domingo, 4 de março de 2012

É o fim da privacidade online?

CHARLES ARTHUR*


Casos de apropriação de dados de internautas e consumidores pelas empresas trazem preocupaçãoSe você usa smartphone e baixa aplicativos, provavelmente já usou um app que abre uma caixa de diálogo dizendo Encontre seus Amigos e se oferece para garimpar pessoas que você já conhece em alguma nova rede social ou uma das mais familiares. É fácil e rápido clicar no botão OK. Mas você sabe o que vai acontecer assim que o fizer?
Na metade de fevereiro, o pesquisador indiano Arun Thampi descobriu o que acontecia quando o Path, um aspirante a app de redes sociais para o iPhone da Apple, fazia essa pergunta. O app estava fazendo upload do conteúdo dos livros de endereços dos usuários para os servidores do Path.
A gritaria contra essa apropriação de dados foi rápida e amplamente disseminada – pelo menos entre a elite digital do Vale do Silício e aqueles que a observam. O executivo-chefe do Path escreveu um blogspost de mea culpa, a empresa atualizou seu aplicativo, e tudo parecia calmo.
Então, Dustin Curtis, um designer de interfaces de usuário, apontou que inúmeros aplicativos fazem isso. Em seu blog, destacou: “Fiz uma pesquisa rápida com os 15 desenvolvedores dos populares apps iOS, e 13 deles me disseram ter uma database de contatos com milhões de registros. A database de uma empresa tem o número de celular de Mark Zuckerberg, o telefone residencial de Larry Ellison e celular de Bill Gates”.
Outras pesquisas mostraram que o Facebook, o Instagram, o Yelp e o Gowalla fazem o mesmo. Parecia mais fácil listar os apps que não o faziam. Alguns dias depois do blog de Curtis, o Twitter admitiu que também se apropriava dos dados dos livros de endereços, com o único propósito de encontrar pessoas que já se conhece e poderiam ser, ou serão, usuárias do serviço. Jon Leibowitz, persidente da poderosa Comissão Federal de Comércio dos Estados Unidos, resumiu em uma sentença:
– Já é quase impossível descobrir quais aplicativos coletam dados e o que fazem com isso.
A Apple avaliou o assunto por uma semana e depois anunciou uma nova atualização do software do iPhone e do iPad. Mas, quando uma tempestade de privacidade parecia passado, vinha outra: Jonathan Mayer, que faz pesquisa sobre privacidade online na Universidade Stanford, descobriu que o Google hackeava as configurações de privacidade dos navegadores da Apple no iPhone, no iPad e nos desktops, rastreando o uso que as pessoas faziam da web.
– Entre o desastre do Path e os cookies do Google no (navegador) Safari, ficou óbvia a bancarrota moral do Vale (do Silício) no que diz respeito à privacidade – comentou James Grimmelmann, professor associado da Escola de Direito de Nova York, no Twitter.

A situação apenas mudará quando não estiver
mais na moda fornecer nossos dados

Mas não é só no espaço da web ou nos apps que somos identificados. Uma assustadora história publicada pelo The New York Times mostrou como a gigante Target é eficiente em rastrear os itens comprados pelos consumidores. O sistema da empresa trabalha tão bem que a Target soube que uma adolescente estava grávida – e começou a enviar cupons de compras apropriados a sua casa – antes mesmo de seu pai.
Seu livro de endereços está em algum lugar na “nuvem”. Você diz onde você esteve a qualquer pessoa que tiver acesso ao seu perfil no Facebook. Os usuários do Foursquare podem rastrear os lugares que frequenta. Uma representação gráfica da quantidade de dados públicos que o Facebook mostrava em 2005 comparada com a de 2010 se parece com as previsões de derretimento da calota polar. Com uma diferença: já está acontecendo. De fato, a privacidade online lembra o aquecimento global: nós censuramos e resmungamos que “alguma coisa precisa ser feita” e, então, fazemos o equivalente a subir em um 4x4 – identificar fotos de amigos se embebedando no Facebook, tuitar fotos de viagens e da família no Instagram.
Simon Davies, diretor-geral da Privacy International, grupo de pressão que há anos vem alertando sobre a facilidade de tais invasões, acha que isso é uma metáfora tendenciosa. Mas está aumentando a conscientização de que isso não está certo e que não podemos continuar assim.
O ponto alto foi o anúncio feito pelo governo Obama de que iria pressionar para que todos os navegadores tivessem um botão “Não Rastrear” como parte de uma “declaração de direitos de privacidade do consumidor”.
Mas onde isso tudo termina?
– É um problema sistemático. A situação apenas mudará quando não estiver mais na moda fornecer nossos dados – diz Davies.
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Tradução: Patrícia Feiten
* The Guardian
Fonte: ZH on line, 05/03/2012

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