A monja Coen conta como sofreu por tentar se manter no comando de um templo zen-budista
"Conheci o zen-budismo quando era casada com um americano e morava na
Califórnia. Apaixonei-me pela filosofia do zen-budismo e me envolvi
muito com a comunidade. Depois, saí. Virei monja em Los Angeles e fui
para um mosteiro feminino em Nagoia, no Japão. Passei 12 anos lá. Minha
proposta era adotar o celibato, mas conheci um monge 18 anos mais novo
do que eu e me casei. Ele me convenceu a voltar ao Brasil, pois dizia
que era mais importante trazer o budismo para cá do que ficar num país
que já é budista.
Em 1995, quando cheguei, minha ideia era comprar um sítio para a
comunidade de zen-budismo. Mas o templo Busshinji, sede da nossa ordem
na América do Sul, pediu que assumisse interinamente sua direção. O
superior de lá tinha voltado para o Japão. Fiquei seis anos nessa
função. Em 1997, presidi a Federação das Seitas Budistas. Foi um período
de muitas alegrias e realizações.
Houve um movimento de membros antigos da comunidade para trazer alguém
que fosse homem, japonês e mais velho para dirigir o templo. Foram três
discriminações contra mim: eu era mulher, jovem para a posição e
brasileira. Fiquei triste, porque havia criado uma comunidade à minha
volta com brasileiros também, não só japoneses. Quando o monge do Japão
chegou, ele disse que um templo não podia ter duas cabeças e eu tinha de
sair. Mas eu não queria dividir a comunidade que estava se formando.
Então, briguei para ficar mais tempo.
"Cai sete vezes, levanta
oito.
O chão onde você cai é o chão que
lhe sustenta de pé.
Não reclame
da queda”.
Algumas pessoas me caluniaram para que eu saísse. Foi uma coisa muito
pesada, que me entristeceu. Uma vez um jornalista escreveu que eu era
bispo. Na ocasião, não me importei, mas alguém enviou a reportagem para o
Japão, dizendo que eu me passava por bispo. Fui até lá. Houve uma
espécie de tribunal para me julgar. Levei uma carta do jornalista que
fez o texto afirmando que eu não disse que era bispo, que ele se
enganou. No Japão não aceitaram. Minha superiora, que foi a essa
reunião, disse: “Renuncie, não se defenda porque é muito feio o que
estão fazendo. As pessoas vão receber isso de volta, não porque vamos
fazer uma vingança ou lhes desejar o mal, mas porque é do darma (para os budistas, darma é a lei que determina a realidade espiritual dos seres)”.
Foi um erro ter insistido em ficar na direção do templo. A insistência
fez com que eu conhecesse o lado sombrio de muita gente. Foram muitas
decepções, desgastes e tristezas em alguns momentos. Demorei para me
desapegar. É um equilíbrio sutil entender quando é hora de cuidar do que
plantamos e quando desapegar.
Depois que saí de lá, um grupo de praticantes me seguiu, e surgiram
inúmeras oportunidades de transmitir o budismo. Não há nada fixo. Não dá
para segurar um cargo, uma posição. Acho que essa é a lição mais
bonita. Quando você desiste de uma ideia fixa, você se abre para o
Universo. Uma expressão que temos no budismo é: “Cai sete vezes, levanta
oito. O chão onde você cai é o chão que lhe sustenta de pé. Não reclame
da queda”. Isso é o que aprendi. Hoje enxergo a saída do templo como
uma oportunidade para lidar com os ensinamentos de Buda. Estava muito
fechada na comunidade japonesa. Graças a tudo isso, tive a chance de
levar o budismo para o Brasil inteiro."
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Fonte: http://revistaepoca.globo.com/Vida-util/noticia/2012/03/nao-tive-desapego.html
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