sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Quando o aluno não tem o perfil

Antonio Carlos Lopes*


Mesmo nas melhores escolas de medicina,
 aparecem alunos de psicologia frágil. 
Eles não sabem lidar com a decisão médica,
 que salva ou não sem quem confira 

A prática da medicina está ameaçada no Brasil. Basta abrir as páginas dos jornais para constatar uma verdadeira crise anunciada que inclui notícias como a abertura indiscriminada de escolas médicas, a flexibilização da residência médica e as tentativas de revalidar automaticamente diplomas de médicos formados no exterior sem exigir comprovação de capacidade, apenas para citar alguns exemplos. 

O resultado desse cenário é um profissional com formação deficiente para exercer a medicina. 

Sempre digo que para ser médico, além da disposição para enfrentar, com trabalho árduo, as dificuldades habituais inerentes à profissão, são necessárias características especiais. É fundamental gostar de gente. O bom médico também deve ser imbuído de firmeza de caráter, senso humanístico, consciência coletiva, amor à vida. Esses atributos não são adquiridos na faculdade. É uma questão de formação pessoal. 

Hoje, com a porta dos vestibulares aberta, a seleção coloca para dentro das escolas médicas principalmente os candidatos que têm mais conhecimento teórico, não os que de fato possuem as importantes características citadas acima. 

Por isso considero absurda a abertura de grande número de vagas sem critério de avaliação rigoroso. Desse jeito, é grande a probabilidade de entregarmos a prática da medicina a indivíduos com as mais distintas fragilidades. 

Atualmente, mesmo em vestibulares bem feitos e nas principais escolas medicas, sempre nos deparamos com alunos que passam pela seleção, mas que não têm perfil adequado para a medicina. O indivíduo se arrasta pelo curso de graduação, mas, quando chega à residência médica e é impelido a tomar decisões e conviver com a morte, não possui estrutura psicológica. 

No exercício desta profissão, as decisões que podem ou não salvar vidas são tomadas sem ter quem confira. Quem que não tem vocação acaba abandonando o curso, desenvolvendo depressão ou outros distúrbios psicológicos. 

Para evitar tantos problemas advindos da deficiência do vestibular, o ideal seria que os pretendentes à carreira médica fossem avaliados também por um exame psicotécnico. Na medicina, não lidamos com máquinas, mas com seres humanos. Essa prerrogativa é, por si só, um diferencial em relação às outras profissões liberais. 

O Brasil não precisa de tantos médicos. Precisa, sim, de bons médicos. E selecionar bem os futuros profissionais da medicina é primordial para mudar a triste realidade da saúde no país.
Paralelamente, é mister continuar lutando pela implantação de uma política de governo sólida que fixe os profissionais em regiões afastadas, com remuneração digna e possibilidade de desenvolvimento contínuo. Aí sim, alcançaremos o que sempre sonhamos. 
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*ANTONIO CARLOS LOPES, 64, é diretor da Escola Paulista de Medicina da Unifesp e presidente da Sociedade Brasileira de Clínica Médica 
Fonte:  http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/67374-quando-o-aluno-nao-tem-o-perfil.shtml 21/09/2012
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