Hélio Schwartsman*
Aparentemente ninguém deu muita bola para a proposta,
feita pela comissão de juristas que revê o Código Penal, de
descriminalizar certos tipos de eutanásia. Esse, entretanto, é um
assunto importantíssimo e que tende a ficar cada vez mais premente, à
medida que a população envelhece e a medicina amplia seu arsenal
terapêutico.
Desligar as máquinas que mantêm um paciente vivo pode ser descrito como
um caso de homicídio, ainda que com o objetivo nobre de evitar
sofrimento, ou como uma recusa em prosseguir com tratamento fútil, o que
é perfeitamente legal.
Como sempre, acho que cabe a cada qual fazer suas próprias escolhas.
Mas, já que nem sempre sabemos o que é melhor, convém dar uma espiadela
em como pensam aqueles que, de fato, entendem do assunto.
Num artigo que está movimentando a blogosfera sanitária e já foi
reproduzido no "Wall Street Journal" e no "Guardian", o doutor Ken
Murray sustenta que, embora os médicos apliquem todo tipo de manobra
heroica para prolongar a vida de seus pacientes, quando se trata de suas
próprias vidas e das de seus entes queridos, eles são bem mais
comedidos.
Como estão familiarizados com o sofrimento e os desfechos das medidas
extremas, querem estar seguros de que, quando a sua hora vier, ninguém
vai tentar reanimá-los nem levá-los a uma UTI para entubá-los e
espetá-los com cateteres. Murray diz que um de seus colegas chegou a
tatuar o termo "no code" (sem ressuscitação) no próprio corpo.
A pergunta que fica, então, é: se não são sádicos, por que os médicos
fazem aos outros o que não desejam para si mesmos. E a resposta de
Murray é que ocorre uma perversa combinação de variáveis emocionais,
econômicas, mal-entendidos linguísticos, além, é claro, da própria
lógica do sistema. Em geral, para o médico é muito mais fácil e seguro
apostar no tratamento, mesmo que ele se estenda para muito além do
razoável.
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* Colunista da Folha
Imagem da Internet
Fonte: Folha on line, 17/03/2012
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