Luis Fernando Verissimo*
Antigamente as bolas tinham a cor do couro com que eram
feitas. Bolas pintadas de branco só no vôlei ou em jogos de futebol
noturnos. Usavam uma bola por jogo de futebol oficial, de campeonato. O
que me fazia sonhar com montes de bola usadas uma só vez estocadas em
algum lugar, uma visão do paraíso. A bola única só podia ser
substituída, com autorização do juiz, em caso de perda de esfericidade,
que era o nome científico de murchamento.
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Quando a bola espirrava para fora do campo, era devolvida pelo
público para que o jogo continuasse. Talvez nada na nossa história
recente tenha a importância simbólica deste fato: no tempo da Número 5
cor de couro a torcida devolvia a bola. Se a bola demorasse a voltar
para o campo havia manifestações de impaciência do resto da torcida e
quem retinha a bola era hostilizado. Não se sabe se a torcida passou a
ficar com a bola quando começaram a usar várias por partida ou se foi
algo no nosso caráter que mudou. Há quem atribua a uma reversão dos
polos magnéticos da Terra lá pelos anos 40 e 50 a deteriorização do
caráter do brasileiro. Não sei, mas uma das suas primeiras manifestações
foi não devolverem mais a bola.
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A bola era branca em jogo noturno porque ajudava a visibilidade, com a
iluminação artificial. Depois se deram conta de que o branco também
favoreceria a visibilidade de dia, pois seu contraste com o verde do
gramado era maior do que o do marrom. Agora as bolas já não são mais
brancas. Tem tantos desenhos e grafismos que mal se vê o branco. Algumas
bolas novas são marrons. Mas não o marrom das antigas bolas de couro.
Um amarelo cocô-de-criança. Os goleiros estão se queixando de que ela é
mais difícil de pegar, mas talvez estejam só com nojo. E o contraste com
o verde decididamente piorou.
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Teoria: pelo menos no Brasil, o futebol foi ficando mais feio à
medida que a bola ficava mais bonita, Hoje quem mais brilha nos gramados
é a bola e o jogador brasileiro está com ciúmes, o que explicaria a
forma como a maltrata. Seria o caso de voltarmos ao branco básico ou
então ao ainda mais básico, o marrom/couro. Ou então - por que não? - à
bola com tento e cordeamento, para o futebol reaparecer. Ou então eu é
que fiquei tão inconformado com a nossa derrota para o Mexico nas
Olimpíadas que estou delirando.
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Marisa Monte cantando Villa Lobos, Sorriso o Gari sambando e no fim o
Pele aparecendo para ser ovacionado. Estava bem representado o Brasil
que as pessoas esperam ver em 2016 no encerramento das Olimpíadas de
2012? Levando-se em conta que o tempo para sua apresentação era escasso,
o resumo foi bem escolhido. Já o resto da festa de encerramento foi
ainda mais maluca do que a festa de inauguração, com os ingleses
recorrendo a todos os clichês conhecidos a seu próprio respeito e ainda
ressuscitando o John Lennon, o Fred Mercury, o Churchill e as Spice
Girls.
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* Cronista. Escritor gaúcho.
Fonte: Estadão on line, 19/08/2012
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