sexta-feira, 23 de março de 2012

As vantagens do bilinguismo

Estudo sugere que a experiência bilíngue melhora funções do cérebro como ignorar distrações, mudar o foco e manter informações na mente

Falar duas línguas ao invés de apenas uma tem benefícios práticos óbvios em um mundo cada vez mais globalizado. Mas nos últimos anos, os cientistas começaram a mostrar que as vantagens do bilinguismo são ainda mais fundamentais do que poder conversar com uma gama maior de pessoas. Ser bilíngue, ao que parece, torna você mais inteligente. Falar mais de um idioma pode ter um efeito profundo em seu cérebro, melhorar as habilidades cognitivas não relacionadas à linguagem e até mesmo proteger contra a demência na velhice.
Este ponto de vista do bilinguismo é notavelmente diferente da compreensão do século XX. Pesquisadores, educadores e formuladores de políticas consideravam o aprendizado de uma segunda língua uma interferência, cognitivamente falando, que impedia o desenvolvimento acadêmico e intelectual de uma criança.
Eles não estavam errados sobre a interferência: há ampla evidência de que o cérebro de uma pessoa bilingue ativa ambos os sistemas, mesmo quando ele está usando apenas uma língua, criando assim situações em que um sistema obstrui o outro. No entanto, de acordo com pesquisadores, esse tipo de interferência não é tanto uma desvantagem, mas uma bênção disfarçada, pois força o cérebro a resolver o conflito interno, dando à mente um treino que fortalece suas habilidades cognitivas.

Pesquisas
Bilíngues, por exemplo, parecem ser mais hábeis que os monolíngues em resolver certos tipos de quebra-cabeças mentais. Em um estudo, realizado em 2004 pelas psicólogas Ellen Bialystok e Michelee Martin-Rhee, crianças bilíngues e monolíngues em idade pré-escolar foram convidadas a classificar círculos azuis e quadrados vermelhos apresentados na tela do computador em suas caixas digitais, uma marcada com um quadrado azul e outra com um círculo vermelho.
Na primeira tarefa as crianças tiveram que classificar as formas, colocando círculos azuis na caixa marcada com os quadrados e os quadrados na caixa com círculo. Ambos os grupos fizeram isso com facilidade. Em seguida, as crianças foram solicitadas a classificar por tamanho, o que foi mais difícil porque era necessário colocar as imagens em um escaninho marcado com uma cor conflitante. Os bilíngues foram mais rápidos na execução dessa tarefa.
A prova coletiva do estudo sugere que a experiência bilíngue melhora a função do chamado “cérebro executivo” – um sistema de comando que direciona os processos de atenção que nós usamos para planejar, resolver problemas e executar várias outras tarefas mentalmente mais exigentes. Estes processos incluem: ignorar devios de atenção para manter o foco, mudar a atenção deliberadamente de uma coisa para outra e manter informações em mente – como lembrar uma sequência de direções enquanto estiver dirigindo.
Por que a disputa entre dois sistemas de linguagem ativos simultaneamente melhora esses aspectos da cognição? Até então, os investigadores pensaram que a vantagem bilíngue era resultado, principalmente, de uma capacidade de inibição, de suprimir, que foi aperfeiçoado pelo exercício de um sistema de linguagem: esta supressão, pensava-se, iria ajudar a treinar a mente bilíngue para ignorar distrações em outros contextos. Mas esta explicação cada vez mais parece ser inadequada, uma vez que estudos têm mostrado que o desempenho dos bilíngues é melhor do que os dos monolíngues mesmo em tarefas que não requerem a inibição, como passar uma linha através de uma série de números ascendentes dispersos aleatoriamente em uma página.

Adaptação e controle
A principal diferença entre bilíngues e monolíngues pode ser mais básica: a capacidade de monitorar o ambiente. “Bilíngues têm que mudar de idioma, muitas vezes – você pode conversar com seu pai em uma linguagem e sua mãe em outro idioma”, diz Albert Costa, pesquisador da Universidade de Pompeu Fabra, na Espanha. “É preciso manter o controle das mudanças ao seu redor”. Em um estudo comparando bilíngues alemão-italiano, com monolíngues italianos em tarefas de monitoramento, Costa e seus colegas descobriram que os indivíduos bilíngues não só tinham um desempenho melhor, como também fizeram o mesmo com menos atividades em regiões do cérebro envolvidas na vigilância, indicando mais eficiência para isso.
A experiência bilíngue parece influenciar o cérebro desde a infância até a velhice (e não há razão para acreditar que ela pode também se aplicar àqueles que aprendem uma segunda língua mais tarde na vida).
Em um estudo de 2009 conduzido por Kovacs Agnes, da Escola Internacional de Estudos Avançados, em Trieste, na Itália, bebês expostos a duas línguas desde o nascimento foram comparados com outros que tiveram contato apenas com uma língua. Em um conjunto inicial de ensaios, os bebês foram apresentados a um áudio e, em seguida, um boneco de um lado de uma tela. Ambos os grupos infantis aprenderam a olhar para o lado da tela após o som, em antecipação ao fantoche. Mas quando o boneco começou a aparecer do lado oposto da tela, os bebês expostos a um ambiente bilíngue aprenderam rapidamente a mudar o seu olhar para a nova direção, enquanto os outros bebês não.
Os efeitos do bilinguismo também se estendem até a velhice. Em um estudo recente com 44 idosos bilíngues em espanhol-inglês, os cientistas liderados pelo neuropsicólogo Tamar Gollan, da Universidade da Califórnia, San Diego, descobriram que os indivíduos com maior grau de bilinguismo – medido através de uma avaliação comparativa de proficiência em cada idioma– eram mais resistentes do que os outros idosos para o aparecimento de demência e outros sintomas da doença de Alzheimer: quanto maior o grau de bilinguismo, mais resistência aos sintomas.
Ninguém nunca duvidou do poder da linguagem. Mas quem teria imaginado que as palavras que ouvimos e as frases que falamos podem estar deixando uma marca profunda?
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 http://opiniaoenoticia.com.br/23/03/2012

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