sábado, 26 de setembro de 2009

É fácil ser ecológico

Paul Krugman*
Alegações de enormes danos econômicos por causa da legislação do clima são falsas Eaí, gostou do debate sobre a reforma da saúde? Você se impressionou com a civilidade da discussão e a honestidade intelectual dos opositores da reforma? Se gostou, você vai adorar o próximo grande debate: a luta contra as mudanças climáticas.
A Câmara já aprovou um forte projeto de lei de controle de emissões (Waxman-Markey) que, caso se torne lei, vai gerar reduções drásticas nas emissões de gases causadores de efeito estufa. Mas nas mudanças climáticas, assim como na saúde, o ponto crucial será o Senado. E os desconfiados estão fazendo o melhor que podem para barrar a ação.
Alguns dizem que o aquecimento global é uma falácia, ou que as evidências ainda não são conclusivas.
Mas esse argumento não se sustenta – ele é tão frágil quanto as geleiras do Ártico, que agora diminuíram ao ponto de empresas de transporte marítimo abrirem novas rotas pelos mares outrora não navegáveis no norte da Sibéria.
Até as empresas estão perdendo a paciência com os que negam o fato: no início da semana, a Pacific Gas and Electric cancelou a participação na Câmara de Comércio americana em protesto contra as “tentativas nada sinceras da câmara de diminuir ou distorcer a realidade” das mudanças climáticas.
O principal argumento contra ações climáticas provavelmente não será a declaração de que o aquecimento global é um mito. Em vez disso, argumentar-seaacute; que fazer qualquer coisa para limitar o aquecimento global destruirá a economia.
Como o blog Climate Progress diz, os opositores da legislação de mudanças climáticas “continuam elevando os custos estimados dos programas de redução da poluição e da energia limpa como um leiloeiro fora de controle”.
É importante entender que alegações de imensos danos econômicos decorrentes da legislação do clima são tão falsas quanto a negação das mudanças climáticas. Salvar o planeta não sairá de graça (apesar de os estágios iniciais de conservação terem chance de saírem). Mas o custo não será tão alto.
Como sabemos disso? Primeiro, provas indicam que estamos desperdiçando muita energia no momento.
Estamos queimando grandes quantidades de carvão, óleo e gás de formas que, na verdade, não melhoram nosso padrão de vida – fenômeno conhecido como “lacuna da eficiência energética”. A existência dessa lacuna indica que políticas que promovem a conservação de energia, até certo ponto, tornam, na verdade, os consumidores mais ricos.
Segundo, a melhor análise econômica disponível indica que até reduções drásticas de emissões de gases vão impor apenas custos modestos à família média. Nesse mês, o Escritório de Orçamento do Congresso lançou uma análise dos efeitos da lei Waxman-Markey, concluindo que, em 2020, o projeto de lei custaria à família média apenas US$ 160 por ano, ou 0,2% da renda. É quase o preço de um selo dos correios por dia.
Em 2050, quando o limite das emissões será muito mais severo, a carga deve aumentar para 1,2% da renda. Mas o escritório de orçamento também prevê que o PIB real será aproximadamente 2,5 vezes maior em 2050 do que é hoje; então, esse PIB por pessoa aumentará em cerca de 80%. O custo da proteção ao clima quase não afetará esse crescimento. E tudo isso, obviamente, ignora os benefícios da limitação do aquecimento global.
De onde vem, então, os alertas apocalípticos sobre o custo das políticas de mudanças climáticas? Os opositores dos limites confiam em diferentes estudos que chegam fundamentalmente a diferentes conclusões? Não. É verdade que, no segundo trimestre, a Heritage Foundation divulgou um relatório dizendo que a lei WaxmanMarkey elevaria a taxa de desemprego, mas o estudo parece ter sido tão obviamente absurdo que dificilmente vi alguém o citando.
Em vez disso, a campanha contra salvar o planeta se baseia principalmente em mentiras.
Consequentemente, na semana passada, Glenn Beck – que parece estar desafiando Rush Limbaugh pelo papel de líder de fato do partido republicano – informou seu eleitorado de um estudo engavetado do governo Obama mostrando que a lei Waxman-Markey, na verdade, custaria à família média US$ 1.787 por ano. Não preciso nem dizer que esse estudo não existe.
Não devíamos, contudo, ser tão duros com Beck. Declarações semelhantes sobre o custo da lei WaxmanMarkey têm sido propagadas por muitos supostos especialistas.
Um ano atrás, eu ficaria surpreso com esse comportamento. Mas como já vimos no debate da saúde, a polarização de nosso discurso político obrigou “centristas” autoproclamados a escolherem lados – e muitos deles aparentemente decidiram que oposição partidária ao presidente Barack Obama supera quaisquer preocupações sobre honestidade intelectual.
O ponto principal é o seguinte: a declaração de que a legislação climática vai detonar a economia merece o mesmo desdém que a declaração de que o aquecimento global é uma falácia. A verdade sobre a economia das mudanças climáticas é que é relativamente fácil ser ecológico.
*The New York Times
Jornal do Brasil - Sábado, 26 de Setembro de 2009
http://jbonline.terra.com.br/leiajb/2009/09/26/primeiro_caderno/e_facil_ser_ecologico.asp

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