domingo, 7 de agosto de 2011

Fim de um mundo

Juremir Machado da Silva*
Crédito: Arte Pedro Lobo Scaletsky 

O livro em papel está com os dias contados. Não vai desaparecer totalmente. Permanecerá como vestígio de uma época e terá edições de luxo, dessas de capa dura, para a gente colocar os pés em cima nas mesinhas de centro. Bob Stein, criador do Institute for the Future of the Book, anunciou que o livro não tem futuro. Muita gente fica desesperada ou até furiosa com isso. Confunde as coisas. O papel não tem a menor importância. Não é o suporte que conta, mas o que se conta em qualquer suporte. As novas gerações não têm a menor relação afetiva com o papel. Nos Estados Unidos, 40 estados já aboliram o ensino da escrita cursiva. Os nostálgicos poderão imprimir os livros diretamente dos seus computadores para leitura à moda antiga. É um modelo de negócios que chega ao fim.

"Na Internet, hoje, é possível encontrar
quase todo tipo de livros a preços
praticamente de custo. É o comércio entre leitores.
Sem poder dar maiores descontos,
as feiras perdem o atrativo. Com o fim do
livro em papel, como serão as feiras do futuro?
Vem aí um novo mundo."


Editores, distribuidores e livreiros tentam resistir. Querem manter as margens do lucro do passado. Acabou. Sinto dizer, mas os distribuidores serão os primeiros a desaparecer. Editores já podem vender diretamente às livrarias e, melhor ainda, aos leitores. Quanto menos atravessadores, mais barato será o livro. Não é mais possível que um livro, cujo custo total de produção fique em R$ 5,00 a unidade chegue ao leitor por R$ 50,00. E que a divisão desses R$ 50,00 seja assim: R$ 5,00 para o autor, R$ 45,00 para editora, distribuidor e livraria. A escravidão está chegando ao fim. Os detentores do velho modelo de negócios do livro estão migrando para o e-book, mas com métodos errados: querem manter grossas fatias de lucro. Um livro cuja produção custa R$ 5,00 deve ser vendido, no máximo, por R$ 10,00. As tetas estão secando.
Hoje, três ou quadro grandes editoras nacionais loteiam as prateleiras das principais livrarias. Só os livros delas aparecem em destaque. Aquilo que se vê é o que se vende. As mesmas editoras loteiam os espaços destinados a livros nos grandes jornais nacionais. É quase um negócio entre amigos, que trocam figurinhas. A editora garante o livro "importante" em exclusividade para o jornal, assim como a entrevista do autor famoso. O jornal garante o espaço generoso para a editora. No futuro, o jornalista que fez a matéria publicará seu livro pela tal editora. Como o livro está no jornal, despertará o interesse das livrarias, que já possuem um acordo com a editora para colocar num espaço cativo, em troca de bons descontos, o livro da vez. Tudo isso alavanca o interesse dos leitores e termina em prêmios.
Mesmo na venda direta ao leitor pela editora, como acontece em alguns estandes da Feira do Livro de Porto Alegre, o desconto ao consumidor não pode ser grande, pois o editor não pode fazer concorrência ao seu distribuidor. Se entregou-lhe o livro com 50% de desconto sobre o preço de capa, mesmo vendendo sem passar por ele, não pode dar 60% de abatimento ao leitor. Nem sequer os mesmos 50%. Para não ser desleal e perder o parceiro comercial. Na Internet, hoje, é possível encontrar quase todo tipo de livros a preços praticamente de custo. É o comércio entre leitores. Sem poder dar maiores descontos, as feiras perdem o atrativo. Com o fim do livro em papel, como serão as feiras do futuro? Vem aí um novo mundo.
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* Sociólogo. Escritor. Tradutor. Colunista do Correio do Povo
juremir@correiodopovo.com.br
Fonte:Correio do Povo on line, 07/08/2011

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