quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Corridinho

Adélia Prado*
O amor quer abraçar e não pode.
A multidão em volta,
com seus olhos cediços,
põe caco de vidro no muro
para o amor desistir.
O amor usa o correio,
o correio trapaceia,
a carta não chega,
o amor fica sem saber se é ou não é.
O amor pega o cavalo,
desembarca do trem,
chega na porta cansado
de tanto caminhar a pé.
Fala a palavra açucena,
pede água, bebe café,
dorme na sua presença,
chupa bala de hortelã.
Tudo manhã, tudo truque, engenho:
é descuidar, o amor te pega,
te come, te molha todo.
Mas água o amor não é.

*Mineira de Divinópolis, 73 anos, Adélia Prado é a maior poeta brasileira viva. Tem uma poesia com sotaque fortemente amoroso e religioso dito com o tom de voz de quem viveu o Brasil interiorano.
Postado CORREIO BRAZILIENSE, 23/09/2009 por Conceição Freitas

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