José Eustáquio Diniz Alves*
O pior cego
é o que não quer ver. Mas está ficando impossível ignorar as
evidências, cada vez mais visíveis, do aquecimento global. De acordo com
a National Oceanic and Atmospheric Administration o mês de julho de
2012 foi o mais quente dos últimos 100 anos nos Estados Unidos e a seca
que atingiu o centro do país já provocou aumento do preço mundial dos
alimentos. Segundo a NASA, o degelo na Groelândia chegou a 97%, neste
verão de 2012 no hemisfério Norte. No Ártico o degelo bateu o recorde
histórico, um mês antes do fim do verão. O derretimento do gêlo decorre
de uma onda de calor, que difere das anteriores pela intensidade e pelos
danos na camada de gelo. No semestre passado um iceberg de 119
quilômetros quadrados, duas vezes o tamanho de Manhattan, se descolou do
glaciar de Petermann.
Não há certezas absolutas até que ponto o degelo tem sido resultado
das mudanças climáticas, provocado pela emissão de gases de efeito
estufa que geram o aquecimento global. Porém, os dados mostram que os
efeitos deletérios do aumento da temperatura, pelo menos em parte, já
estão provocando o derretimento das geleiras, além de espalhar secas
catastróficas, queimadas, etc.
A redução da camada de gelo tem se acelerado desde os anos 1990 e
muitos cientistas acreditam que o Ártico pode ficar sem gelo nos verões
ainda neste século, possivelmente já na década de 2020. O climatologista
do Centro Nacional de Ciências Atmosféricas da Universidade de Reading,
Jonny Day, disse ao jornal The Guardian: “Desde os anos 1970, houve uma
redução de 40% na extensão do gelo do Ártico”.
Há também o derretimento das geleiras do Himalaia, dos Andes, do
Kilimanjaro e de outras cordilheiras do mundo. Isto tem provocado o
aumento do nível dos oceanos e ameaçado os países insulares e as
populações das regiões costeiras dos diversos continentes.
Evidentemente, existem dúvidas quanto deste aquecimento é devido à
variabilidade natural e quanto é devido às atividades antrópicas. Mas os
sinais já são suficientemente claros de que há algo de errado com o
clima da Terra e também que há algo de errado com o modelo de produção e
consumo que é hegemônico no mundo.
Segundo reportagem do jornal The Guardian, o professor Richard
Muller, físico e ex-cético da mudança climática, que fundou o projeto
Berkeley Earth Surface Temperature (Best), disse que ficou surpreso com
as descobertas de que a temperatura média da superfície terrestre
aumentou 1,5º ao longo dos últimos 250 anos, incluindo um aumento de 1
grau ao longo dos últimos 50 anos.
A equipe do projeto Best analisou o impacto da atividade solar no
aquecimento global – uma teoria popular entre os céticos do clima – mas
descobriu que, ao longo dos últimos 250 anos, a contribuição do sol foi
“praticamente zero”. As erupções vulcânicas tiveram pequenos e curtos
efeitos no aumento da temperatura no período 1750-1850, mas não afetaram
quase nada o aquecimento global no século 20.
Segundo o professor Muller: “Embora a concentração de dióxido de
carbono atmosférico não prove que cabalmente que o aquecimento global é
causado por gases de efeito estufa derivado das atividades antrópicas, é
atualmente a melhor explicação que encontrei”. Ele disse que as
descobertas de sua equipe foram mais longe e mais fortes do que o último
relatório publicado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças
Climáticas (IPCC).
Portanto, não há com negar que a temperatura da Terra subiu quase 1º
C. (um grau) nos últimos 50 anos. Se este ritmo continuar o cenários
para o século XXI são os piores possíveis e a humanidade vai enfrentar
os maiores desafios da sua história, além de colocar em risco a
sobrevivênica de inúmeras espécies. As populações litorâneas vão sofrer
com a elevação do nível do mar e com os ecomigrantes e ecorefugiados do
clima.
A divisão de população da ONU calcula que, nesta década de 2010 a
2020, estejam nascendo cerca de 136 milhões de crianças por ano e
morrendo 60 milhões de pessoas por ano. Isto quer dizer que a população
mundial cresce anualmente em 76 milhões de pessoas, representando uma
taxa de 1,1% ao ano. O Fundo Monetário Internacional calcula que a
economia mundial deva crescer em torno de 3,6% ao ano na atual década.
Portanto, a população deve crescer mais de um bilhão de habitantes nos
próximos 20 anos, enquanto a economia deve dobrar de tamanho. O impacto
deste crescimento demo-econômico na pegada ecológica será enorme.
O uso dos combustíveis fósseis está por trás do sucesso do “progresso
civilizatório”, pois possibilitou grande crescimento da economia e da
população global nos últimos 200 anos. O mundo ainda é refém do petróleo
e seus devivados. Porém, o preço desta dependência (que emite gases e
aquece o Planeta) já pode ser visto no derretimento das geleiras e
deverá ser pago nas próximas décadas, com o encarecimento do custo da
energia e o aumento do preço dos alimentos.
Muito é preciso ser feito para mudar o atual pradrão de produção e
consumo e para a redução do impacto ecológico da humanidade, mas três
tarefas globais urgentes são: proteger a biodiversidade, avançar na
transição demográfica (da alta prole para taxas de fecundidade abaixo do
nível de reposição) e garantir a transição da matriz energética (do uso
intenso de combustíveis fósseis para fontes renováveis. limpas e de
baixo carbono). O mundo precisa romper com o mito do crescimento à
qualquer custo e buscar a estabilidade dentro de suas fronteiras
planetárias. Sem dúvida, esfriar um pouco as expectativas de consumo
pode contribuir para amenizar o clima de aquecimento provocado pelas
atividades antrópicas.
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* Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor
titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da
Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus
pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
Fonte: http://www.ecodebate.com.br/2012/09/12/



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