Entraremos em guerra com os robôs? Viveremos eternamente?
O ‘futurólogo do Google’ faz previsões sobre os próximos 100 anos
As máquinas podem pensar como os humanos?
Quando nos vão superar em inteligência? Seremos capazes de dominá-las
ou sucumbiremos ao seu domínio? A ficção científica está há anos
representando esses dilemas em fantasias beirando o apocalíptico, mas a
ciência cada vez mais encontra respostas mais rápidas e eficazes que nos
fazem pensar que esse futuro imaginado já está entre nós.
Há alguns dias uma equipe de pesquisadores da Universidade de Toronto
anunciava sua última conquista: uma máquina que reproduz o sistema de
aprendizagem de uma criança. Isto é: que em vez de precisar de muitos
dados para relacioná-los com algoritmos, a máquina fosse capaz de
reconhecer as coisas a partir de um único exemplo. Seu ponto de partida
foi a caligrafia, mas já se vislumbram as infinitas possibilidades do
projeto.
Há um homem que sonha com isso todos os dias. Com o futuro.
É Raymond Kurzweil, conhecido como “o futurólogo do Google”. Esse
especialista em Inteligência Artificial (IA) ostenta desde 2012 o cargo
de chefe de Engenharia no gigante norte-americano. E vem fazendo
previsões com um altíssimo nível de acerto há 30 anos. Previu a queda da
URSS, a vitória do supercomputador Deep Blue sobre o enxadrista
Kasparov e o crescimento do uso da Internet e das ferramentas de busca
quando a Internet era ainda uma ferramenta difícil de usar e pobre em
conteúdo. Aos 67 anos, Kurzweil toma diariamente 100 comprimidos de
suplementos vitamínicos (até há pouco tempo eram 350) com a ideia de
viver até que possa transferir todo seu cérebro a um computador e assim
alcançar a imortalidade. Suponhamos que acabe reduzindo seu coquetel de
pílulas a duas: a vermelha e a azul. Como no Matrix: abraçar a dolorosa
verdade ou continuar alimentando a ilusão, viver no mundo real ou
entregar-se por completo ao virtual. Enfrentar, em definitivo o dilema a
que todo o planeta se dirige. Segundo ele, o primeiro passo para a
imortalidade será o aparecimento de nanorobôs que nos curarão por dentro
e alongarão nossa expectativa de vida até que possamos trasladar-nos a
um invólucro mais duradouro.
Nem todos os cientistas estão de acordo com algumas de suas
previsões. “Claro, foi a cara midiática da inteligência artificial e com
seu discurso atraiu muitos investidores nesse campo”, afirma Ulises
Cortés, catedrático de IA na Universidade Politécnica da Catalunha e
pesquisador no Supercomputing Center de Barcelona, que conta com um dos
supercomputadores mais potentes da Europa. Desde que em 1950 Alan Turing
(um dos pais da computação) propôs o chamado teste de Turing, uma prova
de habilidade na qual uma máquina deveria ter a capacidade de
apresentar um comportamento inteligente ou indistinguível do de um ser
humano, esta se transformou na meta e motivação de muitos matemáticos,
cientistas e inventores. Para Cortés, “o teste de Turing já foi superado
com computadores como o Watson da IBM, que em 2011 arrasou no concurso
televisivo estadunidense Jeopardy”. Watson teve, até mesmo, tempo para
contar piadas, com o que demonstrou sua inteligência para além de um
código escrito por engenheiros.
Kurzweil diz que alcançaremos o que batizou como “singularidade
tecnológica” no ano 2045: o hipotético momento em que as máquinas
adquiram inteligência artificial geral e possam melhorar a si mesmas e
sucessivamente criar computadores melhores que elas mesmas. Cada vez são
mais comuns na comunidade científica termos como “trans-humanismo” e
“pós-humanismo”, em que o uso da tecnologia é essencial para melhorar a
condição humana e equipará-la em qualidades intelectuais à de uma
possível inteligência artificial.
Nem todos os cientistas acreditam que alcançar a singularidade seja uma grande ideia sem ter um plano ou uma base ética para controlá-la. Hugo de Garis, em sua teoria The Artilect War (artilect
vem de intelectos artificiais), assume que antes de o século XXI acabar
haverá uma grande guerra na qual as máquinas decidirão eliminar-nos. E
explica isso com base em uma analogia: que elas poderiam começar a nos
ver como uma simples formiga para esmagarem. Em uma palestra do TED, o
filósofo Nick Bostrom explicava que não concebe nenhum cenário no qual
possamos controlar uma IA e sugeria que estabelecêssemos uma série de
valores para que as máquinas cresçam com eles.
O plano de Kurzweil é simples, ir além da condição humana e fundir
nossas capacidades com as de um computador. Só assim poderíamos evitar
que surja algo como a Skynet, a rede ficcional que construiu Terminator.
A artista e pesquisadora Cathrine Kramer pensa que “deveríamos ater-nos
às três leis da robótica de Asimov: um robô nunca fará mal (ou
permitirá que se faça mal) a um ser humano; um robô deve obedecer às
ordens de um ser humano (exceto se essas ordens contradizerem a primeira
lei); e um robô deve proteger a própria existência (desde que respeite
as duas leis anteriores). Como se viu com os drones, já estamos violando
essas regras, mas espero que nos próximos 20 anos definamos um marco
legal para regular o que um robô pode e o que não pode fazer”.
"Temos que fundir nossas capacidades com as de um computador, só assim poderemos evitar que surja algo como a Skynet"
O que resta de nossa natureza em tudo isso? Deveríamos pôr limites na
modificação de nossos corpos, nossas mentes, nossas vidas cotidianas?
Cathrine Kramer acha que por mais que os cientistas insistam, nossos
corpos envelhecerão e morrerão. “Por mais que consigamos trasladá-lo a
uma rede neural artificial, conseguiremos de verdade considerar isso
vida? Talvez o próximo passo lógico seja um corpo suplente”. Kramer é a
curadora da exposição + Humanos (até o dia 10 de abril no CCCB de
Barcelona), que nos situa no futuro da espécie a partir de uma
perspectiva artística.
O mais impactante visualmente que vimos na arte recente provém do
Google, de Deep Dream, uma IA precoce que cria arte por si mesma. O
projeto inicialmente alimentava redes neurais artificiais com milhões de
imagens para serem interpretadas e classificadas, com a ideia de que
pudessem representar sua ideia de.... por exemplo, uma banana. Mas
quando essas redes neurais eram nutridas de imagens arbitrárias e se
pedia que realçassem tudo o que viam, os resultados eram alterações
ultrapsicodélicas das imagens. Como no tempo em que éramos crianças e
brincávamos de ver formas e animais nas nuvens. Claro, Deep Dream vê
muitos “cachorros-pássaro’, já que a maioria das imagens que conhece são
do reino animal. Os engenheiros do Google batizaram essa técnica como inceptionism, um movimento artístico criado por uma IA.
2016 é o ano em que enfim poderemos comprar os óculos Oculus Rift e o
Morpheus, o passo definitivo para entrar nesse mundo de realidade
virtual (VR) que nos atrai. Segundo um estudo da Statista, em 2018
haverá 171 milhões de pessoas que os terão integrado no seu dia-a-dia.
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FONTE: http://brasil.elpais.com/brasil/2015/12/30/ciencia/1451492115_324965.html
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