segunda-feira, 24 de maio de 2021

BYUNG-CHUL HAN - O TEMPO DA FESTA

                                                                  Byung-Chul Han*


              Hoje em dia, as coisas ligadas ao tempo envelhecem muito mais rápido do que antes. Elas decaem rapidamente naquilo que é passado e fogem à atenção. O presente se reduz à ponta da atualidade. Assim, o mundo perde algo de sua duração. A causa do encolhimento do presente não é, como se assume equivocadamente, a aceleração. Antes o tempo, como uma avalanche, lança-se adiante, porque ele não tem mais parada. Aqueles pontos do presente entre os quais não existiria nenhuma força gravitacional e nenhuma tensão, pois são meramente aditivos, desencadeiam a ruptura do tempo, o que conduz ao aceleramento sem direção e sem sentido.

              Quem é depressivo não é capaz de uma conclusão. Sem conclusão, porém, tudo se dissipa. Não se forma nenhum autorretrato estável, o que seria, igualmente, uma forma de conclusão. Não por acaso, a indecisividade, a incapacidade para es-colha (Ent-Schluss) é sintomática a depressão. A depressão é característica de um tempo no qual se perdeu a capacidade de concluir (schliessen) e encerrar (abzuschliessen). Também o pensamento pressupõe a capacidade de concluir, de se deter, de se demorar. Nisso, ele se distingue do cálculo. Assim, em oposição ao cálculo, o pensamento não se deixa acelerar tanto quanto se queira. Pertence aos sintomas da Síndrome de Fadiga por informação (IFS), ou seja, o cansaço de informação, a incapacidade de pensar analiticamente. Ela é a incapacidade de concluir [schliessen] e inferir [schlussfolgern]. A massa de informação que se acelera sufoca, então, o pensamento. Também o pensamento carece de um silêncio. É preciso poder fechar os olhos.

              O sujeito do desempenho é incapaz de chegar a uma conclusão. Ele se despedaça sob a coação de sempre ter de produzir mais desempenho. Precisamente essa incapacidade de chegar a uma conclusão e de encerrar conduz ao Burnout. E, em um mundo no qual a conclusão e o encerramento dão lugar a um avanço sem fim e sem direção, não é possível morrer, pois também o morrer pressupõe a capacidade de encerrar a vida. Quem não consegue morrer no tempo certo tem de a-cabar (ver-enden) em uma hora inoportuna (Unzeit).

              O tempo da festa não é um tempo de relaxamento ou da recuperação. A festa é, ela mesma, uma forma de conclusão. Ela deixa que um tempo inteiramente outro comece. (...) O tempo da festa é diametralmente oposto ao tempo de trabalho.

              (...)

              A sociedade do cansaço atual faz o próprio tempo de refém. Ela o acorrenta ao trabalho e o transforma em tempo de trabalho. O tempo do trabalho é um tempo sem conclusão, sem início e sem fim. Ele não exala [nenhum aroma]. A pausa não marca, como pausa do trabalho, um outro tempo. Ela é apenas uma fase do tempo de trabalho. Hoje, não temos nenhum outro tempo senão o tempo do trabalho. O tempo do trabalho se totaliza como o tempo. Perdemos há muito tempo o tempo da festa. O fim do expediente como véspera do dia festivo nos é inteiramente estranho. Trazemos o tempo do trabalho não apenas nas férias, mas também no sono. Por isso dormimos tão inquietamente hoje. Também o relaxamento é apenas uma modificação do trabalho, na medida em que serve para a regeneração da força de trabalho. A recuperação não é o outro do trabalho, mas o seu produto. Também apenas a desaceleração ou lentidão não podem gerar um outro tempo. Ela é, igualmente, uma consequência do tempo de trabalho acelerado. Ela apenas desacelera o tempo de trabalho, em vez de transformá-lo em um outro tempo. (...) A desaceleração não elimina a crise temporal, sim a doença temporal atual. A desaceleração não surte nenhuma cura. Antes, ela é apenas um sintoma. Não se pode curar a doença com o sintoma. Hoje, é necessária uma revolução temporal, que gere um outro tempo, o tempo do outro, que não é um tempo do trabalho, uma revolução temporal que traga de volta para o tempo o seu aroma.

HAN, Byung-Chul . Favor fechar os olhos: em busca de outro tempo. Petrópolis, RJ: Vozes, 2021, pg. 25 a 30.

* Filósofo nascido na Coreia e fixado na Alemanha. Professor de Filosofia e Estudos Culturais na Universidade de Berlim. 

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