Com um entusiasmo nato, fala apaixonadamente sobre os estilos de liderança e a relação entre a personalidade e o sucesso. Há alguns anos, a Business Strategy Review considerou-o um dos maiores pensadores na área dos negócios. Autor de dez livros, vários artigos académicos e docente na Faculdade de Gestão de Desautels, da Universidade McGill, em Montreal, no Canadá, e também no Green Templeton College, da Universidade de Oxford, no Reino Unido, o seu nome está associado a programas de MBA e à formação de executivos. Aos 65 anos, é colaborador da Forbes e, no podcast The CEO Series, aborda questões estratégicas com líderes de topo. Minutos antes da entrevista, tinha feito uma palestra online na Tesla sobre o tema que dá nome ao seu novo livro, We’re All Ambiverts Now (Agora Somos Todos Ambivertidos), ou a vantagem de incorporar os pontos fortes da introversão e da extroversão no paradigma emergente na liderança corporativa.
Assume-se como um extrovertido e estudou os líderes introvertidos. Isso mudou-o?
Sim,
porque fui ajustando a minha personalidade aos três sítios onde vivi:
Canadá, Estados Unidos da América e Inglaterra. Quando vou a Los
Angeles, sou menos ruidoso do que quando estou em Nova Iorque. Em
Oxford, sou mais silencioso e sarcástico. Passei algum tempo a trabalhar
no Sudeste Asiático e dei-me conta de que, no Japão, as pessoas são
mais introvertidas, mas na Tailândia assumem características mais
expansivas. A minha mãe é finlandesa e tenho até uma piada sobre isso:
“Como distingue um finlandês introvertido de um extrovertido, durante
uma conversa? O primeiro olha para os sapatos dele, o outro olha para os
seus sapatos!”
O que revelaram os seus estudos sobre estilos de personalidade e sucesso?
Foi decisivo para mim ter lido o livro de Susan Cain [Silêncio – O Poder Dos Introvertidos Num Mundo Que Não Para de Falar]
e trabalharmos juntos. Ao medir a percentagem de pessoas extrovertidas e
introvertidas, encontramos uma curva de Bell, em que os mais reservados
e os mais expansivos se encontram nas extremidades e, no centro
superior da distribuição, situam-se as pessoas com características
mistas. Apurei, junto de executivos a quem dava formação que, embora se
definissem como introvertidos, adotavam uma postura entusiasta e
amigável no contexto empresarial. Faziam-no por se terem dado conta de
que não era boa ideia cruzarem-se com os colaboradores sem lhes
dirigirem a palavra, correndo o risco de estes ficarem com a impressão
errada: a de não estarem a ter um bom desempenho ou, pior do que isso,
reagirem excessivamente a essa ausência de contacto, temendo serem
dispensáveis, com prejuízo da sua motivação.
Tem-se valorizado excessivamente a imagem do líder carismático e extrovertido?
Quando
eu era mais novo, ser um bom líder era sinónimo de ser orientado para o
exterior, mas hoje já se reconhecem outros estilos de liderança. Hoje,
uma liderança de sucesso aposta na diversidade porque as circunstâncias
nos encaminham nesse sentido. Os empregadores ganham mais em ir ao
encontro dos colaboradores e dos seus modos de funcionamento, pois é
dessa forma que as equipas podem dar o seu melhor à empresa. Sendo um
extrovertido nato, tenho vantagens em adotar a postura complementar, ou
não dominante, e ouvir mais em vez de falar, alternando entre estas duas
formas de expressão.
Como chegou ao conceito de ambiversão?
Entrevistei
mais de 400 executivos seniores do mundo corporativo, detentores de
cargos como CEO, CFO e COO, a chamada C-Suite, que ocupa o topo da
pirâmide, e descobri que um terço deles pertencia a esta categoria. No
final, concluí que 20% deles eram ambivertidos genuínos, reunindo
características de personalidade comuns aos dois extremos do eixo
extroversão/introversão.
Um pouco como ser ambidextro, uma característica natural, mas passível de treino?
Sim,
é essa a raiz do termo. Dou-lhe um exemplo: jogo ténis e uso o braço
direito para manusear a raquete, mas uso o esquerdo no basebol. Uma
pessoa genuinamente ambidextra pode fazê-lo das duas formas, apesar de a
maioria das pessoas ter um lado dominante, no universo desportivo ou
noutros campos.
Com a pandemia, o que mudou na perceção da eficácia dos perfis de liderança?
Dou
formação a executivos e tenho um programa de rádio onde falamos sobre
gestão estratégica e tendências de liderança. Desde o início da pandemia
temos vindo a constatar que não sabemos o que fazer porque nenhum de
nós testemunhou isto antes, é algo completamente novo. O estilo de
liderança introvertido pode fazer mais sentido durante esta fase porque
permite ouvir os colaboradores, e obter mais dados numa altura em que
não há respostas e é preciso encontrá-las.
Porque considera que é vantajoso cultivar traços de personalidade híbridos?
Um
bom líder deve inspirar, como é próprio dos extrovertidos, mas também
precisa de estar disponível para ouvir, sem se precipitar a agir,
qualidades associadas à introversão. Pode contrapor e dizer “eu sou como
sou” porque se desgasta a agir de formas que não lhe são intrínsecas.
Ouvir é algo que cansa e requer energia. No meu caso, depois de estar
duas horas a trabalhar sozinho, fico esgotado e tenho de sair para
recarregar baterias a falar com pessoas. Durante o confinamento, senti
falta de estimulação e tive de sair à rua só para ver pessoas. Já a
minha mulher, que é introvertida e professora do Ensino Básico, chegava a
casa exausta e, após um dia de estimulação, apenas queria estar
sossegada em casa a conviver com o marido e a filha.
Curiosamente, é mais complicado se forem semelhantes. Imagine que ambos são como eu: é de dar em doido! Aconteceu-me com uma parlamentar tão extrovertida como eu. Estávamos à mesa e falávamos incessantemente. A certa altura, vieram perguntar-nos se estávamos bem, porque dávamos a impressão de ser um casal que não devia estar casado. Ao fim de uma hora naquele frenesi, em busca de atenção, ocorreu-nos um pensamento: “Quando é que te calas?” Não é por acaso que escolhemos introvertidos para parceiros.
Quando não se é naturalmente ambivertido, é possível treinar-se nesse sentido?
Sim,
aprende-se. Um líder experiente sabe que deve comportar-se como um
ambivertido para ser eficaz: alternar entre ser o centro das atenções e
saber ficar na retaguarda, dando espaço ao outro. Como se diz na gíria,
agir “como se” até conseguir fazê-lo naturalmente (“fake it until you make it”). O segredo está em não atingir o ponto da exaustão, fazendo intervalos para recarregar energias.
O que destaca da colaboração com Henry Mintzberg (professor de gestão no M.I.T.)?
Trabalhámos
durante duas décadas e o seu modelo de estratégia acabou por vingar
face ao de Michael Porter: num mundo em mudança, a estratégia que parte
do topo da pirâmide para a base faz menos sentido do que aquela que
emerge a partir da linha da frente, junto das bases e dos clientes. Se
pensar no lockdown, com a maioria a trabalhar a partir de casa e
tudo a acontecer ao mesmo tempo nesse espaço, esse cenário obrigou-nos,
a todos, a aprender à medida, a partir de referenciais distintos
daqueles que foram criados pelas estruturas de topo.
Pode falar-se em crise de liderança na gestão das vacinas contra a Covid-19?
É
um desafio difícil, dadas as várias mudanças em curso a nível global,
seja nas regras aplicadas ao uso das máscaras, nas vacinas ou nos
critérios de vacinação. Por vezes, o mundo precisa de uma liderança
silenciosa, confiante e disponível para aprender, que escuta os outros
antes de tomar decisões. É o caso da primeira-ministra da Nova Zelândia.
Qual é o modelo de liderança que mais se adequa aos tempos em que vivemos?
Um
mundo estável favorece quem é confiante na ribalta, age com rapidez e
motiva pessoas numa direção. Num mundo incerto, a liderança silenciosa,
que privilegia o contacto um a um e reflete antes de tomar decisões,
tende a ser a mais saudável. Num evento corporativo, o líder
extrovertido pode andar de mesa em mesa e trocar impressões sem grande
substância durante dois ou três minutos, enquanto o líder introvertido
fala com quatro ou cinco pessoas, à vez, durante 20 minutos, fazendo
perguntas e ouvindo o que a pessoa tem a dizer. No final, fica-se
rendido ao charme do primeiro, mas guarda-se uma impressão mais profunda
daquele que nos dedicou tempo e atenção e com quem se partilharam
ideias.
Colocar todos os esforços na adaptação limita as valências individuais nas equipas?
Se
queremos assumir posições de liderança em tempos incertos, temos de
aprender uns com os outros. Numa equipa é preciso ter pessoas com
competências diversas: umas capazes de captar novas ideias, outras que
estejam disponíveis para aprender e outras entusiastas, que consigam
inspirar e mobilizar outros para seguir em frente.
A organização do trabalho voltará a ser como a víamos antes?
Entrevistei
60 CEO e uma das perguntas era sobre o futuro do trabalho. O modelo
híbrido é aquele que colhe mais adeptos: ir ao local de trabalho durante
três ou quatro dias da semana e o resto do tempo ser em teletrabalho,
para poupar tempo em deslocações e estar mais tempo com a família. Mesmo
que trabalhe via Zoom com os clientes atuais, é preciso fazer viagens,
ir ao encontro dos clientes potenciais, tomar uma refeição com eles e
identificar necessidades a fim de fazer negócios. Há ainda o desejo de
socializar com aqueles que fazem parte da cultura organizacional, o que é
difícil de fazer remotamente. Há quem se tenha acostumado às rotinas
criadas entretanto, mas a maioria está preparada para retomar os ritmos
que tinha antes e, porventura, com mais flexibilidade.
Quais são os pontos fortes em que os gestores devem apostar para ter sucesso?
O
caminho é seguir a tendência natural e conciliá-la com as exigências do
ramo em que operam e das especificidades do trabalho exigido. Dou-lhe
um exemplo: as novas gerações são mais dotadas de competências digitais e
estão bem sintonizadas com aspetos de natureza social, como o movimento
Black Lives Matter ou as questões de género, acabando por ser mentoras
nessas áreas, o que não acontecia há 30 anos. Os seniores devem ter isso
em conta, adotar uma postura humilde e aprender com os mais novos.
Existem cuidados a ter no uso dado aos testes de personalidade, nas empresas?
Há
um ditado que diz: “Se tens um martelo, vês pregos em todo o lado.”
Quero dizer com isto que é sensato ter mais do que um instrumento para
avaliar o que quer que seja. Eu tenho-me centrado no eixo da
introversão/extroversão, um dos fatores do Big Five, o teste de
personalidade mais usado no meio empresarial. Posso olhar para uma
pessoa sob esse prisma, mas reconheço que os seres humanos são complexos
e que não se resumem ao resultado de um teste, razão pela qual não
devemos apoiar-nos exclusivamente nele para defini-los,
independentemente da finalidade a que se destina.
Se tiver de recrutar pessoas para uma equipa, qual a estratégia que vai adotar?
Enquanto
gestor, tenho uma abordagem diferenciada e procuro ir ao encontro da
personalidade dos colaboradores. Na minha equipa, aprecio o valor das
pessoas introvertidas porque compensam os meus pontos fracos.
Afirma que existem 40% de introvertidos, 40% de extrovertidos
e 20% que possuem as duas características, os ambivertidos. Onde se
situam os grandes líderes?
Uma vez falei com um repórter
sénior sobre isso e obtive uma resposta interessante: a maioria dos
líderes mundiais tende para a introversão. Richard Nixon, Barack Obama e
Joe Biden caem na categoria dos introvertidos, tal como o primeiro
George Bush. O segundo George Bush fica, provavelmente, no grupo dos
ambivertidos e Clinton é, sem dúvida, um extrovertido. Porém, a maioria
acaba por comportar-se extrovertidamente, pois quando entra em qualquer
lado é o centro das atenções e tem de agir à altura das circunstâncias e
do que se espera dela no exercício do cargo.
Fonte: https://visao.sapo.pt/ideias/2021-05-16-por-vezes-o-mundo-precisa-de-uma-lideranca-silenciosa-confiante-e-disponivel-para-aprender-que-escuta-os-outros-antes-de-tomar-decisoes/
Nenhum comentário:
Postar um comentário