Pesquisador de Princeton sugere que vitalidade das
instituições é o ponto forte do Brasil. Filósofo de Stanford sublinha
que melhorar a qualidade dos serviços públicos é fundamental.
Especialista brasileiro diz que, se o governo fizer algumas reformas, a
recuperação da economia começa em dois meses
Três entrevistas publicadas na “Exame” (duas) e na “Época” (uma)
contribuem para entender o Brasil. A publicação do Grupo Globo ouviu o
economista Armínio Fraga, doutor por Princeton, uma das mais
prestigiosas americanas. A revista da Editora Abril dialogou com o
cientista político e filósofo Francis Fukuyama, professor de Stanford,
listada entre as cinco mais importantes unidades de ensino superior dos
Estados Unidos, e com o economista Dani Rodrik, pesquisador de Princeton
e ex-professor de Harvard.
Análise de Dani Rodrik
Autor do livro “As Regras da Economia” (apresentado como brilhante
pela “The Economist”), Dani Rodrik sublinha que os economistas não
escapam aos modismos e tendem, por vezes, a confundir o quadro real com o
matiz ideológico. O scholar turco-americano diz que não há “apenas um
modo correto de encarar problemas econômicos. Em certo casos, é
necessário recorrer a mecanismos como a substituição de importações. Em
outros é preciso recorrer aos incentivos ao mercado e ao investimento
privado”.
Perguntado sobre a corrupção no Brasil, Dani Rodrik frisa: “A
sensação é que a lei é aplicada com mais rigor no Brasil do que em
outros países emergentes. Quando a turbulência passar, o Brasil estará
em uma posição muito melhor do que a maioria dos emergentes no caminho
para se tornar uma economia avançada. E acho que o mercado financeiro
internacional não está reconhecendo essa vantagem. (…) A China teve um
crescimento espetacular, mas não fortaleceu suas instituições judiciais.
Como pode haver uma economia avançada onde há dúvidas sobre as regras
que protegem a atividade intelectual? A China ainda enfrentará problemas
graves de desinteresse do capital privado estrangeiro devido a esse
tipo de incerteza. E o Brasil está equacionando essa questão”.
Sobre o crescimento da economia, Dani Rodrik analisa: “Nas últimas
décadas, o crescimento veio de uma combinação entre um boom nos preços
dos recursos naturais e altos fluxos de investimentos estrangeiro.
Nenhuma dessas duas coisas oferece uma fonte de crescimento sustentável.
Eu creio piamente que países bem administrados vão continuar seu
caminho de desenvolvimento”.
O economista frisa que o Brasil, como outros países, tem de ficar
atento ao fenômeno da desindustrialização prematura, que é resultado da
divisão internacional do trabalho e das mudanças tecnológicas. “Esse
fenômeno limita o crescimento de muitos países emergentes, como o
Brasil. Principalmente porque essa tendência de longo prazo foi
combinada com uma mais pontual, que é a elevação do preço das
commodities, algo que certamente acelerou a desindustrialização.”
Se a desindustrialização é irreversível, como conclui Dani Rodrik, é
possível buscar o crescimento acelerado nos próximos anos? Para crescer,
de maneira estável, será preciso fazer “investimentos em capital
humano, em melhoria das instituições e com cumprimento das leis. A
partir de agora, só será possível crescer melhorando os fundamentos. E
isso não produz milagre econômico, mas permite que um país cresça de
forma consistente, com aumentos no PIB per capita de mais ou menos 3% ao
ano”.
Sobre incentivos fiscais e financeiros, como os concedidos pelo BNDES
ao grupo JBS — que alguns chamam de a mais estatal das empresas
privadas do Brasil —, Dani Rodrik ressalta: “É um erro pensar que
política industrial é apenas conceder subsídios. É muito melhor buscar
as necessidades urgentes e específicas de cada setor. Essas demandas
podem estar no campo financeiro, mas podem ser relativas à
infraestrutura, à falta de mão de obra qualificada ou a aspectos das
leis trabalhistas. O segredo é estabelecer um diálogo constante entre o
governo e a indústria. Já a questão fiscal vai muito além disso. Os
governos deveriam aprender a perseguir superávits primários maiores
durante períodos de alto crescimento para criar uma reserva que permita
mais gastos em períodos de baixo crescimento. Não apertar a política
fiscal quando os ventos estão soprando a favor é um erro muito comum
entre os países emergentes. Mas, como se vê hoje, ele pode custar caro”.
O grupo de Dilma Rousseff ouve este tipo de orientação? Não parece. A
entrevista foi concedida ao repórter Daniel Barros
Análise de Francis Fukuyama
O cientista político e filósofo Francis Fukuyama se tornou célebre
graças ao livro “O Fim da História e o Último Homem”, no qual celebra a
vitória “final” do liberalismo sobre o socialismo. A queda do
socialismo, a partir de 1989, levou-o a concluir que o liberalismo havia
vencido em definitivo. Acabou muito criticado pela tese, e não só pela
esquerda. Mas continua influente e seu último livro, “Ordem Política e
Decadência Política”, será publicado este ano no Brasil, conta o
repórter Eduardo Salgado, da “Exame”.
Fukuyama postula que “os países precisam ter um governo com algum
nível de qualidade para que possam ficar ricos. Mas nenhum país começou
sua escalada com ótimos governos já estabelecidos. (…) O caso dos
Estados Unidos é emblemático. No século 19, o país tinha um governo
bastante corrupto do alto ao baixo escalão, o clientelismo era a regra, a
prestação de serviços era ruim porque sofria muita influência política.
(…) À medida que se tornou mais rico, conseguiu reformar o Estado e
diminuir a corrupção na primeira metade do século 20”.
O Brasil é um “caso interessante”, afirma Fukuyama. “É um país que
está ficando rico e tem as condições necessárias para que haja uma
elevação na qualidade da gestão estatal. A classe média tem crescido, e
isto aumenta a demanda por um Estado mais eficiente. Diria que o Brasil
atualmente está no mesmo estágio que os Estados Unidos estavam no fim do
século 19. O Brasil se industrializou, promoveu mudanças na área
social, mas isso tudo ainda não resultou numa ampla reforma do setor
público. O que divide o mundo… são cleptocracia e países com governos
que servem ao bem-comum. (…) A qualidade dos serviços públicos é o
grande tema da atualidade.”
Uma resposta de Fukuyama tem muito a ver com o Brasil e com Goiás (no
momento em que setores corporativos resistem, de maneira quase insana, à
implantação de organizações sociais na gestão das escolas públicas do
governo do Estado): “As pessoas resistem muito a prestar contas do que
fazem. Isso é marcante em funcionários públicos de todas as partes do
mundo. Eles abominam a ideia de ter metas e de ser punidos por não
conseguir atingi-las. Os sindicatos são contra as tentativas de criar
bônus por performance. Lutam pela segurança do emprego sem conexão com a
realidade do serviço. É por isso que as reformas da burocracia quase
sempre envolvem brigas com os sindicatos. Para elevar a eficiência do
Estado, os governos precisam separar os funcionários que trabalham muito
e são competentes dos preguiçosos e descomprometidos”.
Análise de Armínio Fraga
Ex-presidente do Banco Central e ex-golden boy de George Soros,
Armínio Fraga concedeu entrevista a Samantha Lima, na qual diz que, “se
em dois meses forem sinalizados ao menos alguns pontos, como idade
mínima para aposentadoria, desvinculação do salário mínimo na
Previdência, reformas do ICMS e do PIS/Cofins — que estão bem desenhadas
—, enfim, se o governo mostrar esforço em pôr em prática tais medidas, o
clima muda e a recuperação começa”.
Sobre o Banco Central, Armínio Fraga assinala: “O BC passou um tempão
remando num direção, e a política creditícia remando na direção
contrária. Um modelo disfuncional. Esquizofrênico. Não dá certo. É muito
difícil um banco central fazer seu trabalho sem o governo ter o mínimo
de solidez fiscal. Estamos falando de algo que precisa acontecer para o
Brasil ter juros normais sem inflação. Isso, o BC não consegue fazer
sozinho”.
De que o país precisa? “No momento, o país precisa mesmo é de uma
grande reforma do Estado, incluindo uma clara e estrutural correção de
rumo na área fiscal. Nesse meio-tempo, o BC faz sua parte, muito
prejudicado pelo resto do governo”, destaca Armínio Fraga.
A repórter pergunta: “Dá para retomar o crescimento sem
investimentos, só pelo consumo?” Armínio Fraga explica sua posição:
“Não. Não tem mágica. Nenhuma economia vive sem crédito nem expectativa
de demanda, mas isso está longe de ser suficiente. Falta o lado do
investimento e da produtividade”.
Dá para acreditar no Brasil, em sua recuperação. Armínio Fraga afirma
que recomprou a Gávea Investimentos, do banco JP Morgan, porque põe fé
no país. “Se tivéssemos desistido do Brasil, não teríamos comprado.”
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FONTE: http://www.jornalopcao.com.br/editorial/ideias-de-dani-rodrik-francis-fukuyama-e-arminio-fraga-para-melhorar-o-governo-de-dilma-rousseff-57120/
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