Roberto Naime*
Um conceito que nos auxilia a entender as relações implícitas é o de
resiliência. Os ecossistemas vegetais tornam-se degradados quando perdem
sua capacidade de recuperação natural após distúrbio ou seja, perdem
sua resiliência. Para entender de uma forma simples o que é resiliência
vamos imaginar uma borrachinha de banco, destas de guardar dinheiro.
Enquanto enquanto não se rebenta a borrachinha, a gente puxa a
borrachinha, ela cede bastante porque é elástica, mas volta ao normal
inicial. Até que a gente rebenta a borrachinha. Aí ela não volta mais ao
normal, sofre o que se chama ruptura.
Assim é o ecossistema. Enquanto ele não foi totalmente degradado, tem
condições de se recuperar sozinho, ainda que em muito tempo. Quando o
limite de resiliência ou auto-recuperação ou limite de elasticidade do
sistema ou ponto de ruptura é atingido, o ecossistema não se recupera
mais sozinho nem em muito tempo, precisa da ajuda antrópica.
Dependendo da intensidade do distúrbio, fatores essenciais para a
manutenção da resiliência, como banco de plântulas e de sementes no
solo, capacidade de rebrota das espécies, chuvas de sementes e outros,
podem ser perdidos. Isto dificulta o processo de regeneração natural que
se torna ainda mais lento.
As florestas ciliares, denominação das matas-galeria que protegem os
cursos de água contra a ação da erosão e mantém o equilíbrio dos
sistemas de dinâmica fluvial são muito suscetíveis a perda de
resiliência.
Uma floresta ciliar está sujeita a distúrbios naturais como queda de
árvores, deslizamentos de terra, raios, etc. Isto tudo resulta na
abertura de clareiras, ou seja, abertura de dossel que são cicatrizados
através da colonização por espécies pioneiras, seguidas por espécies
secundárias, até atingir naturalmente o estágio de espécies climáticas.
Distúrbios provocados por atividades humanas tem na maioria das
vezes, maior intensidade e causam maior impacto ambiental negativo do
que fenômenos naturais. Isto compromete muito o equilíbrio das florestas
de matas ciliares.
Em muitas áreas ciliares, o processo de degradação já é antigo, tendo
iniciado com o desmatamento para transformação da área em campo de
cultivo ou pastagem. Com o passar do tempo e dependendo da intensidade
do uso, a degradação pode ser agravada através da redução da fertilidade
do solo pela exportação de nutrientes pelas culturas, ou pela prática
de queima de restos vegetais e depastagens, na compactação e erosão dos
solos pelo pisoteio de gado e trânsito de máquinas agrícolas.
A menor unidade de estudo a ser adotada é a microbacia hidrográfica,
definida como aquela cuja área é tão pequena que a sensibilidade a
chuvas de alta intensidade e às diferenças de uso dos solos, não são
suprimidas pelas características das redes de drenagem (que nada mais
são do que os pontos de elevação topográfica mais baixos, por onde
escoam as águas).
Bernardo Huberman era um pesquisador do centro de pesquisas da Xerox
em Palo Alto e certa vez incursionou por uma área que tangenciava a
biologia e a psiquiatria: tentou descrever um modelo para o movimento
irregular dos olhos dos esquizofrênicos. É bem conhecido dos psiquiatras
que os esquizofrênicos não conseguem acompanhar o movimento suave de um
pêndulo. Partiu do princípio que o modelo de rastreamento não linear
mais simples podia configurar uma boa abstração genérica da situação, a
despeito de detalhes específico. A opção é sempre a mesma. Podemos
tornar os modelos mais complexos e fiéis à realidade, ou podemos
construir abstrações mais simples e de uso mais fácil. Dificilmente se
consegue criar modelos que representem perfeitamente a realidade.
É a mesma coisa que fazer um mapa, se forem colocar absolutamente
todos os detalhes, ele se torna a própria realidade, o espaço físico que
se quer representar. A partir desta abordagem ficou claro que o modelo
ideal de um sistema complexo e o ponto de partida para a abordagem da
complexidade era de natureza biológica. Nenhum outro constructo consegue
ser tão diferenciado em escalas e tão rico em alternativas fisiológicas
individuais e coletivas.
Na medida em que os ecossistemas se tornam maiores, aumenta em geral
sua complexidade. No momento do equilíbrio entre entradas e saídas (ou
inputs e outputs) o tamanho do sistema tende a se manter estável. A
quantidade de biomassa ganha a denominação de capacidade máxima de
suporte. Qualquer alteração na mesma se denomina de perturbação para
fins analíticos. Nos estudos de impacto ambiental estes conceitos, ainda
que simples e de pleno domínio acadêmico ainda são muito
negligenciados. Até que ponto a retirada de uma vegetação para a
construção de uma estrada produzirá perda de energia no sistema, nesta
dimensão compreendido como uma estrutura holística, a nível de economia
ambiental do planeta? O que frequentemente ocorre é a definição de uma
medida compensatória de forma quase aleatória, onde uma supressão é
compensada pela criação de uma reserva ambiental, sem que com isso
ocorra nenhuma medida de energia aproveitada ou biomassa criada.
Isto é uma enorme simplificação, mas suficiente para exemplificar. No
caso esta sendo subentendido um ecossistema natural, que depende
estritamente da energia solar, sem outros subsídios antropogênicos. Uma
análise sobre sistemas urbano-industriais é muito mais complexa, pois
este sub-sistema é movido totalmente a energia subsidiada, de natureza
fóssil, nuclear ou de qualquer outra fonte renovável ou não renovável.
A análise dos ciclos dos nutrientes sob a dimensão biogeoquímica
apresenta muitas dificuldades práticas para execução e por isso
frequentemente é apropriada em teoria. As medições laboratoriais
encontram dificuldades operacionais e são negligenciadas. A importância
das taxa de troca ou de transferência de um espaço para outro são mais
importantes para a determinação da estrutura e função dos ecossistemas
do que as quantidades estáticas presentes num determinado lugar. A vida
tem sido compreendida como fluxos de matéria e energia, sem com isto
menosprezar as estruturas individuais ou populacionais, que parecem mais
resultantes dos fluxos do que geradoras dos movimentos (LOVELOCK, 1979 e
FOOTE 2007).
O ciclo do dióxido de carbono e o próprio ciclo hidrológico
constituem os processos mais fundamentais para a humanidade (ODUM, 1988,
pg 126). Até o começo da era industrial, os fluxos de carbono entre a
atmosfera, os continentes e o oceano estavam aparentemente equilibrados.
A partir deste momento o CO2 tem se elevado por causa da contribuição
antrópica, e quando se discute o fenômeno do aquecimento global,
enumerando os vários fatores geológicos, em momento algum se negligencia
de atribuir a elementos antropogênicos uma contribuição relevante,
ainda que não mensurada completamente.
A queima de combustíveis fósseis, tanto na indústria quanto nos
automóveis é importante. Mas a agricultura e as queimadas também têm
contribuições significativas, não triviais, que devem ser monitoradas e
controladas de maneira responsável.
Um acréscimo de CO2 na atmosfera maior do que sua retirada ocorre
porque o CO2 fixado nas culturas não compensa o CO2 liberado pelo solo.
As plantas são reguladores muito sensíveis do equilíbrio do CO2. A
maioria das plantas aumenta sua taxa de fotossíntese quando a
concentração de CO2 aumenta ou a concentração de O2 diminui.
Nada é mais disseminado na natureza e nos indivíduos naturais,
animais, plantas ou a própria Terra, de que cada processo é único,
absolutamente particular e individual como um organismo. Idiossincrásico
na descrição de um indivíduo e seu comportamento. Indutivo em ciências
naturais como a medicina. Sempre se tira a temperatura e pressão de um
paciente que reage sempre de forma absolutamente independente de outro.
Se não fosse assim, haveriam tabelas de temperatura e pressão por
doença. Mas não é assim, é individual e particular a reação de cada
organismo a cada condição.
LOVELOCK, J. E. Gaia: A new look at life on the earth. New York. Oxford University Press, 157p, 1979.
FOOTE, R. Mathematics and complex Sistems. Science, Vol 318 p 410-412, 2007.
ODUM, E. P. Ecologia. Rio de Janeiro: Guanabara, 1988.
FOOTE, R. Mathematics and complex Sistems. Science, Vol 318 p 410-412, 2007.
ODUM, E. P. Ecologia. Rio de Janeiro: Guanabara, 1988.
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* Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.
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