sábado, 18 de agosto de 2012

Paul Valéry – Alfabeto

  A proposta do livro Alfabeto: cada letra do alfabeto inicia um fragmento de versos variados. Em relação ao K e ao W, Valéry pede desculpas, eram letras muito incômodas. Assim, a tradução para o português de Tomaz Tadeu respeita a primeira letra nos mais de 24 fragmentos (G, J, M, O, T se repetem)

A princípio será o sono, o silêncio, a ausência, o tempo. 
Braços e pernas encolhidos, a ausência regressa. 
Como é possível que se ouse adormecer diante dessa fraqueza existencial?|
De pé, de pé!  

Existência, todas as coisas existem neste exato momento e existem como se não existissem.  
Faz tornar puramente possível tudo o que existe.  
Grande é a impaciência. 
Há em vós algo que é igual ao que vos ultrapassa.
Inspirar, expirar. Já não sei o que vejo, já não sei o que penso, já não sei o que sou.
Lentidão, carregada de cargas invisíveis. 

Mesmo passo, lado a lado.  
Numa ausência dolorosa de olhares. 
Ouvimos e nos calamos.  
Profundo é o silêncio agora, feito de nós dois.
Que palavra tão vazia: alma.
Reduzido em organismo tão frágil é o homem, refugiando-se na existência.  

Silêncio nos separa, silêncio nos une. 
Tristes sombras dos pensamentos…  
Uma dor atravessa a substância do presente.
Vem, é preciso sucumbir enfim.

---------------------------------------
Fonte: http://www.artnativa.com/literatura/como-e-possivel-que-se-ouse-adormecer/

Foto:  Valéry em sua biblioteca.

Nenhum comentário:

Postar um comentário