Dalane Santos*
Algumas habilidades humanas, tais como a música, são tratadas como
dons: alguns parecem “ter nascido para a música”. No entanto, tarefas
como andar e falar são comuns a todas as pessoas saudáveis, todos fomos
“nascidos para andar” ou para falar. Será que é possível incluir a
tendência de crer em Deus em um destes dois grupos? Acreditar em uma
divindade é algo que vem naturalmente com o ser humano ou não?
Um autor norte-americano, Justin Barrett, acredita que sim. Ao
analisar pesquisas antropológicas de várias universidades americanas,
ele defende que quase todos nós nascemos naturalmente “crentes em Deus”.
Isso significa que, usando a lógica do andar ou falar, estamos
naturalizados com a religião e a crença tão logo ela nos é apresentada,
ainda na primeira infância. Seria uma tendência incluída na mente desde o
nascimento.
Um estudo psicológico com bebês de 9 meses de idade, conduzido pela
Universidade Emory (Atlanta, EUA), fez experimentos cognitivos. Os
pesquisadores observaram que o cérebro das crianças, para entender o
mundo, faz associações a partir de “agentes” (qualquer fator de ação ao
seu redor, não necessariamente uma pessoa), e de como podem interagir
com eles.
Naturalmente, os bebês sabem que tais agentes têm uma finalidade,
ainda que seja desconhecida, e que os agentes podem existir mesmo que
não possam ser vistos (é por isso, por exemplo, que filhotes de animais
buscam se proteger de predadores mesmo que não os tenham visto).
Essa tendência, segundo o autor, facilita que se acredite em Deus.
Não nos causa estranheza atribuir determinados fenômenos a um ente
desconhecido: nosso cérebro pode lidar com isso sem problemas.
Outra pesquisa, da Universidade Calvin, em Grand Rapids (Michigan,
EUA) vai ainda além: não apenas temos naturalidade com a ideia de um
agente invisível, como somos diretamente propensos a este pensamento.
Além disso, tais tendências não desaparecem na infância, se prolongando
pela vida adulta na maioria dos casos.
Desde a infância, somos condicionados a acreditar que todas as coisas
têm um propósito fixo. Uma terceira faculdade americana, Universidade
de Boston (Massachussets, EUA), estudou crianças de 5 anos que visitavam
um zoológico e olhavam para a jaula dos tigres.
Os pesquisadores descobriram que as crianças são mais propensas a
acreditar que “os tigres foram feitos para andar, comer e serem vistos
no zoológico”, do que “ainda que possam comer, andar e serem vistos, não
é para isso que foram feitos”.
Temos dificuldade em não saber a razão da existência de algo, por
isso recorremos a divindades. Este ente superior, por deter uma resposta
que o ser humano não pode descobrir, recebe naturalmente atribuições de
onisciência, onipresença e imortalidade, pois nosso cérebro tende a
depositar todo o universo desconhecido em tal entidade.
O autor ainda lança uma pergunta: se Deus é aceito pelas crianças em
um mecanismo de atribuição do desconhecido, semelhante ao Papai Noel ou a
Fada do Dente, porque as crenças nestes últimos morrem com a infância e
a ideia de Deus tende a permanecer na vida adulta?
Isso se explica, segundo ele, porque a imagem de Deus é mais
poderosa. Papai Noel sabe apenas que deve te entregar um presente no dia
25 se você se comportou, e a Fada verifica apenas se você escondeu o
dente debaixo do travesseiro.
Deus, ao contrário – e desde sempre somos levados a acreditar nisso
-, sabe não apenas tudo o que você faz, mas também todos os outros seres
do mundo e do universo. É por isso que algumas pessoas só passam a crer
em Deus depois de mais velhas, mas ninguém retoma na vida adulta uma
crença no Papai Noel: isso é algo restrito ao imaginário infantil. [New Scientist]
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* Dalane Santos Dalane Santos tem 21 anos, é
recém-formada em jornalismo pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e
escreve para o Hypescience desde fevereiro de 2012.
Fonte: http://hypescience.com/25/03/2012
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