provinciana
que captam a essência do cotidiano com grande profundidade emocional.
Isso, infelizmente, não acontece neste livro. Enquanto o universo de
Harry Potter foi ricamente imaginado e complexamente detalhado, assim
como a terra média de J.R.R. Tolkien ou a Oz de L. Franck Baum, Pagford é
estranhamente genérica: uma aldeia de brinquedo, em que os tetos das
casas somem para revelar adultérios, discordâncias matrimoniais e
conflitos generalizados entre as pequenas pessoas. É como se escrever
sobre o mundo real tenha inibido a imaginação milagrosamente inventiva
de Rowling e a privado da tensão entre o mundano e o encantado,
constrangendo a sua habilidade de criar uma história com duas ou até
mesmo três dimensões.
Conforme a história de The Casual Vacancy se desenrola e
Rowling brinca com as consequências dos segredos mais sombrios de seus
personagens, a narrativa adquire movimento, mas isso só ocorre depois de
muitas páginas percorridas. Em alguns assuntos, The Casual Vacancy
aborda temas que aparecem nos livros de Harry Potter: as perdas e os
fardos da responsabilidade que vêm com a idade adulta e a inevitável
ideia da morte.
Não terminamos o livro com a sensação de termos descoberto as
entrelinhas dos personagens de Vacancy da mesma forma como acontece com
os amigos e inimigos de Harry Potter. Também não finalizamos a obra
sabendo sobre como o passado deles e de suas famílias influenciou suas
vidas atuais.
Obviamente, J.K. Rowling teve sete livros para mapear as
complexidades do mundo dos bruxos em Harry Potter. O leitor deve torcer
para que a autora não tente mostrar o "mundo dos trouxas" de Pagford em
algum outro volume, mas, em vez disso, tente partir para algo mais
convincente e focado no futuro.
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Fonte: http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer,magia-aqui-nao-resolve,937787,0.htm
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