segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Brasil está mais exposto à crise do petróleo, diz consultoria


Kjetil Solbraekke
Kjetil Solbraekke(VEJA.com/Divulgação)


Gigantismo da Petrobras e alto endividamento da estatal acentuam efeitos negativos do declínio das cotações sobre a economia, avalia especialista norueguês Kjetil Solbraekke

A Petrobras e a cadeia brasileira de petróleo e gás natural sofrem com o ônus do gigantismo arquitetado pelo governo do PT para a estatal. Com o mergulho das cotações do petróleo para o menor nível desde 2004 (o barril do tipo brent encerrou a sexta-feira negociado por 29 dólares), a Petrobras sente ainda mais os efeitos de sua frágil saúde financeira e do endividamento recorde, decorrentes da corrupção e da interferência política em sua administração. Não por acaso, na semana que passou, a estatalanunciou um corte agressivo, de 25%, em seu plano de investimentos até 2019, o que agravará ainda mais a crise na cadeia de fornecedores. A análise sobre os efeitos nocivos da baixa cotação do petróleo sobre a Petrobras é do norueguês Kjetil Solbraekke, diretor para a América do Sul da consultoria internacional Rystad Energy, especializada em energia. Segundo ele, se o setor de petróleo e gás fosse mais diversificado no Brasil, com presença mais robusta de outras petrolíferas e fornecedoras, os efeitos das baixas cotações seriam menores.
Com o barril de petróleo cotado a menos de 30 dólares e a perspectiva de que o cenário não vá se alterar antes do fim do ano, os países que mais importam do que exportam têm muito a comemorar. O Brasil poderia se juntar à festa não fosse a dívida superior a 500 bilhões de reais que a Petrobras carrega e que a impede de baixar o preço da gasolina e de outros derivados do petróleo em um primeiro momento. "A estatal sofre para não afetar tanto o seu plano de investimento porque precisa pagar bilhões de dólares em juros de sua enorme dívida, o que deixa a empresa com uma margem de manobra financeira muito limitada", explica Solbraekke.
Leia abaixo a entrevista completa:
Quais os principais efeitos da queda contínua das cotações do petróleo na economia mundial e brasileira? O preço mais baixo do petróleo tem efeito positivo sobre o crescimento do PIB global, já que significa energia mais barata para o consumo e porque ele serve como insumo para a produção de outros bens e serviços. No geral, preços mais baixos são positivos para todos os países que importam petróleo, porque, basicamente, isso significa que o preço da aquisição para o consumo interno cai. Mas para os países que exportam petróleo isso é negativo, porque eles perdem receita.
O Brasil importa mais do que exporta e, portanto, deve se beneficiar do baixo preço do petróleo. No entanto, o país tem muitas reservas de petróleo e gás que poderiam ser exploradas e desenvolvidas, o que talvez permitiria ao país mais exportar do que importar. Nesse sentido, a baixa cotação é negativa para o Brasil.
Quais são os efeitos sobre os maiores países produtores no mundo? A questão chave não está relacionada ao fato de serem ou não grandes produtores, mas, sim, se eles exportam ou não. Os Estados Unidos, por exemplo, são os maiores produtores de petróleo e gás no mundo, mas também são os maiores consumidores, junto com a China. Para a economia americana, o baixo preço é visto como um fato positivo, assim como para a China. Já para a Rússia e a Arábia Saudita, que são exportadoras, é algo claramente negativo. No entanto, a Arábia Saudita e a Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) querem propositalmente um preço mais baixo com o intuito de ampliar a sua fatia de mercado no mundo e evitar um crescimento futuro ainda maior da produção do óleo de xisto dos Estados Unidos.
Como a Petrobras é impactada pelo petróleo mais barato? A Petrobras e o Brasil estão em uma situação particularmente difícil por causa da enorme dívida que a empresa acumulou. O valor de mercado de todas as grandes companhias de petróleo e gás do mundo tem caído nos últimos anos, mas o da Petrobras caiu mais do que o de qualquer outra grande empresa. Outras petrolíferas possuem uma situação financeira sólida na crise. Mas a estatal brasileira sofre para não afetar tanto o seu plano de investimento porque precisa pagar bilhões de dólares em juros de sua enorme dívida, o que deixa a empresa com uma folga financeira muito limitada. Isso faz com que o preço baixo do petróleo prejudique a Petrobras mais do que qualquer uma das outras companhias.



Como as petrolíferas podem adaptar a sua produção a uma cotação em torno de 30 dólares o barril sem que isso afete seus lucros? A manutenção dessa cotação tem um efeito muito negativo sobre os resultados de todas as petrolíferas. O principal impacto se dá no fluxo de caixa (o volume de dinheiro que entra e sai do caixa), o que explica por que todas as companhias estão reduzindo os investimentos e cortando os custos, como, por exemplo, reduzindo o número de funcionários. Isso acontece em todas as petrolíferas do mundo. Nós vemos o mesmo com a Petrobras. Elas não têm alternativa.
Se esse cenário de baixas cotações perdurar por muito tempo, ele pode levar a uma crise profunda no setor de petróleo e gás? Os preços baixos são uma notícia ruim para a indústria de petróleo e gás, enquanto são positivos para o restante da economia no mundo. Nós da Rystad Energy não achamos que o petróleo ficará na faixa de 30 dólares o barril por um longo período. Isso porque, com o preço do petróleo tão baixo, o consumo mundial tende a aumentar mais rapidamente. Além disso, a redução dos investimentos das petrolíferas vai se traduzir em atrasos no início da exploração de novos campos. E vai impactar negativamente poços novos em campos já existentes. Cedo ou tarde, tudo isso vai criar um cenário em que a demanda voltará a superar a oferta mundial de petróleo, e as cotações passarão a subir novamente. Nós prevemos que isso aconteça no fim de 2016.
Por que a crise parece afetar mais o Brasil do que outros países? Isso acontece porque a Petrobras tem uma posição de mercado muito dominante e porque ela é mais endividada do que qualquer uma das outras companhias do setor. Se houvesse mais diversidade de operadoras e petrolíferas no Brasil, as consequências da queda do petróleo seriam bem menores para a estatal. A Petrobras está reduzindo investimentos mais do que as outras empresas. Se a empresa vendesse alguns campos de exploração, poderia amenizar a crise na indústria brasileira de petróleo e gás, o que inclui os fornecedores.
Outro problema específico para o Brasil é que o governo impôs muitos custos extras para os projetos de petróleo e gás na forma de exigências de conteúdo local para os fornecedores de equipamentos. O resultado é que o custo de desenvolvimento de campos de petróleo no Brasil é muito mais alto que em outros países comparáveis. O Brasil possui umas das mais atraentes reservas de petróleo no mundo. Se houvesse mais competição internacional e uma regulamentação eficiente, isso se traduziria em mais investimentos.
O baixo preço do petróleo pode atrasar a exploração do pré-sal? O problema não é o preço baixo do petróleo. As reservas do pré-sal estão entre as descobertas recentes mais lucrativas do mundo se forem consideradas só as suas dimensões e a sua produtividade. Se as jazidas estivessem em outro país, seriam exploradas a toda velocidade, mesmo com as atuais cotações. O problema no Brasil é que o desenvolvimento fica a cargo de uma única empresa, a Petrobras, submetida a regras de conteúdo nacional e altos custos regulatórios.
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Reportagem por  Larissa Baltazar - Veja
Fonte: http://veja.abril.com.br/noticia/economia/brasil-esta-mais-exposto-a-crise-do-petroleo-diz-consultoria

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